Semana passada , a imprensa noticiou que Hugo Chávez tem “um tumor na região pélvica” com ênfase para o que disse Chávez: “Desminto que tenha metástase (…) e que já esteja morrendo” (ver aqui). O “presidente afirmou ainda que não se sabe se a lesão é cancerígena ou não, mas que a probabilidade do tumor ser maligno é muito grande, pois ele surgiu no mesmo local do anterior”(ver aqui) ou “que existem altas probabilidades de que o tumor cancerígeno encontrado em sua região pélvica, no mesmo local onde já fora extraído um câncer” (aqui).
A notícia é a mesma, mas a forma de dá-la é sutilmente diferente. No primeiro exemplo, o câncer é colocado em dúvida ou desmentido; no segundo, o próprio presidente admite a hipótese de câncer (mas prefere usar a expressão “tumor maligno”); e no terceiro, o câncer e a metástase são admitidos. Os três fragmentos falam menos sobre o mal que acomete Chávez do que do câncer metastático que aflige as redações jornalísticas. O que deve prevalecer? A notícia ou a “linha da casa”?
Onde a “linha da casa” é um apoio a Chávez, o câncer é tabu. Onde a “linha da casa” é o oposto, o câncer é fato consumado. Enquanto isto, o paciente, que é o leitor, morre de tédio consumindo propaganda política por jornalismo isento. Não dá para melhorar? “Câncer pode ser letal. Estadistas são mortais. Portanto, estadistas eventualmente morrem de câncer.”
A cobertura do câncer
A lógica formal, entretanto, parece ser negada em alguns casos jornalísticos. Quando isto ocorre em razão de mau jornalismo, não devemos ficar preocupados. Mas quando ocorre em nome da governabilidade, a razão do incômodo é grande. Afinal, os Estados não morrem, exceto quando são identificados ao governante. A personalização do Estado é um mal bem conhecido desde os tempos em que Luís XIV dizia “L’État c’est moi”e o descendente dele, Luís XVI, foi decapitado junto com o Estado monárquico francês.
A Venezuela bolivariana está condenada a morrer com Chávez? Não sei, mas se isto ocorrer a culpa certamente não poderá ser atribuída à imprensa brasileira. Portanto, penso que é possível melhorar a cobertura jornalística do câncer de Chávez.
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[Fábio de Oliveira Ribeiro é advogado, Osasco, SP]