Duas reportagens recentes destacam que no Brasil os alunos têm aprendido muito menos do que deveriam. Ambas dão destaque a um relatório realizado anualmente pelo movimento Todos pela Educação, a respeito de metas estabelecidas, estabelecidas pelo movimento, diga-se de passagem, para o país. ‘A entidade criou cinco metas de acesso, qualidade e gestão na área educacional no Brasil e acompanha os resultados periodicamente. (…) Estabelece que, até 2022, pelo menos 70% dos estudantes brasileiros deverão aprender o que é essencial em sua etapa de ensino.’
Na matéria ‘90% dos alunos do ensino médio não aprendem o esperado em matemática‘, Valor Econômico, 02/12/2010, vemos que:
‘Pouco mais de um terço dos alunos do 5º ano do ensino fundamental sabe ler e escrever de acordo com o esperado para a série. Também há defasagem no aprendizado de matemática, no caso de alunos do 9º ano. Os resultados em língua portuguesa dos alunos do 5º ano ficaram abaixo do esperado: apenas 34,2% aprenderam o que deveriam, enquanto a meta era chegar a 36,6%. Em matemática, 32,6% dos estudantes atingiram o resultado esperado, superando os 29,1% estipulados. (…) Para os alunos do 9º ano do ensino fundamental, o cenário é inverso: a meta de português foi atingida, mas a de matemática não. Apenas 14,8% dos estudantes aprenderam o esperado para a série que cursavam – abaixo dos 17,9% estipulados pelo Todos pela Educação. Em língua portuguesa, 26,3% atingiram a pontuação adequada, superando a meta de 24,7%.’
Já na reportagem ‘Falta qualidade à educação no país, diz estudo‘, O Globo, 02/12/2010:
‘Apenas 11% dos estudantes que terminam o 3º ano do ensino médio sabem o conteúdo apropriado de matemática e apenas 14,8% dos que concluem o ensino fundamental compreendem essa disciplina. (…) Em língua portuguesa, o desempenho é um pouco melhor, embora ainda muito baixo. Apenas 28,9% dos alunos que terminam o ensino médio (3º ano) têm o conteúdo adequado da matéria. Na conclusão do ensino fundamental, o índice não passa de 26,3%. E entre os alunos de 5ª série, chega a 34,2%.’
Ranking de investimento
Além dos dados acima, as duas também noticiam o ranking de investimento por aluno dos Estados. No Valor:
‘De acordo com o relatório, o gasto educacional por aluno não tem relação com a região do país ou com a renda média da população do Estado. Os recursos públicos investidos em cada estudante cresceram nos últimos anos, mas ainda variam bastante: 12 estados investem menos do que a média nacional, de R$ 2.948.(…) Se Distrito Federal e Roraima lideram a lista dos que mais investem, na outra ponta, Bahia, Paraíba e Amazonas apresentam os menores valores anuais por aluno: R$ 1.766,94, R$ 1.802,39 e R$ 1.868,07, respectivamente. São Paulo aparece na 9ª colocação, com investimento anual por aluno de R$ 2.930,56.’
Em O Globo:
‘No ranking dos estados que mais investem na educação, em primeiro está o Distrito Federal (R$4.834,43 por aluno/ano), seguido por Roraima (R$4.367,37) e Amapá (R$3.729,39). O Rio está na 10ª posição, com R$2.773,33 por aluno e São Paulo em 9º (R$2.930,56).’
Mais salas e melhores condições de trabalho
Conforme essa amostra dos dados trazidos pelo movimento encabeçado pelo empresário Jorge Gerdau, a educação no país anda mal das pernas. Fato que, aliás, já é de domínio público e de longa data. As reportagens se limitaram a reproduzir os resultados do relatório e a fazer uma ou duas perguntas a burocratas e intelectuais. Mas isso basta? Evidente que as metas estabelecidas pelo movimento, caso atingidas, seriam benéficas para o país, mas estabelecer metas para o ensino público é função de quem?
Considerando o tratamento que o movimento do empresário Gerdau ganha da mídia, pode bem se ver que goza de grande legitimidade. E como não poderia? Hora, se um empresário decidiu descruzar os braços e tomar alguma providência para o fato de que os filhos da classe trabalhadora não estão sendo qualificados o bastante para trabalhar em suas empresas é até louvável sua iniciativa. E, com certeza, mão-de-obra qualificada para o país já está fazendo falta. Mas uma educação de qualidade deve visar apenas a treinar trabalhadores? Dar uma formação integral à pessoa também deve ser um objetivo de uma educação pública que se preze. Objetivo que parece ser desconhecido da grande mídia.
Esta, por sua vez, se limita a propalar o discurso da remuneração dos professores baseada no mérito (um mérito suposto, baseado em aferições duvidosas do conhecimento dos alunos) e a divulgar dados que atestam que a educação vai mal. Sem dúvida em apoio à política de importação do fracassado modelo norte-americano realizada por tucanos. A educação nesse viés empresarial como apoia o movimento de Gerdau é manca. Se no mundo dos negócios é essencial atingir resultados com o mínimo possível de custo, na educação resultados não vão ser atingidos sem investimentos que a classe dirigente do país não se mostrou interessada em fazer: mais salas de aula e melhores condições de trabalho para professores.
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Professor de História, Ponta Grossa, PR