“Usa-se uma entrevista que não houve para, mais uma vez, tentar indigitar o ex-presidente.” [Senador Roberto Requião (PMDB-PR)]
O pronunciamento do senador Roberto Requião, solidarizando-se com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva diante da avalancha de insultos pesados com que vem sendo alvejado por parte de alguns oposicionistas e de grupos midiáticos poderosos, faz por merecer uma boa reflexão. O ex-governador do Paraná é veemente nas afirmações. Colocando pingos nos iis, assegura que os ataques são ditados por oportunismo, irresponsabilidade, ciumeira e ressentimento. Acrescenta que os responsáveis pela desabrida campanha são pessoas que jamais “desculparão” a chegada “do retirante nordestino à Presidência da República”. “A ascensão do metalúrgico talvez fosse aceita, mas não a do pau-de-arara! Este, não!”, exclama.
Contundência não falta, é de se ver, no discurso. Mas contundência também não tem faltado, verdade seja dita, em manifestações da mídia anotadas, como exemplos, por Requião, por ele classificadas de desrespeitosas e grosseiras ao ex-presidente e à atual chefe da nação. Um lance específico, da mais pura baixaria, é mencionado. “Por vários dias, a nossa gloriosa grande mídia deu enorme destaque às peripécias de uma pobre mulher, certamente drogada, certamente alcoolizada, certamente deficiente mental, que teria tentado invadir o Palácio do Planalto, dizendo-se ‘marido’ da presidente.” Requião conta que “sem qualquer pudor, sem o menor traço de respeito humano”, jornal de grande circulação nacional transformou “a infeliz em personagem, em celebridade”, chegando mesmo ao absurdo de “destacar repórter para ‘entrevistar’ a mãe da tal mulher, meu Deus!”
Não foi pouco
Na avaliação do ex-governador do Paraná, o que parece menos contar hoje, na oposição, são os partidos, bastante fragilizados. “O que mais conta, o que pesa mesmo, o que é significante, é a mídia”. Ou seja, segundo suas palavras, um seleto grupo de jornais, televisões e rádios “que consome mais de 80% cento das verbas estatais de propaganda”. Acentua, a esse respeito, que um “conjunto de articulistas e blogueiros desfrutáveis” responde na atualidade pela “posição oposicionista nos meios de comunicação”. Usa “uma entrevista que não houve para, mais uma vez, tentar indigitar o ex-presidente”. Recorda o senador que, anteriormente, “tivemos o famosíssimo grampo sem áudio”, que levou a uma situação bastante hilária: “A transcrição do áudio inexistente mostrava-se extremamente favorável aos grampeados.” Acrescenta: “Um grampo a favor. E sem áudio. Lembram? Houve até quem quisesse o impeachment de Lula pelo grampo sem áudio e a favor dos grampeados. Houve até quem ameaçasse bater no presidente.”
Às tantas de sua fala, reportando-se à circunstância de que seu mandato como governador coincidiu com o período dos oito anos da gestão Lula, Roberto Requião faz questão de sublinhar que, “por diversas vezes, inúmeras vezes, manifestei discordância com sua forma de governar, com suas decisões ou indecisões, especialmente em relação à política econômica, à submissão do país ao capitalismo financeiro, aos rentistas.” Mas isso, garante, não o impede, agora, de reconhecer que “não foi pouco o que Lula fez para os pobres”. “Apenas corações empedrados por privilégios de classe, apenas almas endurecidas pelos séculos e séculos de mandonismo, de autoritarismo, de prepotência e de desprezo pelos trabalhadores podem explicar esse combate contínuo aos programas de inclusão das camadas mais pobres dos brasileiros ao maravilhoso mundo do consumo de três refeições ao dia”, assevera, na complementação dessa parte das considerações.
Reflexão aprofundada
A crítica do senador ao comportamento escancaradamente hostil de boa parte da mídia a Lula e Dilma – mídia essa que finge não saber da simpatia e gratidão que a grande maioria da sociedade brasileira comprovadamente devota a ambos – volta-se para dois aspectos bem sugestivos. Um deles: revelam-se assustadores os “pontos de contato entre o jornalismo e o colunismo de antes de 64 e o jornalismo e o colunismo político dos dias de hoje”. O outro aspecto reportado diz respeito a comparações entre o que se tenta fazer agora com Lula, por conta das políticas sociais, com o que se tentou fazer, no passado, com Vargas, “quando criou a CLT, o salário mínimo, as férias e descanso remunerados, a previdência social”, ou com Juscelino, “quando ele decidiu afrontar o FMI e suas infamantes condições para liberação de financiamento”. Todos esses governantes foram falsa e impiedosamente acusados pela mídia de ações de improbidade.
Arremata o parlamentar: “Qualquer coisa que beneficie os trabalhadores, que dê um sopro de vida e de esperança aos mais pobres, que compense minimamente os deserdados e humilhados, qualquer coisa, por modesta que seja, que cutuque os privilégios da casa grande, é imediatamente classificada como populismo.”
As palavras de Requião são de molde a fomentar discussões acaloradas. Mas também chamam todos os militantes da nobre atividade da comunicação social a uma reflexão aprofundada sobre o sentido da missão institucional que lhes toca no contexto político do país.
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[Cesar Vanucci é jornalista, Belo Horizonte, MG]