O clérigo saudita xeque Saleh al-Luhaidan criou confusão ao afirmar, em entrevista a uma rádio, na semana passada, que os proprietários ‘depravados’ de emissoras televisivas que exibem ‘vulgaridades’ – como mulheres com pouca roupa ou horóscopos – podem ser condenados à morte. ‘Se os donos de TV que transmitem indecência não se intimidarem com punições mais brandas, eles podem vir a ser condenados à morte por meio de um processo judicial’, alertou.
Os clérigos que fazem parte do Alto Conselho dos Clérigos têm condição de juízes, podendo dar sentença de morte. Luhaidan dirige o Supremo Conselho Judicial, maior corpo jurídico da Arábia Saudita. ‘É lícito matar os apóstolos de depravação, se o mal não puder ser facilmente removido por meio de sanções mais simples’, defendeu ele.
A ameaça seria parte de uma resposta a um ouvinte, que ligou para perguntar sobre os programas, como novelas e seriados, exibidos por TVs por satélite árabes durante o Ramadã, mês sagrado muçulmano. Religiosos reclamam que o Ramadã, que termina no dia 30/9, foi transformado em uma ‘orgia de comida e televisão’ ao fim do período de jejum, no pôr-do-sol. Após perceber a polêmica que gerou, Luhaidan afirmou a um canal de TV estatal que os ouvintes interpretaram mal suas declarações.
A Arábia Saudita segue a doutrina rigorosa do Islã sunita, conhecida como wahabismo, e as cortes islâmicas ordenam sentenças de morte para ofensas como assassinato, estupro e tráfico de drogas. Um outro clérigo, também membro do Alto Conselho dos Clérigos, afirmou que as declarações de Luhaidan podem ser usadas por militantes da al-Qaeda para justificar seus atos. ‘Suas palavras foram um presente para extremistas que podem usá-las para recrutar jovens para ataques-bomba e assassinatos’, observou o xeque Abdul Mohsen al-Ubaikan.
Para o comentarista saudita Daoud al-Shrayyan, do diário al-Hayat, a declaração foi infeliz, pois coincidiu com o sétimo aniversário dos ataques do 11 de setembro, no qual 15 dos 19 seqüestradores eram sauditas.
Imoral
Dezenas de emissoras de TV montadas fora do país por empresários sauditas transmitem telejornais e programas de entretenimento. Elas são acusadas por clérigos e sauditas conservadores de influenciar as políticas domésticas e de exibir ‘conteúdo imoral’. ‘Se os proprietários continuarem exibindo depravação, serão banidos do cargo e outros serão colocados no lugar’, criticou o clérigo xeque Saleh al-Fozan, referindo-se a especialistas em horóscopo.
Este ano, a irritação dos religiosos aumentou depois que novelas consideradas liberais conquistaram grande audiência no Oriente Médio. Os Emirados Árabes Unidos retiraram do ar, na semana passada, uma série síria, depois de líderes tribais sauditas terem reclamado que o programa estava acentuando antigas rivalidades.
A Arábia Saudita tem dificuldades em fortalecer uma identidade nacional, uma vez que foi formada em 1932 como uma aliança entre a família real saudita e clérigos puritanos que administram a lei islâmica, a sharia. Informações de Suleiman Nimr [AFP, 14/9/08] e de Andrew Amon [Reuters, 15/9/08].