No primeiro fim de semana do ano de 2008, liguei o rádio na Jovem Pan. O assunto era futebol, tema costumeiro na emissora paulistana, que se gaba por ‘não ter mudado nada’ de sua equipe esportiva para o ano novo, em uma de suas chamadas institucionais.
O renomado jornalista esportivo Flávio Prado, autor de livros famosos no meio acadêmico, como Ponto Eletrônico, entrevistava um responsável pelo novo setor nas arquibancadas do estádio Palestra Itália, pertencente ao time do Palmeiras.
Esse novo espaço é destinado a cinco mil torcedores que compram seus ingressos exclusivamente pela internet. Segundo o site Terra Esportes, ‘o novo espaço tem áreas exclusivas, como banheiro, lojas, lanchonete e lounge, que conta com monitores de plasma, vending machines e áreas de estar’.
Problema é o preço
Mas nem tudo são flores no novo modo de vender ingressos. Comecemos pelo preço: R$ 49,50 por cadeira. Além disso, os assentos foram colocados exatamente no centro das arquibancadas descobertas, as mais populares. Ou seja, quem paga mais barato não vai ter direito a uma boa visão do gramado. Sem contar que o torcedor que desembolsa quase cinqüenta reais ainda leva chuva e sol na cabeça porque o local é descoberto (e mais caro que o coberto).
Mas o jornalista Flávio Prado desconsiderou todos esses fatores e só teve palavras elogiosas para o representante da empreitada palmeirense e para o projeto. Flávio gostou dos novos espaços, pois torcedor tem que ser tratado como consumidor e não pode ficar convivendo com ‘bandido, com marginal’. Ele ainda afirma que o sistema deveria se estender para todo o estádio do Palestra Itália, de modo a resgatar a dignidade do torcedor palmeirense.
Que o projeto deveria ser levado a todos os torcedores, não há dúvida. O problema é o preço. E para Flávio Prado, esse problema é uma solução, pois basta transformar o torcedor em consumidor (ou seja, cobrando 50 reais no ingresso) para que os ‘bandidos e marginais’ saiam de cena.
Só para rico
Querer melhorar a qualidade do serviço oferecido nos estádios é uma atitude louvável, mas excluir os que têm pouco poder aquisitivo de tal benefício e ainda tirar dessa torcida o lugar na arquibancada é inaceitável. Novamente, os que têm menos condições financeiras se dão mal em detrimento de meia dúzia de playboys.
Flávio ainda esquece que a imensa torcida do Palmeiras que lotou os jogos da equipe em 2007 – mesmo com o time em baixa – veio predominantemente das classes populares, que compraram ingressos das arquibancadas descobertas. Ele também se esquece que os ‘bandidos e marginais’ são fruto de um processo histórico que deixou essa camada da população com chances mínimas de mudança social. Sem contar que a imensa maioria dos torcedores que compram seus ingressos na arquibancada descoberta não faz baderna ou coisa do tipo.
Estamos no Brasil, um país pobre. É muito fácil elogiar os sistemas adotados em estádios europeus, mas precisamos adaptar tais esquemas à nossa realidade. Senão, daqui a um tempo, só os ricos terão acesso às partidas de futebol.
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Estudante de Jornalismo da Unesp, Bauru, SP