Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Em busca da confiança perdida

A crise de credibilidade na qual a BBC submergiu a partir de outubro e que teve como ponto culminante a renúncia de seu diretor-geral, George Entwistle, no sábado, após menos de dois meses no cargo, levou o lorde Chris Patten, presidente da fundação que governa a emissora britânica, a declarar ontem que a companhia pública fundada em 1922 precisa de uma “reforma total e radical” em sua estrutura. “A base para a posição que a BBC tem neste país é a confiança que as pessoas têm nela. Se a BBC perder essa confiança, está acabada”, sentenciou.

Em entrevista concedida à própria emissora, Patten disse que uma revisão sobre as falsas denúncias veiculadas no dia 2 de novembro pelo programa Newsnight, sobre o suposto envolvimento de um político conservador em um caso de pedofilia, será o “primeiro passo rumo à restauração da confiança do público”. A empresa pública já estava em maus lençóis desde o mês passado, quando surgiram as denúncias de que um de seus apresentadores mais famosos, Jimmy Savile, seria o responsável por centenas de casos de abusos sexuais contra menores. Além disso, veio à tona a informação de que a BBC teria se negado a levar ao ar uma edição do mesmo Newsnight, em dezembro de 2011, sobre as suspeitas em relação ao apresentador. Ao contrário, preferiu veicular especiais de Natal em memória de Savile, morto em outubro do ano passado. “Nossa credibilidade depende de falarmos a verdade sobre nós e sobre outras pessoas, não importa quão horrível isso possa ser”, afirmou Patten.

Um escândalo de pedofilia

Na entrevista, o presidente da Fundação da BBC também anunciou que um novo diretor-geral deve ser escolhido nas próximas semanas. No momento, o cargo é ocupado interinamento pelo diretor de áudio e música, Tim Davie. Ele é um dos nomes especulados pela imprensa britânica para a posição, assim como Caroline Thomson, que deixou a companhia em setembro quando ocupava a direção de operações. Mesmo fora da BBC, onde fez carreira desde os anos 1970, ela aparece como favorita para ser a substituta de Entwistle nas bolsas de apostas em Londres.

A direção geral, entretanto, talvez não seja o único cargo para o qual a BBC precisará encontrar novos ocupantes. Citando fontes de dentro da emissora, o jornal The Independent publicou ontem que a renúncia de Entwistle pode levar outros integrantes do alto escalão da companhia a fazer o mesmo.

O diretor-geral abriu mão de seu posto depois que o Newsnight levantou suspeitas de que Alistair McAlpine, um ex-tesoureiro do Partido Conservador, estava envolvido em um escândalo de pedofilia ocorrido há mais de 40 anos. A reportagem não chegou a citar o nome do político, hoje membro da Câmara dos Lordes, mas deu pistas suficientes para que o jornal The Guardian e espectadores descobrissem quem era o acusado. No entanto, Steve Messham, a suposta vítima de McAlpine, negou que o político tenha sido seu agressor.

Âncora defende ex-diretor-geral

Apesar de não ter resistido ao turbilhão de escândalos e ter sido questionado em várias ocasiões por sua suposta falta de curiosidade em relação aos problemas ligados a Savile e ao Newsnight, Entwistle também recebeu apoio. Ontem, o lorde Patten voltou a dizer que o executivo agiu de forma honrada ao entregar o cargo, depois de tê-lo feito ao lado do próprio Entwistle quando este divulgou sua renúncia. Outro que tomou posição foi Jeremy Paxman, um dos âncoras do Newsnight, para quem a saída de Entwistle “é uma pena”. Segundo Paxman, o diretor-geral foi “derrubado por covardes e incompetentes”, enquanto os cortes no orçamento da BBC teriam levado à “bagunça que hoje é o Newsnight”.

O ex-secretário de Cultura britânico Ben Bradshaw adotou tom similar ao comentar a renúncia: “Entwistle não foi avisado do que deveria. Quem vai resolver essa bagunça agora? É muita responsabilidade para uma pessoa só.”

Apesar de não ter completado nem dois meses no cargo, Entwistle receberá o salário anual de 450 mil libras (quase R$ 1,5 milhão).