A crise econômica e o avanço da internet têm colocado a função de ombudsman nos meios de comunicação dos EUA – sobretudo nos jornais impressos – em xeque.
De um total, no início deste ano, de 35 cargos desse tipo nos Estados Unidos associados à ONO (Organization of News Ombudsmen, que congrega os representantes de leitores, ouvintes e espectadores de todo o mundo), 12 foram extintos ao longo de 2008, segundo o presidente da organização, Stephen Pritchard.
O próprio Pritchard, que exerce a função no semanal londrino The Observer, foi afetado pelos cortes que ocorrem do outro lado do Atlântico. Ele se tornou presidente da ONO depois que a jornalista Pam Platt, que ocupava o cargo, deixou de ser ombudsman do Courier-Journal, de Louisville, Kentucky.
O jornal, o primeiro a instituir o cargo nos Estados Unidos, em 1967, decidiu extingui-lo em agosto passado. O editor-executivo do diário, Bennie Ivory, justificou a mudança afirmando que ‘a nossa indústria’ passa por ‘tempos muito difíceis’.
Mesmo analistas que questionam a extinção de cargos como o de Platt não discordam de que os jornais americanos passam por severa crise econômica. Não há números precisos, mas o brasileiro Rosental Calmon Alves, professor de jornalismo da Universidade do Texas, fala em pelo menos 5.000 cargos cortados neste ano nas empresas de mídia dos EUA. Pritchard afirma que pelo menos 4.000 postos de trabalho foram perdidos.
Entre o início de 2005 e o fim de 2007 – antes do agravamento da atual crise financeira, portanto –, os jornais com capital aberto haviam perdido 42% do seu valor nas bolsas americanas, segundo um estudo do Project for Excellence in Journalism, ligado ao instituto de pesquisas Pew.
‘Uma das razões apresentadas para os cortes de ombudsmans é esse massacre, esse banho de sangue nas Redações dos EUA, especialmente nos jornais’, diz Calmon Alves.
‘O cenário é muito pior do que os mais pessimistas podiam prever um ano atrás. Num quadro desses, algumas funções acabam sendo consideradas um luxo. Há editores com quem converso que dizem preferir continuar tendo mais dois repórteres na Redação do que manter um ombudsman’, diz.
Pritchard também aponta o argumento econômico, mas afirma que usá-lo para justificar o corte de representantes dos leitores é ‘um raciocínio de curto prazo’. ‘Eu defendo que há um círculo virtuoso, do ponto de vista do negócio, na manutenção de um ombudsman na Redação. Ele dá mais credibilidade ao veículo. Maior credibilidade atrai mais leitores e mais recursos.’
Além do argumento financeiro, a própria necessidade da existência de ombudsmans tem sido questionada nos EUA. No início deste ano, Simon Dumenco, colunista da revista especializada em comunicação Advertising Age, defendeu que, com a internet, a função se tornou ‘obsoleta’.
Seu argumento é o de que os próprios leitores já são mais críticos do conteúdo dos jornais e podem advogar em causa própria na ‘blogosfera’. Além disso, ele diz, críticos de mídia especializados já avaliam os meios de comunicação de forma ampla, também por meio da internet, sem haver necessidade de um crítico próprio para cada veículo. Finalmente, espaços para manifestação de leitores em sites também cumpririam a função antes reservada aos ombudsmans.
Calmon Alves afirma que, de fato, esse tipo de opinião tem crescido nos EUA, alimentando o debate. Ele diz, no entanto, que é justamente nesse ambiente de ‘cacofonia’ virtual que um representante interno dos interesses dos leitores se torna ‘ainda mais necessário’.
‘Há mais gente, sobretudo dentro das Redações, questionando a função dos ombudsmans. Mas o júri não deu ainda o veredicto sobre o seu futuro.’