Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Aos cristãos, com todo o (des)respeito

A revista Placar de outubro gerou polêmica antes mesmo de chegar às bancas. A edição traz como matéria principal uma análise sobre a fama cai-cai de Neymar, melhor jogador em atividade no Brasil e uma das principais esperanças da Seleção Brasileira para a Copa de 2014. Toda essa discussão é muito válida, uma vez que a população brasileira anda mesmo sem paciência com o atacante. O problema (problema é muito subjetivo, neste caso) é a capa da revista. Sim, todo um rebuliço por conta de uma… capa!

Pois é. Foi feito uma fotomontagem onde Neymar aparece crucificado. O título da matéria diz “A crucificação de Neymar”. A repercussão nas redes sociais foi quase imediata e choveram críticas aos editores da Placar. Tanto que ela se sentiu no dever de dar uma resposta ao leitor. Em nota, a revista pede desculpas e diz que “em nenhum momento foi a intenção da revista ferir a religiosidade de ninguém”. E que a “analogia da fotomontagem é com a crucificação como método de execução pública praticado antigamente”.

É visível, ao soltar essa nota, a preocupação da revista em esclarecer esse fato. E é visível tamanha repercussão negativa dos cristãos. Repercussão essa, diga-se de passagem, que é a famosa e, neste caso, literalmente “julgar pela capa”. As pessoas que estão criticando sequer leram a matéria.

Cabeça trocada

Ainda segundo a revista, a ideia da capa surgiu quando a matéria estava sendo produzida e surgiu a palavra “crucificação”. Talvez, para alguns, a analogia – mesmo que a intenção não tenha sido essa, foi (muito) infeliz. Quando algo é produzido por “formadores de opinião” deve-se levar em consideração o leitor também. E, vendo por esse lado, a Placar só pensou no lado dela. Desculpa. Ela atinge todo o tipo de público religioso, devia tomar um pouco mais de cuidado. Alguém teve a ideia, acharam que encaixaria perfeitamente com a matéria, e pronto. A montagem foi feita e a capa foi escolhida. Acontece que, como dizem “polícia, religião e futebol não se discute”. Não foi discutido, foi para as bancas, e aí…

Sexta-feira, 28 de setembro. Essa foi a data em que a Placar chegou às bancas. Não demorou a igreja se manifestar. Também por meio de nota, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) repudiou a capa: “A ridicularização da fé e o desdém pelo sentimento religioso do povo por meio do uso desrespeitoso da imagem da pessoa de Jesus Cristo sugerem a manipulação e instrumentalização de um recurso editorial com mera finalidade comercial.”

Como dito, segundo a Placar, não era a intenção comparar o craque santista com Jesus Cristo. Mas, no transcorrer da matéria é explicado que “[…] Neymar é pego para cristo e pintado como detrator de um falso bom-mocismo no futebol.” Que me desculpem, mas você faz uma analogia com a cruz e depois cita “pego para cristo” na matéria? Discordo, Placar, você teve a intenção, sim! Vale ressaltar que a fotomontagem foi feita em cima de uma obra do pintor Diego Velázquez; basta comparar as fotos. Só a cabeça foi trocada.

Mais polêmica

O fato é que a Placar ainda chamou Neymar de “bode expiatório”, expressão que surgiu no tempo bíblico quando o irmão de Moisés sacrificou um bode para a remissão de pecados. O bode foi sacrificado por um pecado que nem era dele por isso o termo bode expiatório teve/tem tal significado. Depois de tudo isso, fica difícil acreditar que a revista em xeque não tenha tido a intenção de “transformar Neymar em Cristo” e, no fim, tudo que conseguimos enxergar é uma jogada de marketing que, por hora, funcionou; já que isso virou pauta até em boteco de esquina e tem muita gente por aí pagando R$ 10 só para ver “no que isso vai terminar”.

A matéria, aliás, que foi escrita por Breiller Pires, tirando esses termos “cristo” e “bode expiatório”, está impecável. Levanta questões como jogadores que sofrem faltas absurdas e que não são marcadas e que essa coisa de “cai-cai” faz parte do futebol desde os primórdios deste esporte. A Placar bem que tentou ludibriar a inteligência da chamada “massa”. Mas, como dizem, “contra fatos não há argumentos” e não há como passar despercebido algo tão notório em um primeiro momento e, que se tens certeza após a leitura do texto.

Existem os que não se incomodam, e os que se sentem completamente ofendidos. Não bastasse o (des)respeito para com seus leitores, o (des)respeito com o craque que, é, também, um cristão. No fim, a matéria, que era para defender o santista, acabou se tornando só mais um gancho para levantar mais polêmica em torno dele.

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[Jaiane Valentim é estagiária em Jornalismo, Diadema, SP]