O fato motivador deste texto já está engavetado nos porões da mídia, seguindo o danoso hábito empregado por nossa imprensa de exposição extrema seguida pelo esquecimento moribundo. Há cerca de cinco meses fomos todos chamados a debater, com ar pomposo e de alta sabedoria, o problema da segurança pública nacional. Bastou um caso, dos mais execráveis, para que a comoção nacional empurrasse todos à exaltação do linchamento público dos culpados e dos discursos acalorados, porém quase sempre vazios. Esta não é a maneira correta para resolver problema tão grave. E não é saudável a criação de mártires, como a mídia fez com o menino João Hélio.
Causa espanto assistir a mobilização da sociedade somente a partir de acontecimentos pontuais, que envolvem quase sempre a classe média e alta. Não cabe desdenhar o ocorrido ao garoto, vítima de uma atrocidade selvagem, mas é de se criticar o comportamento passivo de todos ante a violência sofrida diariamente pelos habitantes das áreas periféricas, reinos onde o poder é imposto pelo calibre mais potente. Lá, onde a vista só chega através das câmeras, muitos Joãos Hélios são mortos diariamente. Não cabe discutir qual maneira de se matar é a mais bárbara. O importante é ter a consciência de que a população de baixa renda almoça diariamente o chumbo do crime.
Gostaria de ouvir vozes indignadas quando garotos favelados são mortos pela polícia, que oferece sempre a mesma justificativa: troca de tiros com traficantes. A imprensa não procura apurar corretamente quando inocentes são fuzilados pelo Estado. Ninguém convoca uma manifestação quando uma bala perdida acerta o crânio de uma criança de dois anos, que dormia em seu berço dentro do barraco de madeira e lona que seu pai conseguiu construir. Acadêmicos, políticos e integrantes da sociedade civil organizada não debatem as razões da prisão de inocentes, pobres, que têm sua vida, sua moral e sua dignidade estraçalhadas pelo sistema prisional brasileiro, tudo porque não podiam pagar um bom advogado. Por que a mídia não se mobiliza em defesa desses cidadãos impotentes, sem voz, sem autonomia, sem direitos?
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É fato que empresas de comunicação, a maioria delas, são privadas, mas ainda assim não podem agir como fábricas de papel higiênico, porque têm responsabilidade social. Até os produtores de papel higiênico são obrigados a seguir regras do setor. As empresas de comunicação são regidas pela Lei de Imprensa. No entanto, frequentemente agem à revelia das leis (inclusive as trabalhistas) e acabam expondo seus jornalistas, coagidos a fazer o que tem que ser feito em nome do capital. Não é raro se pegar diante do chefe a dizer que aquela matéria não sai porque o envolvido no fato é parceiro do grupo.
Sendo a empresa privada, faltam às vezes ao operário das redações palavras para retrucar o poder econômico. Consulte a lei e haverá argumentos. Jornalistas que querem intervir no desmando empresarial devem ler a Lei da Imprensa, conhecê-la e usá-la. Sindicatos, neste contexto, têm a responsabilidade de fazer cumprir a lei, para que a categoria não seja lesada pelas empresas cujo interesse imediato é o lucro. Nem para que precise o jornalista agir individualmente, correndo risco de demissão. Numa sociedade legalista, em que jornais também são legalistas (a maioria é contra ocupações de terras, contra invasões dos sem-tetos, contra pirataria…), então tem que valer este argumento – o da lei – sempre e não só quando interessa. (Keka Werneck, repórter, Cuiabá, MT)
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É escandaloso o silêncio sepulcral que paira sobre os motivos que teriam levado o empresário Nenê Constantino a entregar dinheiro ao senador Joaquim Roriz, no episódio que culminou com sua renúncia. Na grande mídia, a honrosa exceção ficou por conta do Jornal da Band, que denunciou a dívida multimilionária de uma das companhias de ônibus do empresário junto ao INSS. Acredito não ser irrelevante, nesse caso, o fato de a GOL ser um anunciante de peso nos principais meios de comunicação nacionais. Gostaria de ver este Observatório discutindo a influência dos interesses de grandes anunciantes em conteúdos editoriais. Exemplos não faltam nos últimos tempos: alguns anos atrás, o Jornal Nacional noticiou vagamente atentados terroristas em dois restaurantes no sul da França, enquanto a Band explicitou de se tratavam de lojas MacDonald´s. A Veja, por exemplo, parece defender desavergonhadamente os interesses de anunciantes. Um caso emblemático, entre muitos, é a defesa incondicional dos transgênicos em suas matérias, havendo sempre o cuidado (pífio, para bom observador) de inserir um anúncio da Monsanto somente na edição da semana seguinte. (Gilberto Mário dos Santos, arquiteto, Rio do Sul, SC)
Nota do OI: O leitor pode consultar nossa página de Edições Anteriores. Desde a primeira edição deste Observatório na web, em abril de 1996, o conflito entre as áreas comercial e editorial da imprensa tem sido alvo de comentários constantes em nossas páginas. Basta procurar. Se preferir o Google ao mecanismo de busca disponível neste sítio, aqui há um tutorial sobre como pesquisar matérias no OI.
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Há pouco tempo utilizei um texto crítico sobre a opinião da imprensa sobre Hugo Chávez que despertou muito o interesse dos meus alunos da rede particular em Niterói (RJ). As diversas posições das revistas caíram como uma luva durante as aulas de geopolítica da América Latina e o papel da mídia. Desta forma sugiro a possibilidade de um link onde pudéssemos acessar uma seleção de textos que possam ser trabalhados em sala de aula. Uma idéia do tipo CartaCapital na Escola. Acredito que não tomaria muito espaço e o trabalho não seria grande, pois são os mesmos textos e/ou infogramas sendo disponibilizados por temas ou datas. Parabéns pelo site e a produção. (Renato Barcellos, professor e geógrafo geoquímico ambiental, Niterói, RJ)
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Porque as TVs abertas são tão ‘fechadas’? O Live Earth foi de graça no Brasil e assim mesmo pouco se viu ou comentou. Apenas a Multishow!, canal da Net, divulgou? Parece que o efeito-estufa é só para os outros? E a Amazônia continua a ser devastada! Onde nosso povo/país vai parar? (Wagner A. Moreno, taxista, São Paulo, SP)
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Estudante de Jornalismo, Belo Horizonte, MG