Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Coluna acompanha o vaivém dos jornalistas

Em março de 1991, a edição 111 do jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas, abrigava a primeira edição da coluna ‘Moagem’, por mim assinada, mas que é uma criação de José Hamilton Ribeiro.


Na verdade, o próprio jornal Unidade estava sendo relançado naquele mês com uma nova proposta editorial, sob o comando do próprio Zé Hamilton e a participação de mais 20 ou 30 colegas, jornalistas e não jornalistas, que aceitaram o desafio de escrever voluntariamente para a publicação, como Mino Carta, Carlos Nascimento, Boris Casoy, Washington Olivetto, Júlio Lerner, Narciso Kalili, Fernando Pesciota, Raimundo Pereira, Silvano Tarantelli, Cremilda Medina e Antonio Carlos Fon, entre outros.


Nascia ali, pois, dentro de um jornal rejuvenescido e instigante, sob o provocativo slogan ‘Jornal dos jornalistas – Imprensa sem patrão’, uma coluna que, sem outra pretensão a não ser de ocupar o espaço de meia página determinado pelo editor, acabaria se transformando numa das mais lidas seções do jornal, a ponto de resistir a todas as trocas de editores e diretorias do Sindicato até hoje e de dar vida, em 1995, ao FaxMOAGEM, boletim informativo, à época transmitido por fax, que se transformaria no atual Jornalistas&Cia, enviado eletronicamente para mais de 35 mil profissionais em todo o país e no exterior. E olha que o jornal mudou muito desde então e, além do editorial, manteve intacta apenas a coluna. Na verdade nem tão intacta assim, pois ela acabou migrando do início para o fim do jornal e oscilou para cima e para baixo no número de páginas.


Pendurado ao telefone


Em pouco mais de um ano de coluna, por exemplo, a meia página inicial passou para duas páginas e, pouco depois, para três páginas. E só não se ampliou por decisão editorial, já que material para isso havia. Mais recentemente, por questões econômicas, o Sindicato reduziu o número de páginas do jornal e com isso a coluna voltou a ter duas páginas.


A bem da verdade, é preciso ressaltar que três décadas antes, entre os anos de 1959 e 1961, quando o Sindicato teve como presidentes Benedito Ribeiro e Ewaldo Dantas, uma outra colega, Regina Helena Paiva Ramos, fez uma coluna sobre o vaivém profissional, chamada ‘Por onde andam e o que fazem’. ‘O espírito era o mesmo de ‘Moagem’ – lembra ela – e era muito fácil. O quorum não passava de duas ou três mil pessoas…’


É impressionante o sucesso que fazem as colunas sobre gente. E com o ‘Moagem’ não foi diferente. Desde a primeira edição, cativou os associados do Sindicato e nunca mais parou. Foi um desafio. E confesso que no começo fiquei assustado com o tamanho da responsabilidade. Ilustre desconhecido e jornalista sem grandes credenciais, como seria escrever e ser lido por jornalistas muito mais conhecidos e quiçá preparados do que eu? Me vi naquela mesma situação de um médico consultando outro médico mais experiente. Você não pode errar para não perder credibilidade, embora no caso do jornalismo as consequências de um erro sejam, no geral, infinitamente menores. Mas era a minha reputação, a reputação do jornal e, em última instância, a reputação do Sindicato dos Jornalistas que estavam em jogo.


Bom soldado que era, aceitei o desafio, engoli os medos e me pus a campo para cumprir a missão a mim atribuída. Fui gostando. Fui aprendendo. Fui entendendo melhor a alma do jornalista, esse profissional que, sim, adora estar na vitrine, mas sem dar a entender que pediu para lá estar. Eu que descobrisse as coisas porque, vinda dos próprios jornalistas, não haveria notícias para a seção. Fui construindo progressivamente um estilo que ornasse com esse jeito de ser de quem está numa redação. Ok, não gostavam de falar de si, pois então que me passassem dicas dos outros.


E assim fui me abastecendo de notícias, de fontes e, de vez em quando, de alguns furos. No começo, me punha no telefone, disparando 60, 70 telefonemas. Com o advento da internet, hoje fecho as colunas muitas vezes sem dar um único telefonema. Apenas trocando e-mails.


Porta-voz da informação


Em termos de estilo, algumas curiosidades. Uma delas: risquei de meu texto o termo demitido e sou por vezes criticado por isso. Nas notas que publico as pessoas sempre saem, independentemente de pedirem a conta ou serem demitidas. E por que isso? Por respeito aos profissionais que, já abalados por perderem um emprego, ficam ainda mais expostos e para baixo quando veem associados aos respectivos nomes a palavra demitido. Claro, há casos em que essa regra é quebrada, sobretudo quando o próprio profissional faz questão de dizer que foi demitido para que todos saibam da sacanagem que contra ele se fez. Ou então no caso de cortes coletivos, quando isso é uma questão menor, pois não pesa contra aquelas pessoas qualquer suspeita de incompetência. Ao contrário, são em geral vistas como vítimas de uma situação sobre a qual não tinham domínio e, parte mais fraca, sacrificadas no processo.


Outra característica da coluna é a abolição, quase por completo, de adjetivos. Isso tanto por causa do espaço – sobretudo num jornal de papel, que é sempre uma coisa muito cara – como também em respeito à própria inteligência do leitor que não precisa ver adjetivada uma informação que ele próprio muitas vezes sabe julgar e dimensionar. O negrito foi outro achado da coluna. Ele grafa os nomes citados de modo a permitir aos leitores uma leitura dinâmica e prática. Com isso, os olhos varrem as duas páginas parando apenas nos nomes que digam alguma coisa a quem está lendo.


Também optei por não tomar partido nem emitir juízo de valor nas notícias explosivas, pois está ali o próprio jornal, com suas outras páginas, para fazer isso. A coluna é porta-voz da informação, e não do Sindicato. Ela conta o que houve, mostra os fatos de forma substantiva, apresenta os argumentos que estão no entorno da informação e deixa ao livre arbítrio dos leitores o julgamento sobre os fatos. Se é correta ou não a fórmula, não sei, mas é com ela que temos construído essa estrada de mais de duas décadas e com saúde para seguir em frente, enquanto as diretorias do Sindicato e editores do Unidade deixarem.


30 mil notas


Essa pegada editorial deu à coluna e ao jornal grande credibilidade e respeito e conseguiu abrir e manter abertas as portas em praticamente todos os veículos e em todos os escalões. Hoje, e já há muitos anos, somos lidos do revisor ao diretor de redação e nossas fontes também não conhecem fronteiras ou barreiras hierárquicas.


Nesses 20 anos, foram muitos os ‘causos’, alguns deles folclóricos, como o de confundir a Ana Cecília Americano, diretora do Sindicato, com a homônima Ana Cecília Americano poetisa, rendendo à primeira flores e telegramas em profusão por uma obra lançada pela segunda. Mas essa é uma história para um outro texto, quando e se o Observatório quiser.


Para concluir, numa rápida contabilidade, foram, nessas duas décadas, 225 edições, que registraram perto de 30 mil notas e fizeram referências a, pelo menos, 20 mil profissionais.


Isso é história.


Ah, e para quem tiver interesse em pesquisa, tenho todas as edições devidamente encadernadas e conservadas. Só não deixo que as retirem de seu lugar de origem, que é o armário ao lado de minha mesa de trabalho.

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Editor da coluna ‘Moagem’ e diretor-editor do informativo Jornalistas&Cia