Em maio de 2003, quatro amigos recém-formados em jornalismo se reuniram para discutir propostas de possíveis publicações. A idéia era simples, a vontade era grande e o dinheiro era nenhum. As reuniões eram realizadas na casa de um deles e o projeto, de início despretensioso, acabou ganhando formato, tamanho e um filhote.
A revista Voz (www.revistavoz.com) nasceu em novembro do ano passado, fruto de muita perseverança. Depois de discutir bastante, o grupo de amigos – todos formados pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UNIBH) – decidiu criar uma revista. Escolheram o veículo porque, ao contrário do jornalismo diário, seria um tipo de publicação que os possibilitaria escrever textos mais elaborados e opinativos. Pensada para uma periodicidade mensal, a publicação, na prática, tornou-se bimestral.
Dispostos a fazer uma revista com personalidade, eles optaram por focar em apenas duas editorias: cultura e cidadania. Comprometeram-se também a prestar um serviço para a comunidade, dentro dos preceitos do Jornalismo Público, conceito nascido no início da década de 90, nos Estados Unidos, segundo o qual o jornalismo deve abrir espaço para a discussão dos temas de interesse público. Com o nome escolhido – Voz – queriam passar a idéia de pluralidade, polifonia.
Da teoria à prática
Com a idéia pronta, faltava arranjar um meio de tirá-la do papel – ou colocá-la, literalmente, no papel. A solução encontrada foi o cooperativismo, sistema de autogestão que se apresentou mais viável administrativamente. Assim surgiu a Cooperativa de Produção Editorial (COOPE). Os amigos jornalistas convidaram amigos de outras áreas para poder concretizar o projeto. O grupo cresceu mais, e hoje são 20 associados na faixa etária dos 22 aos 30 anos, que dividem as responsabilidades e as tarefas da COOPE.
Em uma cooperativa, todos os membros são donos e têm que se envolver. Além dos cargos que cumpriam originalmente, os repórteres, fotógrafos, publicitários e designers tiveram que assumir funções administrativos – como presidente, diretor comercial e assessor de comunicação, entre outras. Até hoje nenhum deles recebeu pagamento – ao contrário, desembolsaram dinheiro para manter a cooperativa em operação.
A estrutura que possuem é uma sala no centro de Belo Horizonte, com telefone, computadores ligados à internet e programas de diagramação. O custo é rateado entre os cooperados. Sem dinheiro em caixa, eles criaram uma campanha de assinaturas – para a qual cada sócio comprometeu-se a conseguir um determinado número de assinantes – para pagar a impressão do primeiro número da revista.
O dinheiro arrecadado com a campanha foi suficiente para pagar também parte da impressão do segundo número da Voz. Para a terceira edição, prevista para este mês de março, o grupo espera conseguir verbas de anúncios publicitários.
Dificuldades e desafios
Os jovens profissionais encontram aí outro problema. ‘O fato de a publicação ser nova e desconhecida deixa os empresários em cima do muro’, afirma Bianca Melo, que divide os cargos de presidente da COOPE e assessora de comunicação. A falta de apoio inicial levou a cooperativa a fazer a campanha de assinaturas para bancar o primeiro número da revista. A situação, paradoxal, reflete a realidade de qualquer equipe de jornalistas que esteja começando no mercado independente das grandes empresas de mídia. ‘Tentamos conseguir apoio da maneira que parece ser a mais óbvia: pelo mérito do produto. Mas o que temos visto é que as coisas não são assim’, diz Bianca.
Mesmo com as dificuldades, eles não desanimam. Segundo Bianca, ‘a experiência é muito prazerosa e tem nos ensinado muito’. O grupo aposta em uma idéia específica: incluir o leitor na revista. Por meio de textos que falam diretamente com ele e da observação de diferentes pontos de vista na análise das pautas, a equipe da Voz tenta brigar pela ética. ‘É quase um romantismo no bom sentido’, brinca a presidente da COOPE.
A revista ainda está em mutação. A equipe tenta encontrar as melhores soluções para que o próximo número chegue às bancas e à casa dos assinantes, que hoje são quase 300. Voz ainda vai amadurecer suas idéias e formatos. Quanto tempo vai conseguir sobreviver, ninguém sabe. Mas se depender da força de vontade e da determinação da equipe, as chances são boas. ‘Vamos continuar com a proposta enquanto pudermos’, garante Bianca.