ELEIÇÕES 2006
Tão Gomes Pinto
Dossiê anti-tucano mostrou que a mídia é anti-Lula, 30/09/2006 07:13
“A diferença de tratamento, pela mídia, entre Lula e os demais concorrentes acentuou-se no episódio do dossie anti-tucano.
Desde a descoberta da negociação do dossiê, o número de matérias negativas para Lula aumentou, conforme a análise do Observatório Brasileiro de Mídia (*).
No último dia 20, a disparidade entre a presença de Lula e a dos outros candidatos à Presidência da República na imprensa mereceu até um relatório específico sobre a cobertura do escândalo.
Naquele dia, o estudo levou em conta três jornais: Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e O Globo.
No total, 97 reportagens foram dedicadas ao assunto sucessão.
Lula apareceu em 70, Alckmin em seis e Heloísa Helena e Cristovam Buarque foram citados em três, cada um.
Sobre a totalidade de reportagens de cada candidato, Alckmin teve o maior percentual de reportagens ‘positivas’, 50%, e a menor de ‘negativas’, 16,7%.
Lula teve a menor porcentagem de ‘positivas’, 21,4%, e a maior de ‘negativas’ , 65,7%.
O Observatório Brasileiro de Midia constatou que a maioria dos veículos dedicou muito mais espaço à participação dos petistas na ‘operação’ do que a apresentar a efetiva participação dos ex-ministros da Saúde de FHC, José Serra e Barjas Negri no esquema de superfaturamento de ambulâncias.
O próprio Lula colaborou indiretasmente para essa distorção na cobertura.
Na hora em que o presidente da República chama de ‘aloprados’ alguns dos seus auxiliares diretos deve imaginar o destaque que uma afirmação dessas irá receber na mídia.
De acordo com o último boletim semanal, de rotina, divulgado pelo instituto, o presidente-candidato ocupou 61,3% do espaço dedicado pelos veículos pesquisados (cinco grandes jornais diários) à cobertura das eleições presidenciais entre os dias 16 e 22 de setembro.
Do total de inserções, 62,5% foram classificadas como ‘negativas’.
O mesmo ocorreu em 57,5% das matérias em que Lula apareceu na condição de presidente.
O seu adversário direto, Geraldo Alckmin, teve menor visibilidade.
Respondeu por apenas 10,2% do total ocupado pelos presidenciáveis.
Em compensação, ficou com o maior percentual de reportagens positivas (39,7%).
Em apenas 20,6% das matérias em que aparecia, o tucano tinha sua imagem questionada.
Kjeld Jakobsen, diretor do Observatório da Mídia, é ex-secretário de Relações Internacionais da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e da prefeitura de São Paulo, na gestão petista de Marta Suplicy.
Jakobsen não aceita o argumento de que a predominância de aspectos negativos seria em decorrência dos próprios atos do presidente ou de pessoas ligadas a ele.
Segundo ele, independentemente disso, há indícios de que a cobertura eleitoral está sendo tendenciosa.
‘Identificamos casos em que o título era negativo mesmo quando a notícia era neutra’, disse ele, entrevistado pela repórter Soraia Costa, do site Congresso em Foco.
Outro ‘truque’ utilizado pelos veículos no seu posicionamento anti-Lula seria, segundo Jakobsen, a colocação das matérias nas paginas.
As poucas notícias que mostravam aspectos positivos eram menores ou estavam em um canto escondido da página.
De acordo com o Observatório da Mídia, esse desequilíbrio é mais explícito no jornal O Estado de S. Paulo e na revista Veja.
Na avaliação de Euripides Alcâantara, diretor de redação daa Veja, ‘felizmente’, os veículos de comunicação não estão sendo neutros na cobertura destas eleições.
‘Os melhores órgãos de imprensa estão produzindo material sem subserviência ao poder e sem se refugiar na neutralidade’, afirmou Euripides.
Enquanto isso, o jornalista Marcelo Soares, responsável pela seleção e análise de matérias sobre corrupção publicadas em 63 jornais e revistas de todo o país dentro da ONG Transparência Brasil, considera saudável que Lula, na condição de presidente e candidato, seja mais ‘vigiado’ do que seus adversários.
Mas também identifica certo desequilíbrio no noticiário político.
E aponta três fatores para essa desigualdade: a ‘hiperdependência’ do jornalismo declaratório, a dificuldade dos veículos em ir além da ‘notícia do dia’ e a falta de um acompanhamento mais assíduo de outras esferas de governo, como as estaduais e as municipais.
Marcelo Soares sugere que se abra um caderno de política e se verifique o quanto alí é feito na do ‘diz’, ‘afirma’, ‘nega’, acusa’, etc…
‘É mais fácil fazer jornalismo assim, e garante o papel pintado nosso de cada dia numa situação em que não pára de surgir assunto e as equipes continuam enxutas’, observa.
A superação desse modelo passa necessariamente, segundo ele, por quatro palavras: menos declaração, mais reportagem.
‘O principal problema da hiperdependência do declaratório é que ele trata questões de fato como questões de opinião’, afirmou ele ao Congresso em Foco.
(*) Observatório Brasileiro de Mídia é um projeto de iniciativa do Núcleo de Jornalismo Comparado da ECA-USP em parceria com a ONG brasileira Observatório Social e o Media Watch Global, com sede na França. O Observatório analisa o papel da mídia, a exemplo do Laboratório Doxa, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro).”
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