A equipe de José Serra sabe que somente um belo escândalo seria capaz de alterar os rumos da campanha eleitoral que se encaminha para uma vitória em primeiro turno da candidata petista Dilma Rousseff. O problema é que um escândalo capaz de mexer com a cabeça do eleitor precisa ter força midiática. É fundamental que contenha os componentes que o façam ‘ver’ o crime praticado, ‘sentir’ o impacto desse crime em seu bolso, em sua vida, no futuro de sua família.
O escândalo da invasão dos dados da Receita dos tucanos de farta plumagem, e até da filha do tucano-mor José Serra, em sociedades onde sigilo fiscal é reconhecido como direito fundamental do cidadão (como nos States, por exemplo), teria a força devastadora de um furacão. Bisbilhotar a intimidade do adversário já custou o mandato de Richard Nixon. E olha que Nixon nem mandou fazer o serviço sujo no edifício Watergate. Bob Woodward e Carl Berenstein apenas provaram que ele tinha conhecimento da invasão.
A oposição brasileira, desesperada com a queda livre de Serra nas pesquisas, precisa urgentemente de um escândalo. O que apareceu é gravíssimo, do ponto de vista do direito à privacidade, direito assegurado constitucionalmente, mas fraquíssimo do ponto de vista do apelo midiático. Não tem força suficiente para mexer o ponteiro do ibope. Por mais que esteja sendo mantido nas primeiras páginas, não tem o poder de comoção de uma imagem como aquela, inesquecível, de 1 milhão e 300 mil reais em dinheiro vivo, apreendidos numa operação da Polícia Federal na sede da Lunus, a empresa do marido de Roseana Sarney, e que custou a candidatura dela à Presidência da República. Nem a força das maravilhosas imagens do mensalão do DEM, que valeram o mandato de José Roberto Arruda no Distrito Federal.
Uma cédula de 50 reais numa cueca
Na sociedade atual, dominada pela força do audiovisual, é praticamente impossível convencer o eleitor que recebe o bolsa-família a retirar o apoio a Dilma, candidata de Lula, e transferi-lo a Serra ou a qualquer outro oposicionista só porque alguém do PT teria ido espiar a declaração do Imposto de Renda de pessoas próximas ao seu adversário. ‘Que mal há nisso?’, deve estar pensando o eleitor da zona rural de Quixeramobim, no Ceará, conferindo a conta do bolsa-família. Se a denúncia não se consubstanciar numa boa imagem ou, no mínimo, numa boa gravação de conversa suspeita, não tem apelo algum.
Lamento informar, mas se querem mudar o rumo dos ventos, consigam rapidamente uma foto, um vídeo, uma imagem incriminadora, uma gravação de conversa comprometedora. Algo que detone os sentimentos de forma direta, sem a mediação do racional. Invasão de sigilo fiscal ou bancário ainda é inócuo para o cidadão comum do Brasil. Pode até funcionar nos States. No máximo, dá uma peninha do caseiro Francenildo, que teve a conta bancária revirada supostamente com o conhecimento do então ministro Antonio Palocci. Mais nada. Do ponto de vista da percepção imediata, para o cidadão comum, se não houver roubo, ferimento, morte, pedofilia ou estupro, então não existe crime. No máximo, ‘uma história que andam falando aí de alguém que andou vendo a conta bancária dos outros’, algo assim. Ainda mais se a denúncia não trouxer pelo menos a imagem, mesmo borrada, de uma cédula de 50 reais escondida numa cueca. ‘Deem-me uma alavanca e um ponto de apoio e moverei o mundo’, disse Arquimedes. Na sociedade midiática, centrada no audiovisual, é só trocar a palavra ‘alavanca’ por ‘uma imagem’. Dessa forma, sim, dá pra mexer no ponteiro do ibope. Sem precisar nem de ponto de apoio.
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Jornalista, professor universitário e poeta