Os argentinos passaram o fim de semana digerindo o resultado de “falso positivo” dos exames da presidente Cristina Kirchner. A notícia de que o diagnóstico inicial tinha sido modificado – ou seja, não era câncer de tireóide – deu margem para especulações de todo o tipo na imprensa. Erro médico? Uso político? Para acalmar os ânimos, no final da tarde do domingo (8/1) a equipe médica divulgou uma cópia dos primeiros exames em que os especialistas falavam de “citologia compatível com carcinoma papilar (Bethesda categoria VI)”. Isto é, com um valor do sistema Bethesda que caracteriza o tecido como tumor maligno, que deve ser extirpado mediante cirurgia.
A linguagem médica do documento, no entanto, era cautelosa e qualificava o analisado como “compatível” com um carcinoma, o que deveria ser confirmado com biópsia posterior à cirurgia. Segundo os médicos, isso não se confirmou e a presidente entrou para os 2% de casos denominados “falsos positivos”, que só podem ser verificados após a cirurgia (esta, inevitável, com ou sem câncer).
A briga na mídia
Como a mídia abordou o tema?
O jornal Clarín, principal opositor ao governo, costuma abrir fogo nos títulos e manchetes (embora os textos não deixem por menos). “A presidente foi operada por um câncer que não teve”, “Governo admite que o diagnóstico estava equivocado”, “Cristina foi operada sem necessidade e lhe tiraram inutilmente as tireóides”. “Quer dizer que Cristina Fernandez não tem câncer e agora também não tem glândula tireóide”, salivou uma jornalista.
La Nación é mais sóbrio nas manchetes (“A presidente não tem câncer”, ou “Casa Rosada nega erros no tratamento da presidente”). E também nos textos, que são infinitamente mais profissionais que os do Clarín. Por outro lado, bombardeia nos editoriais e artigos. Carlos Pagni, no texto “Mala Práxis do governo”, coloca pimenta na história. “Todas estas irregularidades nos obrigam a perguntar se o governo trata o corpo da presidente com a mesma negligência com que administra a moeda”, diz. Os comentários são de arrepiar! Os jornais mais alinhados abusam do tom na outra ponta, claro. “A melhor notícia”, alardeava o Página 12 de domingo. “Governo assegura que contou tudo sobre a saúde de Cristina”, dizia El Argentino.
Como vocês podem ver, o tema ainda vai render por aqui. E fica a impressão de que qualquer que fosse o resultado dos exames, a briga na mídia ia seguir igual. Pior para o leitor, que fica sem entender nada. Mas com um ex e um atual presidente que já passaram por problemas de saúde, o Brasil sabe bem como é isso.
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[Gisele Teixeira é jornalista, autora do blog Aquí me quedo]