Monday, 04 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Hipocrisia, incoerência ou memória fraca?

Uma característica típica da grande mídia nacional é a ligação existente entre as linhas editoriais e as posições políticas de seus diretores. Nossos meios de informação têm uma dependência aguda em relação às diferentes formações do poder, decorrentes dos processos eleitorais. Isso implica, entre outras coisas, que um candidato criticado, venha a ser elogiado, caso eleito. O dito, em campanha, fica pelo não dito, depois da eleição.

Embora seja natural haver opiniões divergentes entre veículos ou comunicadores, observar textos de um mesmo autor que se contradizem leva-nos a perceber o quanto um discurso pode ser ‘moldado’ de acordo com conveniências. É fato que estes ‘ajustes’ de discurso ocorrem. Contudo, essas mudanças editoriais mascaram a realidade e comprometem a boa compreensão dos fatos.

Nossa mídia sofre com esta inconstância editorial. Não só por parte dos colunistas e articulistas, mas também na veiculação de matérias, é possível notar o quanto são voláteis as posições tomadas, principalmente pela grande imprensa. A cada nova eleição, ‘mocinhos’ e ‘vilões’ alternam papéis de acordo com os novos contextos políticos. Bom, é quem está no poder.

O princípio fundamental

Essa mudança constante de opinião e posição traz à tona um problema, uma vez que evidencia o quanto uma informação é alterada de acordo com o momento, sobretudo político, tornando o público passível de manipulações. Embora o grau de influência de uma informação não possa ser generalizado, respeitando-se as individualidades dos receptores, qualquer tipo de distorção da realidade interfere na transmissão do que é real e representa um risco à correta interpretação por parte dos receptores.

Pela relevância da mídia no desenvolvimento da sociedade, abdicar da informação correta em prol de acordos políticos é prejudicar o bom andamento da democracia, principalmente se levarmos em conta o quanto é necessária uma imprensa livre e – por mais que relativamente parcial – que seja invariavelmente fiel à verdade.

A fórmula mágica para transformar a imprensa num meio plenamente íntegro e imparcial pode não existir, mas preceitos básicos que fundamentem a prática diária do jornalismo devem ser respeitados por quem se intitula um formador ou orientador de opinião pública. Falar a verdade não pode ser tido como um diferencial, mas como o princípio fundamental do exercício de informar.

Falsidade, peleguismo e imoralidade

Podem argumentar que essas mudanças são naturais e consequência de amadurecimento dos autores. Linhas de raciocínio podem ser alteradas de acordo com novas aprendizagens e amadurecimento, o que não explica, contudo, desmerecer um candidato em campanha e louvá-lo depois de eleito. Essa inconstância torna, por vezes, seus discursos incoerentes. Suas opiniões mostram-se envoltas em uma hipocrisia crescente e nossa grande mídia apresenta aspectos típicos de memória fraca.

O processo eleitoral pelo qual o Brasil acabou de passar evidenciou esta ‘flexibilidade narrativa’. Os grandes conglomerados de comunicação, que até o último minuto tratavam alguns candidatos com indiferença ou com agressividade, passaram, após a confirmação do triunfo político dos mesmos, a tratá-los como heróis.

Independente das relações comerciais que possam existir entre um veículo de comunicação e um agente público, a obrigação do comunicador é transmitir os fatos como são e opinar de acordo com suas reais convicções. Mudar de opinião da noite para o dia, de acordo com o que dizem as urnas, soa a falsidade, demonstra peleguismo e é imoral.

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Estudante de Jornalismo, Dourados, MS