Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Dói demais…

O desabafo é da mulher do cantor sertanejo Pedro Leonardo, em coma, depois de um acidente de carro. Só que a dor a que ela se referiu na quinta-feira (26/4) teve a ver com o pavoroso assédio da imprensa na transferência do rapaz de um hospital em Goiânia para outro, em São Paulo. “Gostaria muitooo que as pessoas pensassem nele como um ser humano! Que tem família! O que essas pessoas queriam ver?! Ele entubado? Não consigo acreditar quando vejo as imagens! Pelo amor de Deus, vocês sabem o que é ver alguém entubado? Dói demais!”

O cerco de fotógrafos e cinegrafistas ao lado da ambulância, em Goiânia, foi mesmo assustador.

Uma médica havia avisado que qualquer tipo de tumulto durante a saída do cantor poderia acarretar riscos para sua saúde, tão debilitada. Mas quem disse que os “profissionais” da imprensa se incomodaram com isso?

Não adiantou a equipe do hospital colocar dois biombos na tentativa de preservar o paciente. Como micos amestrados de um circo eletrônico, cinegrafistas e fotógrafos subiam onde podiam, filmavam por baixo do biombo, se engalfinhavam, e na tentativa do que? Registrar um ser humano em coma, todo entubado…

A mídia “perdeu a mão”

Pergunto a vocês, meus parcos leitores, o que acrescenta uma imagem como essa? E se um deles se desequilibrasse e caísse sobre a maca? E se Pedro morresse?

Os idiotas da objetividade (obrigado, Nelson Rodrigues) vão dizer que este é o trabalho jornalístico e eu serei obrigado a mandá-los às favas (para não usar um palavreado de baixo calão). O respeito ao ser humano vem antes de tudo, mas nossa imprensa já se esqueceu disso há muito tempo. News are business e na cabeça doentia de quem deu a ordem de fazer a imagem, custasse o que custasse, tal imagem poderia render pontinhos de audiência, ou uma capa impactante.

Foi o que o jornal carioca O Dia fez ao estampar a foto do técnico Ricardo Gomes em um leito de hospital na primeira página.

Há quem argumente, talvez, que alguém faria a imagem e quem optasse por não fazê-la seria “furado”. Pois sejamos furados, senhores, e sempre, quando for em casos assim. A desculpa de “Maria vai com as outras” não é uma decente justificativa.

Realmente, parece que nossa mídia, em geral, “perdeu a mão” e o resultado dessa receita, como vocês podem ver, é intragável.

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[Rafael Casé é editor do Observatório da Imprensa na TV]