Os filmes que são ressuscitados em dias de eleição presidencial pela programação da Rede Globo sempre despertam curiosidades e a inevitável comparação com o momento cívico e emocional que estamos vivenciando. Nas duas últimas eleições para presidente, no segundo turno, quando Lula foi eleito, a sessão Temperatura Máxima, da emissora carioca, exibiu o filme O Náufrago, que a sinopse descreve como ‘um homem solitário por quatros anos em uma ilha deserta. O ambiente mais desolado que possa imaginar. Após quatro anos, Chuck volta para a civilização como um homem profundamente mudado’. Na sessão de Domingo Maior em 2006, após a confirmação da vitória de Lula, surgiu o clássico Os Dez Mandamentos, de Cecil B. DeMille, onde Moisés, lendário personagem bíblico, recebia as tábuas com os dez mandamentos a serem seguidos pela humanidade.
A história exibida ontem (31/10), durante a eleição, em segundo turno, de Dilma Rousseff, foi Inteligência Artificial. Numa resenha do ComCiência, de 2001, sem assinatura do autor, encontramos uma resposta para a interrogação sobre a programação metafórica de Temperatura Máxima:
Nesse sentido, Rodney Brooks (apud Folha de S.Paulo, 2001), diretor do Laboratório de Inteligência Artificial do MIT, para a produção do filme A.I., afirma: ‘Em 20 ou 30 anos, teremos capacidade tecnológica para construir um robô com a mesma quantidade de computação do cérebro humano. Só não sei se vamos conseguir decifrar os algoritmos necessários nesse período de tempo.’ Entretanto, ele esclarece: ‘A maior parte dos robôs que iremos construir não terá vontade própria.’ Penso que, nessa afirmação, se por um lado está demarcada uma ‘íntima’ relação entre os humanos e os robôs, por outro, tais ‘seres’ caracterizam-se como objetos perfeitos para ocuparem o lugar de objeto de gozo do outro que o possui.
Mais um vírus midiático
Mais instigante fica a programação quando, após a apuração dos votos que deram vitória à candidata apoiada pelo presidente Lula, a sessão de Domingo Maior exibiu Triplo X2 – Estado de Emergência, cuja sinopse diz:
‘O agente de segurança nacional Augustus Gibbons (Samuel L. Jackson) escolhe o novo Triplo X: Darius Stone (Ice Cube), um condecorado soldado de operações especiais que está atualmente em uma prisão, sob pesada vigilância. Após ser solto, Darius precisa se infiltrar num grupo de dissidentes radicais engajados no próprio governo, que planejam eliminar o presidente americano.’
Pode até não ter nada a ver, mas é muito curioso. E se o noticiário, hoje, é mais importante pelo que não diz do que pelo que está escrito, e a campanha eleitoral do segundo turno foi um ramalhete farto de pétalas envenenadas sob a égide da democracia e livre expressão, as possíveis intencionalidades contidas na programação dos filmes do domingo, 31 de outubro de 2010, deixam o telespectador arguto inoculado com mais um vírus midiático.
Metáforas do cinema…e da Globo.
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Mestre em Comunicação e Tecnologia