Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Candidatos, maquilagem e retoques

Os jornais e revistas do fim de semana vão deixar os leitores em dúvida: a imprensa não tem nada melhor a discutir do que a maquilagem das pessoas que tentam convencer os eleitores de que vão tornar o Brasil um país melhor?

Não se viu, em nenhuma das notícias, uma análise séria do que têm a oferecer em termos de programa de governo, ideologia, compromissos partidários etc. Em vez disso, o Estado de S. Paulo (15/8), por exemplo, abriu a matéria principal de política com uma foto de quase meia página de cada um deles – fotos e matérias rigorosamente do mesmo tamanho, sendo maquilados antes de aparecer na TV.

Ficamos sabendo, por exemplo, que Dilma Roussef teve ‘o antigo penteado substituído por um clássico à la Carolina Herrera’. E mais: ‘Ela tinha um visual antigo, que não combinava com o seu perfil. Não era fotogênica: usava maquilagem pesada e estava com o cabelo horrendo’, como diz o novo cabeleireiro da candidata, o mesmo da ex-prefeita paulista Martha Suplicy.

Sobre Serra, sobrou a informação de que está cinco quilos mais magro, mais preocupado com a alimentação e mais branco, pelo uso de protetor solar. ‘Aparecerá sempre que possível com camisa azul e mangas arregaçadas, para demonstrar informalidade. No início da carreira usava ternos convencionais que combinavam com sua formação de economista’, diz a consultora de moda Maria Rocha, que revela o erro do candidato: ‘Quando ensaia a informalidade na busca por uma imagem mais simpática, peca pelo uso de peças formais.’

Truques para ficar mais simpáticos

Por incrível que pareça, de Marina da Silva, a única nota a respeito de visual está na legenda da foto: ‘Marina recebe ajuda para retocar o blush durante o intervalo do debate na TV’. A matéria, que ocupa o mesmo espaço dado a Dilma e Serra, fala da biografia da candidata, da forma como ela comanda a campanha na TV, de sua atuação como ambientalista e conclui: ‘Para quem não gosta de discutir apressadamente nenhum assunto de interesse público, Marina enfrentará certamente um enorme desafio nos próximos dias. Tentará provar aos eleitores que a filha de seringueiros pobres tem estofo político e intelectual para presidir o país.’

Ao ler as três matérias, algum leitor menos atento poderá até concluir que, dos três candidatos, a única que tem conteúdo é mesmo Marina da Silva, já que Serra e Dilma – que disputam o primeiro lugar, segundo as pesquisas – aparecem como criações da mídia, de cabeleireiros e maquiladores que tentam transformar a história de vida deles em um ‘produto’ popular e acessível.

A superficialidade do noticiário é completada pela leitura de Veja que, ao invés de discutir o que os candidatos têm a dizer de sério aos seus eleitores, preferiu dedicar uma página inteira ao ‘milagroso’ cabeleireiro de Dilma. A informação mais séria da matéria é que um corte de cabelo no salão citado custa 300 reais. O que a revista não esclarece é quanto Dilma está gastando por mês, já que uma pessoa do salão foi destacada para acompanhar a candidata permanentemente. O calvo José Serra e a autêntica Marina da Silva poderiam explorar esse fato em sua campanha, já que, pelo menos para a mídia, o mais importante, em cada candidato, são os truques que eles usam para ficar mais simpáticos aos eleitores.

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Jornalista