No dia 05 de novembro de 2009, o Conselho de Segurança da ONU recebeu da Assembléia-Geral o Relatório Goldstone. O documento acusava israelenses e palestinos de crimes de guerra contra a humanidade durante o conflito de Gaza, no início do ano. Na escalada da violência foram mortos 1.400 palestinos e 13 israelenses.
O conflito teria começado por volta do dia 19/12, quando o Grupo Hamas declarou o fim do acordo com Israel. Seis dias depois, a força militar israelense iniciava o ataque que ficou conhecido como o pior ataque desde a intifada. O cessar-fogo só ocorreu em 18 de janeiro. O primeiro ministro israelense, Ehud Olmert, anunciou na manhã de um sábado o fim dos ataques à Faixa de Gaza. O gabinete do chefe do executivo israelense foi o palco da promessa de que Israel interromperia os ataques, mas não retiraria suas tropas do lado palestino.
O texto, promovido pelos países árabes, foi aprovado com 114 votos a favor, 18 contra – entre eles, os de Estados Unidos, Alemanha, Canadá, Polônia, Itália e Holanda – e 44 abstenções, a maioria delas de nações da União Européia.
O número de vítimas que consta do texto apresentado no Conselho de Segurança da ONU, tanto do lado israelense, mas, principalmente, pelo lado árabe do confronto, já seria motivo suficiente para gerar repercussão internacional da imprensa e motivar assim uma discussão acerca desse conflito, que perdura há anos. E foi o que aconteceu.
Necessárias maiores investigações
Desde o dia anterior, antes do anúncio do documento elaborado pela missão de averiguações sobre o conflito em Gaza, que foi dirigida pelo jurista sul-africano Richard Goldstone, idealizador do relatório, a imprensa internacional de uma forma geral já estava preparada para analisar o resultado de uma pesquisa que comprovava que, durante os 23 dias entre o mês de dezembro do ano passado e janeiro desse ano, Israel usou de força desproporcional contra civis palestinos, ocasionando a morte de até menores de idade, segundo número colhido em hospitais e ONGs da região.
Porém, o debate que os meios de comunicação poderiam ter promovido naquele momento não saiu de uma reprodução da ideologia ocidental, não dando importância ao número excessivo de vitimas árabe, e sim, preocupando-se com as investigações que ambos os lados deveriam realizar em decorrer do conflito, conforme recomendava o relatório.
Em todo mundo as agências de notícias se abstiveram do aprofundamento da matéria. Gigantes como Reuters, Rádio France e a americana Associated Press mantiveram uma posição contrária da contextualização e se preocuparam em abordar o acontecimento como apenas um aviso aos dois lados do conflito: são necessárias maiores investigações. Não relataram a quantidade de civis palestinos que ficaram sem suas residências e filhos provocados por explosões vindas do lado israelense, motivo primordial da missão realizada por Richard Goldstone.
Portal de notícias do mundo árabe
No site da Radio France, deu-se total cartaz para a revolta do governo do primeiro-ministro Ehud Olmert, que condenava com veemência o resultado do documento. Na matéria do dia 17/10 foi reproduzido o comunicado do Ministério das Relações Exteriores que dizia que a decisão do Conselho da ONU paralisaria ‘os esforços para proteger os direitos humanos segundo a legislação internacional e também os esforços para promover a paz no Oriente Médio’.
No Brasil, na mesma linha das agências internacionais, os veículos de comunicação mostraram somente o repúdio de Israel em relação à resolução aprovada na Assembléia. A agência Estado, no dia 06/11, e o porta G1, um dia depois, publicaram em seus sites matérias nesse perfil. Não houve preocupação em ouvir a repercussão mais do que esperada pelo lado palestino.
Mesmo assim, vale uma ressalva. O portal ArabesQ, um portal de notícias do mundo árabe, produziu uma matéria no dia 22/11, mais de 10 dias antes da aprovação no Assembléia da ONU, que apontava a oposição que países do bloco aliado a Israel faziam em relação ao relatório, que seria aprovado dias seguintes.
Imprensa internacional tendenciosa
A matéria, com co-produção da Al Jazira, principal veículo de comunicação no mundo árabe, diferente dos outros portais de notícias brasileiros, trouxe também o repúdio de organizações francesas em relação à retaliação de seu governo e das principais potências européias, juntamente com americanas e canadenses, que votaram contra o relatório.
Em meio à crise no Oriente Médio que atravessou o século, e que para os próprios palestinos, como o informou Fawzi Barhoum, porta-voz do Grupo Hamas, o cessar-fogo no começo do ano não representou e continua a não simbolizar ‘o fim da agressão e do cerco israelense contra o povo palestino’, e ainda, pelo lado israelense, o que se vê é um total descaso das autoridades de Israel em relação ao sofrimento palestino.
No meio de toda essa crise, a maneira como a imprensa internacional reproduz textos sobre esse conflito, a ideologia penetrante do ocidente nos principais meios de comunicação, não parece ter fim, nem mesmo a guerra quanto à cobertura jornalística que é realizada para falar sobre esse assunto.
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Jornalista, Guarulhos, SP