Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Ex-senadora alega falta de democracia interna no PV

A “sonhática” ex-senadora e agora ex-PV Marina Silva prefere não ser pragmática, por isso deixou o seu partido. A continuar assim, deixará a política também, este campo minado de vaidades e de interesses muito mais pessoais que coletivos. Marina saiu em briga com a direção nacional que, viciada no poder, impede a renovação. Ela alega a falta de democracia interna. A cena me lembra o velho senador Dirceu Cardoso, da nossa vizinha cidade Muqui: “Os meus adversários estão fora do partido; dentro estão meus inimigos.”

O caso que acomete o PV não é isolado. Trata-se de uma radiografia real das siglas brasileiras. De esquerda, centro ou de direita, não existe democracia interna. Os caciques, normalmente medidos pela idade ou pelo status eleitoral, comandam de norte a sul. Eis aí um dos riscos da reforma política aprovar o voto em lista fechada, onde a proposta diz que eleitor não votará mais no candidato, e sim, no partido. E este indica o(s) nome(s) que toma(m) posse, caso consiga o coeficiente eleitoral. Ou seja, o que já é ruim pode piorar porque se criará uma verdadeira ditadura partidária onde quem está no comando tende a permanecer, mas desta vez com mais poder, organizando as listas internas com os nomes daqueles que sentarão nos parlamentos brasileiros.

Mas um presidente não faz isso sozinho nisso. Formam grupos ou correntes dentro destas estruturas partidárias, dividindo, impondo, corrompendo com cargos públicos, punindo ou excluindo possíveis adversários e se perpetuando no ato de mandar e desmandar. Sem querer, criam às avessas um novo sentido, real e cruel, para o significado da palavra partido.

A máxima guevariana numa versão atual

Não é que as mulheres não devam participar da política. Ao contrário. Mas o caso Marina mostra que no sistema viciado, cruel e muitas vezes enlameado da política partidária brasileira, é preciso “endilmar-se” para chegar e, principalmente, exercer o poder. Marinas sem a dureza de Dilma não sobrevivem.

Os meandros partidários são verdadeiros labirintos onde muita gente quando entra costuma deixar a ética do lado de fora, amarrando-a num fio para recuperá-la mais tarde quando estiver de volta. Mas neste desafio, alguns perdem para sempre o elo que os traria para o mundo externo e permanecem dentro, aprisionados, pelo resto da vida. Assim surgem as ditaduras partidárias que assustam tanto as mulheres como Marina. Elas são construídas por homens simples que entram como idealistas, mas já não conseguem sair porque se transformaram em criaturas duras, insensíveis, viciadas no poder e até desumanas.

Não há manual para a resistência neste mundo político/machista. Mas para uma mulher sobreviver a um partido, é preciso antes de tudo reviver e viver a máxima guevariana, com uma pitada de versão atual: “Endilmecer-se”, mas sem perder a ternura jamais.

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[Ilauro de Oliveira e Silva é jornalista, Cachoeiro de Itapemirim, ES]