Abrir uma página, fechar a janela, salvar um documento… Ações com as quais o homem deve ser naturalmente familiarizado requerem um novo aprendizado. Minha avó, que já abriu tantas páginas de livros de histórias infantis para seus netos, que já fechou tantas janelas de madeira e que sempre teve tanto capricho para eternizar documentos, se propôs a fazer um curso de informática para se inserir no novo contexto em que essas ações, tão banais, foram re-significadas. Diante da velhice e da distância que a separa de parentes, resolveu aprender a se relacionar virtualmente. Aos poucos, tem tentado aceitar os argumentos de que os pedágios e os perigos da rodovia não compensam um abraço, sendo tão instantânea a comunicação pela tela do computador.
Também para aliviar a solidão senil, embora sinta falta de conversas à mesa do café, acredita que sabe tudo do mundo por portais de notícia. As tragédias de enchentes e de assassinatos entre pais e filhos, pautadas incansavelmente pelo Datena e tantos outros, tornaram frágil a fé com que, viúva aos 26 anos, encarou o mundo e sustentou suas filhas.
Essa mídia, cujo fluxo de informações descontextualizadas e sensacionalistas transformou o modo de ver o mundo de uma senhora sábia de 78 anos, não é o que eu quero para mim. Faltando-me só alguns meses para ingressar formalmente no mercado de trabalho, almejo a oportunidade de traduzir em palavras uma realidade que, ainda que muitas vezes seja triste, não choque por sua dureza, mas que conscientize sobre suas causas.
Uma janela de madeira
Há de se mostrar que a fórmula mágica do lead fica muito aquém da complexidade de um fato, cujos protagonistas invariavelmente são seres humanos, que sabem bem a dor e a delícia de serem quem são. Não se podem reduzir à dimensão da pirâmide invertida, por exemplo, as causas que levaram aquele funcionário do Banco Central, Ricardo Neis, a atropelar mais de 15 pessoas no Rio Grande do Sul. É evidente que não proponho a prática de um jornalismo que negue aquilo que a Pontifícia cobrou tão caro para me ensinar. Não é essa minha pretensão, até porque a teoria que me foi vendida aqui acalma muitas das minhas inquietações e me faz vislumbrar uma infinidade de trabalhos dignos.
O que não quero é a grande mídia, essa vitrine de tudo que o mundo tem de ruim. Pelo respeito à minha avó, à humanidade e aos meus princípios, quero incentivar as pessoas a abrirem mais páginas de livros e menos páginas de internet, a salvarem mais cartas e certidões e menos documentos do Microsoft Office Word. Quero mesmo é que fechem as janelas do Windows (com o perdão da redundância provocada pelo casamento entre os idiomas) e abram mais vezes uma janela de madeira. Com vista para o mar.
******
Estudante de Jornalismo, Cosmópolis, SP