É, de fato, bastante interessante notar o papel da imprensa no sentido de fazer valer com freqüência o ditado de que ‘o mundo dá voltas’. Pois uma dessas voltas acaba de ser completada, envolvendo a filial brasileira do Balé Bolshoi, em Joinville, no Norte de Santa Catarina.
No final de novembro, a TV Globo, por meio do seu dominical Fantástico, levou ao ar uma reportagem indicando que o empresário João Carlos Prestes e sua mulher, Jô Braska Negrão, estão sendo investigados pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público de Santa Catarina. A razão básica é a suspeita de enriquecimento ilícito e de prática de irregularidades na administração do instituto que cuida da filial do balé, cuja sede está em Moscou (Rússia).
Em suma, o Fantástico defendeu que o balé russo é representado no contrato celebrado com a Prefeitura de Joinville pela Paramount Advisory Services, pertencente ao mesmo João Prestes, e que, segundo o governo da Irlanda, foi dissolvida em 2001.
Ocorre que é na Irlanda que a Paramount tinha sede. Mas, conforme o Fantástico demonstrou, a Paramount andou emitindo recibos em 2004. Para além disso, a reportagem indicou que a Paramount recebeu comissões enormes para intermediar as ações do Bolshoi no Brasil – algo que, diz o procurador da República Davy Lincoln Rocha, é ilegal, já que o Bolshoi, por ser instituição sem fins lucrativos e ligada à prefeitura, não pode pagar comissões. Consta ainda da reportagem a versão de Prestes. [A íntegra da reportagem está em (http://fantastico.globo.com/Fantastico/0,19125,TFA0-2142-5650-201514,00.html)]
Pauta abafada
A circularidade do caso pode ser compreendida quando se fica sabendo que boa parte dessas informações, tratando de possíveis irregularidades envolvendo o Bolshoi, chegaram ao conhecimento da redação do jornal Diário Catarinense (de Florianópolis, capital catarinense) no começo da atual década, quando este signatário atuava como correspondente do DC na sucursal de Joinville.
Após o comando da sucursal ser comunicado de que havia ali o indicativo de uma boa pauta, houve um pedido de informações por escrito, de parte deste mesmo signatário, à Prefeitura de Joinville, quanto às funções da Paramount no caso Bolshoi – um projeto que desde seu início foi visto pela imprensa catarinense, em geral, sem reservas.
Entretanto, em vez de receber uma argüição formal e coerente do Poder Público local, o que chegou à sucursal do DC acabou sendo uma determinação do editor-chefe de que o caso fosse esquecido, já que o então prefeito de Joinville teria feito contato com a direção do jornal ponderando que o veículo de comunicação estava querendo saber demais.
Diante da situação, conforme lido nas entrelinhas da ordem do editor, optou-se por abafar a pauta, uma atitude um tanto comum na sucursal de Joinville em determinados momentos e para determinados assuntos.
Perdeu-se, enfim, uma excelente oportunidade de trazer à opinião pública, à época, informações agora reveladas pelo Fantástico. Três anos foram necessários para os brasileiros, e não somente os catarinenses, passassem a saber que há tempos pairam suspeitas sobre o Balé Bolshoi, suspeitas essas que a Polícia Federal transformou recentemente em inquérito policial, para apurar quatro delitos – formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e peculato.
Fica a impressão de que as investigações em curso poderiam estar concluídas se tivesse o DC levado adiante a pauta.
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Jornalista, coordenador do curso de Jornalismo da Universidade Paranaense (Unipar), de Cascavel (PR), mestre em Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP)