Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Restabelecer a exigência do diploma é a saída

O fim da exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista, conformado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em junho de 2009, atende aos interesses de uma minoria, contribuindo para a flexibilização das relações de trabalho e, em decorrência, o aumento do desemprego. Recentemente, o jornal Folha de S.Paulo demitiu dezenas de profissionais, sob o pífio argumento de que precisaria enxugar seu quadro funcional. Segundo o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, a alegação é injustificada, pois o faturamento daquela empresa só tem aumentado nos últimos anos.

Estas práticas contribuem para a fragilização da categoria, propiciando aos empresários da comunicação realizarem acordos trabalhistas cujo interesse é assegurar lucros crescentes. O piso salarial do jornalista, no estado de São Paulo, corresponde a R$ 1.940,00 reais, por cinco horas diárias de trabalho. Se tal valor é baixo, a incorporação de freelancers e a utilização de estagiários implicam uma economia ainda mais significativa nos gastos com mão de obra qualificada. Obviamente, isto não atende aos interesses da população, pois é reforçada a massificação desta atividade, cada vez mais menosprezada pelos donos da mídia.

Mudança de foco

O discurso hegemônico procura introjetar no senso comum a ideia de que, como todos são livres perante a lei, não pode haver restrições quanto à produção de conteúdos. Segundo esta perspectiva, qualquer tentativa de cercear este direito seria uma afronta à liberdade de expressão e de imprensa, o que evidencia apenas o que há de superficial neste debate. Os jornalistas profissionais não são contrários à livre produção de conteúdos, sobretudo considerando a crescente popularização da internet e a pluralidade de blogs e plataformas de distribuição de vídeo, que, em alguma medida, contribuem para democratizar a comunicação.

Acontece que muitas produções pretensamente alternativas apenas reproduzem a lógica da indústria cultural, sem romper com seu discurso e reafirmando seu padrão tecnoestético. Já a luta pelo retorno da exigência do diploma pode contribuir para assegurar o contrário, legitimando um grande número de profissionais que participa de projetos comunitários e emprega sua força de trabalho na produção de conteúdos verdadeiramente alternativos e na formação de repórteres populares. Isso busca subverter a pseudoverdade absoluta vendida pela grande mídia e apresenta um olhar diferenciado dos fatos.

Formação em série

É importante salientar que a formação superior precisa ser apurada, inclusive em comunicação. Dados do Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF) indicam que, em 2009, 15% dos jovens brasileiros não tinham habilidades de leitura e escrita coadunadas com as exigências de suas respectivas escolaridades. Por isso, a necessidade de formação acadêmica, considerando seus problemas e perspectivas, abrangendo a discussão dos princípios do Jornalismo, que, se conduzida por profissionais sérios e comprometidos com os desafios da comunicação, pode incentivar o desenvolvimento da criatividade e da prática investigativa.

Nesse sentido, é preocupante perceber que a proposta dos empresários, permitida pelo STF, está embasada na possibilidade de formação fornecida pela empresa. Os próprios “manuais de redação” representam meras cartilhas de uniformização e regramento, as quais precisam ser seguidas pelo “jornalista”, ao produzir uma matéria. Não obstante, ser jornalista é mais do que isto. Assim, quando os empresários da comunicação colocam-se frontalmente contra a exigência do diploma estão contribuindo para a manutenção do discurso único, mesmo ao tergiversarem e insinuarem que estão agindo em nome do interesse público.

As Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que restauram a exigência de diploma de jornalista, em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, constituem-se em movimentos de suma importância para o país. Várias cidades jáaprovaram projetos de lei que obrigam os órgãos públicos a contratar somente jornalistas com graduação na área para o exercício da profissão. Embora ainda seja pouco, estes movimentos sinalizam que a discussão pode acirrar-se. A batalha está só começando e, tal qual tem ocorrido com o debate sobre a criação de um novo marco regulatório para a mídia, está longe de se esgotar.

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[Valério Cruz Brittos e Eduardo Silveira de Menezes são, respectivamente, professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e mestre em Ciências da Comunicação pela mesma instituição]