No ano internacional da biodiversidade, chuva de fezes em vilarejo na França, terremotos e tsunamis espalhados pelo globo, mineiros soterrados, oceano untado com petróleo, descobrem gás no subsolo das Gerais, petroleiro russo abre caminho no Ártico e os noticiários se atualizam do mesmo. Todo dia tem tragédia, todo dia tem jornal.
As rodas se desgastam pelo asfalto suado de sangue de trabalhadores, de animais silvestres atropelados, de andarilhos sem esperança. Pela janela observa-se a espessa mata nativa que margeia a tão necessária e descuidada rodovia. Morte?
Enquanto agoniza pelo país, a Mata Atlântica remanescente sorri em frestas abertas nas Gerais. O processo de recuperação exige tempo. Sucessão de acontecimentos e consolidação de um compromisso trino: preservar, restituir e construir. Em uma área onde a legislação ambiental permitia plantio de monocultura há anos, hoje figura uma densa floresta nativa, benefício público gerado por um espaço privado: área de reserva, área de preservação de empresa privada.
Esplendor de bandeirantes e lixo de turistas
Hectares multiplicados por milhares; assim suspira a biodiversidade preservada pelas iniciativas de preservação. Iniciativas que buscam atender à demanda do homem por consumo, mantendo o equilíbrio com sua necessidade de um meio ambiente harmônico. A preservação ambiental não apenas conserva árvores e organismos individuais, mas a rede interrelacional da biodiversidade. Paisagem aos olhos, ar nos pulmões, dispensa e geladeira abastecidas. Ponteiros digitais.
O tempo é fundamental para as coisas criadas. Seja humano, seja natureza. Após a degradação, fruto de irresponsáveis escolhas, precisamos de tempo para nos recuperar. Tempo dos traumas (emocionais, físicos, financeiros e espirituais) serem digeridos, tempo para as mudas e animais tornarem-se florestas.
Somos vistos por meio de janelas. Nós, nossa busca incessante por certezas fundamentadas muitas vezes em nossas confusões: convenções sociais que soterram a expansão das fronteiras da percepção e da vivência. Ferimos e somos feridos, nos constituímos como área degradada em busca do manejo sustentável de nossas ideias e emoções. Materializamos nossas incapacidades de relacionamento interpessoal ao nos relacionarmos com os recursos naturais.
Facilidade seria nos constituirmos como ilhas. Intocadas, no meio do oceano urbano. Mas permitimos acessos. E os visitantes vêm com todo o seu esplendor de bandeirantes e lixo de turistas. A degradação torna-se então inerente à paisagem. E quem poderá nos ajudar não é vermelhinho mexicano de coração amarelo.
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Jornalista, Coronel Fabriciano, MG