Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Beleza e mídia: pouco da verdade

Em tempos de selfie e idolatria da imagem, precisamente do corpo e das medidas utópicas perfeitas, creio que o mito de Narciso, na história da humanidade, nunca se fez tão presente como na contemporaneidade. Cotidianamente, o feed de milhares de pessoas é bombardeado por notícias sobre corpo e como alcançar a perfeição. Dietas, shakes, exercícios, cirurgias bizarras. E os blogueiros fitness propagam pela internet: fotos de curvas milimetricamente planejadas aparecem em fotos tiradas diante do espelho. O questionamento de Shakespeare ecoa, se faz ouvir: “Ó beleza! Onde está tua verdade?”

Em um vídeo do YouTube, a instrutora fitness e blogueira Cassey Ho critica os altos e utópicos padrões estéticos emitidos pela sociedade, principalmente nos comentários em mídias sociais. No projeto intitulado “The Perfect body” (“O corpo perfeito”), Cassey molda suas formas conforme os comentários que recebe em relação a suas fotos. Em seu site, a instrutora questiona: “Quando você olha no espelho, você está feliz com o que você vê? (…) É difícil de contentar com a forma do seu corpo, quando as pessoas estão constantemente lhe dizendo como você está gorda, quanto peso você precisa perder, quanto peso você precisa para ganhar… literalmente o que as pessoas querem?”

No livro O Mito da Beleza, a escritora norte-americana Naomi Wolf pondera que as “indústrias da dieta e dos cosméticos passaram a ser os novos censores culturais do espaço intelectual das mulheres” (WOLF, 1992, p. 13). Ao passo que devemos ser conscientes que a Beleza não é um padrão universal e tampouco imutável, “embora o mundo ocidental finja que todos os ideais de beleza feminina se originam de uma Mulher Ideal Platônica” (WOLF, 1992, p. 15).

Liberdade, leveza e conhecimento

E a mídia tem um grande papel na propagação desses ideais plásticos e destrutivos. Seja por meio da difusão em revistas, sites e blogs sobre o “corpo perfeito”, ou através do cinema/televisão fontes maciças de ideais que conseguem atingir uma gama incalculável de pessoas em todo o mundo. Nossos heróis são musculosos, belos e jovens. Na cultural contemporânea, beleza e juventude andam de mãos dadas, inseparáveis.

Para Wagner Luiz da Silva e Marisa Sanabria, no artigo “Edadismo e a mulher”, presente no livro O Feminino: diversos olhares, a mídia e a cultura de consumo nos pedem corpos perfeitos, que não sejam passíveis do envelhecimento e do cansaço, principalmente para as mulheres. “Isto quer dizer que excluímos como incompetentes e fora do padrão os indivíduos gordos, na maturidade, com trajetória de vida e eventualmente entristecidos ou reflexivos. Esta atitude de rejeição coletiva adquire caráter de violência velada e, muitas vezes, explícita, quando se trata da mulher, à medida que ela envelhece” (SILVA; SANABRIA, 2012, p. 114).

Por sua qualidade, a beleza deve ser algo que ilumina nossas almas, proporcionar liberdade, leveza e conhecimento. Isso que prega mutilação, homogeneidade, plasticidade e autodestruição é qualquer outra coisa, menos beleza.

Referências bibliográficas

SILVA, Wagner da; SANABRIA, Marisa. Edadismo e a mulher. In: SANABRIA, Marisa (org). O Feminino: diversos olhares. Belo Horizonte: CRP 04, 2012, 118 p.

WOLF, Naomi. O mito da beleza: como as imagens de beleza são usadas contra as mulheres. Rio de Janeiro (RJ): Rocco, 2012.

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Alexandre Manoel Fonseca é jornalista