Uma das primeiras medidas do presidente Barack Obama, ao tomar posse, foi
pedir ao Congresso de seu país adiamento do prazo final (até então anunciado
como ‘improrrogável’) de desligamento da televisão analógica nos Estados Unidos.
Em 26 de janeiro de 2009 o Senado norte-americano atendeu o novo presidente e
adiou o término da transição para a TV digital terrestre (TDT) de 17 de
fevereiro para 12 de junho do mesmo ano. Ao colocar esta como uma de suas
primeiras iniciativas, Obama alegou a defesa de cerca de seis milhões de
norte-americanos, em sua maioria velhos e pobres, que teriam problemas para se
adaptar à mudança caso ela fosse processada imediatamente, pois ficariam sem
sinal televisivo.
É alvissareiro, depois da gestão George W. Bush, ver um presidente
estadunidense mobilizado na defesa de uma minoria, principalmente um coletivo
que não corresponde a grandes massas eleitorais: seis milhões significam menos
de 2% dos mais de 300 milhões relativos ao montante da população
norte-americana. Nos EUA, mais de 80% dos domicílios recebem o sinal via sistema
de televisão por assinatura, ao contrário do Brasil, onde a TV paga tem
caminhado a passos lentos e o forte é o modelo aberto, uma diferença a ser
considerada pelas autoridades brasileiras como um agravante para sua
popularização.
Recursos ainda em processo de definição
Num país em que a democracia aferra-se quase religiosamente à proporção dos
números, é relevante o fato da concessão da sobrevida à televisão analógica ter
sido aprovada, à revelia de tantos outros interesses, principalmente os
comerciais, a alma do negócio do american dream (deve-se considerar o
alto custo do chamado simulcasting, transmissões analógica e digital
paralelas). Os empecilhos da TV digital terrestre nos Estados Unidos (este
adiamento não foi o único) mostram a dificuldade de sua universalização e uma
fragilidade dos EUA propriamente. Isto contrasta com a imagem que o mundo
aprendeu a cultivar dos Estados Unidos, geralmente o pioneiro em quase todas as
inovações tecnológicas.
Do primeiro mundo dos norte-americanos ao emergente Brasil, poder-se-ia
imaginar que aqui as coisas seriam ainda piores. No entanto, pelo menos em
termos de implantação da nova tecnologia televisiva por parte das emissoras, o
calendário, previsto para ser executado em etapas, encontra-se adiantado. Até
agora, já são 12 as capitais brasileiras que contam com o serviço, que já chegou
ao interior brasileiro. Nesse mesmo mote, o objetivo do Ministério das
Comunicações é levar o sinal a todas as capitais brasileiras até o final de
2009.
Se o calendário brasileiro está indo bem, no que se refere à implantação esta
tecnologia tem sido muitíssimo pouco adotada pela população. Até dezembro de
2008, um ano após a estréia da TDT, apenas 645 mil receptores poderiam captar a
transmissão televisiva digital, entre receptores fixos e 150 móveis (celulares,
miniTVs e pen-drives). Isto pode ser atribuído à falta de atrativos para
motivar a migração, pois a televisão digital até o momento resume-se a superior
qualidade de imagem e áudio, além da portabilidade. Outros recursos, como
multiplicação da capacidade de transmissão de sinais televisivos
(multiprogramação), transporte de novos serviços e interatividade, ainda estão
em processo de definição.
Um país pujante e moderno
Depois da polêmica em torno da adoção do padrão japonês para a TDT e da
rejeição, pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva, de um sistema efetivamente
nacional, avançado e gerador de externalidades positivas, o Brasil, com sua
tradicional capacidade de superação das adversidades, mesmo as técnicas e
políticas, deve focar-se na necessidade de criação de políticas que estimulem a
adesão à TDT. Nesse quadro, a primeira preocupação deve ser a agregação imediata
de vantagens à TV digital, a ponto do usuário reconhecer que vale a pena fazer a
transição. Na seqüência, deve-se pensar em como superar o entrave representado
pelo baixo poder aquisitivo de grande parte da população, tendo em conta que o
governo norte-americano teve que subsidiar a compra dos conversores por famílias
de baixa renda.
No entanto, os números frios do desenvolvimento do calendário de implantação
da TDT no Brasil mostram um país pujante e moderno, rompendo um pouco com a
imagem truculenta oferecida ao mundo, como no caso do processo eleitoral e da
adoção de urnas eletrônicas. A velha e torta política brasileira pode não ter
melhorado muito, mas seu sistema eleitoral não só é sinônimo de uma democracia
eficiente aos olhos do mundo, como, principalmente, frente àquela que é
considerada a primeira democracia. Afinal, o que se viu, na recente eleição de
2000, foi uma trapalhada mundial ao vivo nos canais norte-americanos, um
imbróglio tecnológico-eleitoral que fez de George W. Bush o vitorioso contra Al
Gore num processo que tem sido apontado como fraudulento por diversos
setores.
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Respectivamente, professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos, pesquisador do CNPq e coordenador do Grupo de Pesquisa CEPOS; professor no Departamento de Comunicação da UFS, doutorando em Ciências da Comunicação na Unisinos e integrante do Grupo de Pesquisa Cepos