“Sugiro que alguns órgãos de imprensa e jornalistas façam reflexão e revisem suas fontes porque o Neymar cansou de ser vendido para o Barcelona e Real Madrid. Às vezes, as fontes se apressam em dar notícia sem compromisso com a verdade, atrás de interesses próprios. E os jornalistas acabam sendo vítimas de informações que não condizem com a verdade. Sempre declarei que Neymar não estava vendido. Fui até chamado de mentiroso. Fato concreto é que Neymar permanece no Santos, permanece no Brasil.”
Luís Álvaro Oliveira Ribeiro, presidente do Santos Futebol Clube, é o autor desse puxão de orelha da mídia esportiva. O desabafo ocorreu na quarta-feira (9/11), em Santos (SP), na coletiva em que o clube brasileiro anunciou a permanência do jogador Neymar até a Copa de 2014, no Brasil. Não é a primeira vez que este Observatório da Imprensa trata de barrigas da mídia esportiva em relação à venda de jogadores. Todos sabem que as especulações no mercado futebolístico são intensas, principalmente em períodos de abertura da janela de transferência de jogadores brasileiros para o exterior.
No caso de Neymar, apontado como a maior revelação do futebol brasileiro dos últimos anos, a mídia esportiva extrapolou. Em 20 de setembro de 2011, o este Observatório publicou artigo sob o título “Estadãopisa na bola”. No texto, questionávamos a credibilidade das fontes usadas pelo jornal para garantir que a joia santista fora vendida para o Barcelona e, dias depois, para o Real Madrid. “A edição do Estado de S.Paulo de segunda-feira (19/9) garantiu que a joia santista acertou sua transferência para o time de Madri. Assinada pela colunista Sônia Racy, a matéria informa que a negociação foi fechada na sexta-feira (16). Esclareceu que o atleta irá se apresentar ao time madrilenho depois das Olimpíadas de 2012 em Londres”, mencionava o artigo. Em outro trecho, dizia: “Com o título ‘Santos vende Neymar para o Barcelona’, o repórter Luís Augusto Monaco afirmou que o acordo tinha sido conduzido pelo presidente do Santos, Luís Alvaro Oliveira Ribeiro, que negou. Ambos os títulos do Estadão foram afirmativos”.
Críticas diretas
De fato, as matérias do Estadão foram as que mais repercutiram, dada a credibilidade que o diário paulista desfruta perante a sociedade. Outros sites, blogs e jornalistas deram notícias sobre a iminente saída de Neymar, como o ex-jogador Neto, comentarista da TV Bandeirantes. O narrador Galvão Bueno, que apresenta o programa Bem, Amigos!, no canal fechado SporTV, também duvidou da negativa da diretoria do Santos de que Neymar não fora vendido. Com sua habitual arrogância, o narrador criou mal-estar em um dos programas em setembro. Ao ser confrontado pelo colunista Alberto Helena Jr de que o Santos tinha negado a saída do jovem atacante, Galvão se irritou. Dizia ter informações seguras de que Neymar fizera exames médicos em São Paulo a pedido do time madrilenho.
Nesse período, a mídia jogou o chamado futebol brucutu, de baixo nível, em que se destacam caneladas e pontapés. Foram tanto chutões que alguém perderia as estribeiras. E foi justamente Luís Álvaro Oliveira Ribeiro, presidente do Santos, o clube que mais se viu prejudicado pelas especulações, que repreendeu à imprensa. E o fez publicamente.
Fato inusitado, no entanto, foram opiniões de outros jornalistas, que fizeram críticas diretas ao comportamento de parte de coleguinhas no caso Neymar. Deixaram de lado o corporativismo chato, de sempre, e partiram para o ataque. Sem meias-palavras. A lista dos que se abdicaram do “espírito de corpo” é extensa. Cito alguns, como André Rizek, do Redação SporTV, o narrador do SporTV e TV Globo Milton Leite, o colunista de O Globo Ancelmo Góis, o colunista Juca Kfouri, o diretor e comentarista do SporTV Paulo César Vasconcelos, o apresentador Milton Neves e o próprio Alberto Helena Jr, que meses atrás tinha contestado Galvão Bueno sobre a negociação de Neymar com o Real.
Bola fora
No artigo publicado neste Observatório, dizíamos que os jornalistas estavam à beira de cometer barriga no caso Neymar por puro desleixo. Ao não ouvir o Santos Futebol Clube – que detém 100% dos direitos federativos do atleta –, jornais, TVs, sites, rádios e blogs cometiam erro primário. “Barriga se constrói mais rapidamente quando o repórter ignora a palavra do clube que detém os direitos federativos do atleta. Há muitos interesses por trás dessas negociações”, apontava o texto. Mais adiante, advertíamos: “No caso do craque Neymar, além de Barcelona e Real há os empresários do atleta, as empresas com participação no valor da multa pela transferência para o exterior, estipulada em 45 milhões de euros, e o Santos Futebol Clube, naturalmente”.
O artigo seguia: “Por outras palavras, a mídia tem sido abastecida de informações de fontes diversas, ao mesmo tempo em que não tem dado voz ao clube. Qualquer negociação só será levada adiante se o Santos estiver à frente dela.” E sugeriu o seguinte: “Cabe aos repórteres entenderem que para cravar a venda de qualquer jogador é preciso que o clube que detém os direitos de venda seja ouvido, tenha voz. A palavra do Santos tem sido ignorada sobre negociações envolvendo Neymar.”
Que a bola fora da mídia sobre as negociações envolvendo o craque santista seja marco para que o jornalismo esportivo se livre das más fontes. Que as informações sejam mais bem apuradas para que a credibilidade desse ramo do jornalismo não vá para o lixo.
Afinal, lá de cima, João Saldanha, Nélson Rodrigues, Armando Nogueira, Fiori Gigliotti e tantos outros cronistas famosos estão com os olhos cobertos de tanta vergonha dos seus coleguinhas aqui na Terra.
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[Antonio Carlos Teixeira é jornalista, Brasília, DF