As autoridades do mercado de valores mobiliários dos Estados Unidos estão revendo se devem relaxar os limites sobre o que as empresas podem dizer antes de ofertas públicas iniciais, depois de os legisladores reclamarem que pequenos investidores foram mantidos no escuro durante a tumultuada abertura de capital do Facebook Inc., em maio deste ano.
Mary Schapiro, presidente da Securities and Exchange Commission, ou SEC, a comissão de valores mobiliários dos EUA, pediu à sua equipe para revisar os “períodos de silêncio”, regras que restringem os comentários que uma empresa pode fazer sobre suas perspectivas na época que antecede a uma venda de ações, de acordo com uma carta que ela enviou recentemente ao deputado Darrell Issa, um deputado republicano da Califórnia. “Nós devemos revisar as nossas regras de comunicação e da aplicação do período de silêncio” na esteira de mudanças na tecnologia e nos mercados de ações nos últimos anos, disse ela na carta de 23 de agosto, em resposta a uma que o deputado enviou em junho.
A postura da SEC poderia abrir a porta para mais mudanças no processo de aberturas de capital, mesmo que a agência ainda precise completar as regras para a implementação das modificações previstas numa nova lei do governo federal para estimular empresas a contratar mais trabalhadores. A lei, conhecida como JOBS, foi projetada para facilitar a captação de recursos por algumas empresas.
Abertura de inquérito
A lei de empregos e a abertura de capital cheia de falhas do Facebook em maio transformaram as ofertas públicas iniciais de ações no tema mais polêmico dos mercados americanos este ano. A cotação da ação do Facebook caiu acentuadamente desde os US$ 38 da oferta inicial. A aguardada abertura de capital foi prejudicada por problemas técnicos na bolsa eletrônica Nasdaq e a Facebook e seus assessores no processo foram criticados por ter fixado um preço inicial alto demais. A ação fechou ontem com queda de 1,33%, para US$ 19,15. A oferta pública inicial também revelou como grandes clientes de determinados bancos podem ter acesso a dados analíticos sobre as perspectivas de uma empresa que não estão disponíveis para o investidor médio antes da operação.
Schapiro preferiu não fazer comentários específicos sobre a Facebook em sua carta. Não está claro quando começou a revisão das regras de comunicação em períodos de abertura de capital, que ela disse estar em curso. Schapiro disse que a agência poderia revisar regras que proíbem executivos de empresas prestes a abrir seu capital de promover a ação. A carta foi enviada em resposta a um pedido que Issa fez, em nome do Comitê de Supervisão e Reforma de Governo, que ele preside, por mudanças nas regras sobre como as ofertas públicas são regulamentadas e como seus preços iniciais são definidos. Issa disse em sua carta de 19 de junho que, no caso da abertura de capital da Facebook, “a desvantagem no acesso de dados para o público menos informado provou ser prejudicial”.
Pouco antes da abertura de capital, o Morgan Stanley e outros bancos subscritores da abertura de capital de US$ 16 bilhões do Facebook analisaram e repassaram a seus clientes alertas da empresa sobre riscos a que a ela estava exposta devido a uma mudança de hábitos dos usuários, que passaram a preferir acessar o site de rede social por aparelhos portáteis como smartphones e tablets. As discussões dos analistas com os clientes escolhidos a dedo levaram à abertura de um inquérito pelo órgão regulador do estado de Massachusetts para saber se alguma regra foi quebrada.
Nenhuma ação foi tomada
Os bancos negaram qualquer irregularidade e dizem que estavam seguindo as práticas padrão para a comunicação com investidores. As atuais regras sobre períodos de silêncio nos EUA permitem a comunicação com clientes antes de uma abertura de capital, mas não a publicação ampla de pesquisas.
Schapiro disse que as regras atuais impondo um período de silêncio oferecem “benefícios reais”. O papel central dos prospectos – documentos que a empresa precisa apresentar à agência reguladora e que são públicos – “garantem que uma ampla base de dados sobre a empresa pode ser acessada de forma fácil e rápida por todos os investidores”, escreveu ela. Ela disse que alterações feitas às regras em 2005 passaram a permitir o uso de “escrita livre”, tais como e-mails, para a comunicação de novas informações, desde que elas sejam acompanhadas pelo prospecto.
As empresas provavelmente gostariam de ver um abrandamento da regra, considerada uma armadilha para executivos. A Groupon Inc. enfrentou uma investigação da SEC no ano passado. O motivo foi um e-mail otimista sobre as finanças da empresa de compras coletivas que o diretor-presidente Andrew Mason enviou para os funcionários, depois de ter apresentado sua papelada para a abertura de capital com os reguladores. Nenhuma ação de fiscalização foi tomada.
Aberturas de capital “subestimadas”
Os legisladores também dizem que os bancos e as empresas estariam dispostos a adotar uma extensão dos “portos seguros” de ações judiciais para a pesquisa e outras comunicações durante o processo de abertura de capital, como defende Issa. Algumas das propostas mais radicais de Issa podem ter pouca chance de sucesso. Ele recomendou à SEC que considere oferecer incentivos a empresas para usar “leilões holandeses”, em que os preços são determinados por um processo de oferta aberto a todos os investidores.
A maioria das aberturas de capital usa um processo de bookbuilding, em que os subscritores e a empresa definem um preço depois de discutir a emissão de ações com grandes investidores. Apenas cerca de 20 das quase 2.000 aberturas de capital desde 1999 usaram leilões, segundo a Dealogic.
Schapiro sugeriu que os bancos preferenciais e emissores escolham a melhor forma de determinar o preço de uma abertura de capital. Ela disse que alguns especialistas acreditam que há razões legítimas pelas quais uma abertura muitas vezes dá errado, derrubando a ação, ou vai bem, com a ação subindo rapidamente acima do preço inicial no primeiro dia de negociação. Pesquisas acadêmicas indicam que as aberturas de capital no mercado americano foram “subestimadas” em média 17,9% das vezes ao longo das últimas quatro décadas, acrescentou ela.
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[Jean Eaglesham e Telis Demos, do Wall Street Journal]