No artigo “Contra e a favor” (11/10/12), no jornal Correio do Povo, de Porto Alegre, RS, Juremir Machado da Silva expressou bem a perplexidade de todo aquele que acompanha o julgamento do “mensalão” sem o olhar de “torcedor de futebol” a favor de um lado ou de outro. Não estou falando de isenção ideológica ou partidária porque isto não existe. Refiro- me às reflexões éticas, politicas e ideológicas que o caso suscita quando olhado de maneira desapaixonada.
Se olharmos isoladamente o episódio, parece que está ocorrendo uma inflexão importante de transcendência, de superação, do velho jogo de conciliação das elites existente desde sempre na história política brasileira. De outra parte, se fizermos uma análise de um período histórico mais largo, mais abrangente (não precisa ser muito abrangente; basta irmos até o julgamento de Collor e/ou, mais recente ainda, da Operação Satiagraha envolvendo Daniel Dantas), poderemos conjeturar a possibilidade de estarmos diante de uma jurisdição de exceção, no sentido dado por Giorgio Agamben no seu livro Estado de Exceção. Para que tal fique estabelecido, como bem diz Pedro Serrano no artigo “Juízo de exceção na democracia”, publicado na revista CartaCapital nº 715, de 19 de setembro de 2012, temos que esperar “a conclusão definitiva do caráter ou não de juízo de exceção que, no caso, só será verificado após não apenas a decisão final, mas também pela coerência ou não de futuras decisões em casos semelhantes, mas que tenham autores diversos, como o do chamado mensalão mineiro, do ‘mensalão do DEM’ do Distrito Federal, dos crimes do bicheiro Cachoeira, que envolvem o governador de Goiás, e aqueles do banqueiro Daniel Dantas. Para ficar em poucos exemplos”.
Nova era
Se for para valer esta postura da maioria da Suprema Corte, de passar a partir de agora não serem mais exigidas evidências objetivas, bastando apenas indícios para incriminar corruptos de colarinho branco, alguns efeitos colaterais poderão beneficiar a grande maioria. Neste particular, fui testemunha ocular do momento em que o decano Celso de Mello citou o julgamento de Nuremberg, onde o mantra dos carniceiros nazistas, para se livrarem das duras e justas penas infligidas, era dizer que apenas cumpriam ordens vindas de cima.
Partindo desta nova jurisprudência, ocorre-me que a partir de agora qualquer benefício para os apoiadores financeiros de campanha pode acarretar crime passível de pena tanto para o político como para o financiador envolvido. Talvez eu esteja sendo ingênuo em cogitar tal possibilidade, mas se estamos inaugurando uma nova era de moralidade política, qualquer desvio que configure danos às regras republicanas – e nada mais danoso ao tecido social do que a submissão da política e dos políticos ao poder financeiro – deverá ser combatido com o mesmo vigor e determinação pela Suprema Corte, guardiã da Constituição.
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[Jorge Alberto Benitz é engenheiro e consultor, Porto Alegre, RS]