Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Um retrato do movimento estudantil pós-64

As edições do jornal O Mícron publicadas em 1966 e 1967, portanto nos primeiros anos do golpe civil-militar de 1964, registram um momento do movimento estudantil no Rio de Janeiro e possivelmente antecipam sinais dos desdobramentos da resistência à ditadura nos anos seguintes e mesmo dos acontecimentos de 1968.

Publicado desde 1945 pela Agremiação Estudantil Técnica Industrial (AETI), da Escola Técnica Nacional (ETN), o jornal passou na época por uma completa reforma editorial e gráfica. As sete edições (números 47 a 53) publicadas no período apresentam uma ampla variedade de temas políticos e culturais.

Glauber e Feola

Além dos acontecimentos do movimento estudantil na escola e no país, o jornal tratava de política, cinema, música, teatro, futebol e outros temas. A edição 49, de junho de 1966, tem entrevistas de Glauber Rocha, que então preparava o roteiro do filme Terra em Transe, e de Vicente Feola, técnico da seleção brasileira de futebol, antes do embarque para a Copa na Inglaterra. A edição 53, de junho de 1967, teve 7 mil exemplares.

O Mícronteve dezenas de colaboradores nesse período, sob a liderança de Iuri Xavier Pereira, Carlos Alvarez Maia, Domingos Fernandes e Altamir Tojal. A idade média era 18 anos. A maioria dos colaboradores do jornal participava do movimento estudantil. Alguns eram apaixonados pelas ideias de revolução e liberdade e outros simplesmente queriam extravasar a inquietação e a rebeldia, traços comuns em uma parte da juventude na época.

Resistência à ditadura

Essa equipe deixou de editar o jornal no final de 1967. Isso aconteceu em meio ao aumento da repressão e à reorientação estratégica de parte da resistência à ditadura, na direção da luta armada. O período coberto por estas edições do Mícron foi prodigioso de iniciativas do movimento estudantil na escola, que foram noticiadas no jornal. Outras tantas atividades não puderam ser registradas devido à interrupção da publicação.

A ETN tinha sido rebatizada então como Escola Técnica Federal da Guanabara e logo depois Escola Técnica Celso Suckow da Fonseca. Tinha cerca de 5 mil alunos, a maioria de famílias de classe média baixa e proletárias dos subúrbios. Os estudantes completavam o curso secundário e se formavam em técnicos de diversas especializações, como mecânica, eletrônica, eletrotécnica e edificações.

Eleições acirradas

Desde antes de 1964, a AETI tinha uma ampla atuação associativa e uma agenda reivindicatória e política. Logo depois do golpe, o movimento estudantil na escola tornou-se mais ativo, sob influência, pela esquerda, de organizações como o Partido Comunista Brasileiro (PCB), Ação Popular (AP) e outras, que atuavam politicamente e disputavam as acirradas eleições da AETI com setores despolitizados e mesmo conservadores.

Estas edições do Mícron também revelam que, além da participação na AETI, as lideranças estudantis da ETN atuaram da reorganização da Associação Metropolitana dos Estudantes Secundários (AMES) e da União Nacional dos Estudantes Técnicos Industriais (UNETI), que tinham sido desestruturadas depois do golpe.

Veja aqui reproduçõesdas edições de 1966 e 1967.

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[Altamir Tojal é jornalista]