Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Consciência das tendências

A tendência é escrever menos, ou mais ou menos. A tendência é ser curto e grosso. A tendência é tomar ciência e ir em frente. Queimar o chão. Pular miudinho. Trocar em miúdos e ainda pedir desconto.


Textos longos, para quê? Parágrafos complexos e labirínticos – neles, estou perdido.


Menos adjetivos. Menos conjunções. Menos confusões. Menos alusões. Menos. Menos.


Raciocínios rebuscados me buscam à noite e eu os ponho para fora de casa. Quero imagens, elas são a última palavra, quero palavras simples, sou um escritor sem pretensões.


Esqueçam a nostalgia, não reclamem da rapidez generalizada, da fragmentação, do excesso de informação – estamos todos envolvidos e resolvidos, crie uma senha de seis dígitos.


Não, não é protesto, nem vingança, não é necessidade de afirmar uma determinada civilização, um projeto melhor, uma escola literária, uma forma de ler e pensar mais elaborada, não é questão de princípios, não se trata de saber a finalidade do que quer que seja.


Escrevo porque sim. Leio porque sim. Penso estar pensando.


Abrir a porta


As tendências são as que estão aí, tomo consciência de que o pouco é muito, o nada é tudo, o longo é curto, o dentro está por fora, o alto me rebaixa.


E lá vou eu e as palavras. Escolho ou sou escolhido, tanto faz. O texto que escrevo me leva e traz. Só queria, verdade: só queria um pouco de paz.


A respiração da escrita: inspirar, expirar, importar, exportar, in, ex, in, ex, inalar, exalar, inscrever, excrever (com ‘x’, sim), in, ex, in, ex, in…


‘Doutor, ele continua respirando?’


‘Ele, quem?’


‘O texto, doutor!’


‘Ah, sim, o texto. Parece que sim.’


O que aparece de repente some, o que desaparece já voltou, o certo duvida, o duvidoso vence, o inusitado entedia, o eterno termina.


Todos recriminam os paradigmas, e eles se tornaram paradogmas ainda mais cruéis. Eu mesmo já pensei que poderia salvar o mundo com uma frase esmerada. Que nada!


No entanto, quem desiste já dexistiu. Dexistir com ‘x’, sim, com ‘x’ – a decisão de quem abre mão, pendura as chuteiras, joga a toalha, lava as mãos, sai pela porta dos fundos, de fininho.


Continuar, portanto. Escrever, portanto. Muito ou pouco, isso não importa…


Importa, e muito!


Escrever é abrir aquela porta que alguém fechou há tanto tempo. Talvez eu mesmo a tenha fechado, sem querer. Escrever sempre! E exportar.

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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br