Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

A grande imprensa e o Caixa 2

Renato Lessa, professor da UFF, apresentou, infelizmente, em poucas pinceladas, no programa televisivo do Observatório da Imprensa (7/8, ver íntegra aqui), uma questão muito importante – a do desvirtuamento da representatividade no modelo de politica representativa brasileira, que mereceria uma pauta mais larga para aprofundar a discussão nestes tempos de afloramento do tema Caixa 2 de campanhas eleitorais de um modo maniqueísta.

Disse o cientista político que, ao votar, o eleitor delega ao seu candidato o poder de decidir acerca dos rumos políticos da cidade, do estado e do país. Feita esta delegação e eleito o então candidato, ocorre, na maior parte das vezes, um desaparecimento da figura do eleitor, até então tão importante no jogo eleitoral, e se agiganta a figura do financiador de campanha. A representatividade do eleitor cai no vazio pós-eleitoral. Renato Lessa diz que, após a eleição, a representatividade gerada nas urnas se torna um ente sobrenatural porque desaparecem os laços que aparentemente ligavam representantes e representados.

Da parte do eleito prepondera, na prática, compromisso não com o seu eleitor, e sim, com quem financiou sua campanha. Aparentemente, vinga uma visão pragmática de atender, em primeiro lugar, os interesses dos financiadores de campanha, e por último dos seus eleitores. Alguns riscam de sua agenda os compromissos de campanha e só atendem, de modo clientelista, casos individualizados e pontuais e defendem apenas interesses difusos da sua região, sempre priorizando ganhos pessoais e financeiros e em caso de colisão de interesses entre eleitores e financiadores de campanha, não hesitarão em ficar ao lado destes últimos. Melhor ainda se houver possibilidade de mascarar esta ação politica. Hoje, mais do que ontem, existe um arsenal de argumentos e conceitos, gestados no consenso de Washington, que oportunizam maquiar os interesses escusos e apresentá-los como o plus ultra da modernidade e como virtuosos.

Esclarecedor e equilibrado

O jornalista Luiz Gutemberg, apesar da simpatia irradiante, fez a parte do defensor do corporativismo jornalístico (mais dos patrões que ditam a linha editorial), dizendo que estamos, no dia de hoje, no “melhor dos mundos”, isto é, a imprensa está cobrindo muito bem o julgamento do “mensalão”. Bem diferente do que ouvi outro dia de Dan Rather, ex-anchor man da CBS, em entrevista com Bill Maher, quando dizia, falando da história recente da imprensa americana, que esta vigia os interesses comerciais e financeiros do dono do jornal, mas ao mesmo tempo preserva a defesa do cidadão – e hoje domina apenas o interesse do primeiro e dos grandes anunciantes.

O jurista Dalmo Abreu Dallari adotou uma equidistância do enfoque dos demais, acentuando, em sua primeira intervenção, a competência do Supremo Tribunal Federal a despeito de todas as suspeitas. Na sequência, questionou o “fato consumado” criado pela imprensa, que condena de antemão os réus e, pior, já se posiciona contra qualquer outra sentença que não seja a condenação de todos.

Desta composição dos entrevistados resultou um esclarecedor e equilibrado programa, bem conduzido por Alberto Dines e bem diferente daquele programa sobre a crise paraguaia onde o desequilíbrio criado pelo fato dos dois entrevistados serem pró- governo paraguaio, quando o entrevistador se viu constrangido, procurando salvar o programa, fazendo ele mesmo o papel de contraponto.

Faltou, talvez, na discussão uma abordagem sobre o papel das redes sociais no “Julgamento do Século”. Acredito que não faltará oportunidade para proporcionar um debate sobre o impacto deste julgamento nelas.

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[Jorge Alberto Benitz é engenheiro e consultor, Porto Alegre, RS]