Quem vive lendo vive implicando com certas palavras. Preconceito puro, embora nenhum preconceito seja puro. A propósito… implico muito com a palavra ‘preconceito’. E até já li pessoas defendendo um ‘fundamentado preconceito’, preconceito benéfico!
Implicância com palavras e expressões. Não suporto mais ler no jornal que o ‘mercado está nervoso’. Por que ninguém receitou um calmante para ele, meu Deus!?
‘Enxugar a máquina’. Ou ‘enxugar o texto’. Se máquinas e textos andam molhados, tudo bem, vamos enxugar. Mas alguém poderia me explicar por que ficaram assim? Alguém andou escrevendo um artigo debaixo da chuva? Esta máquina não podia estar dentro da fábrica?
Em textos sobre a vida das empresas e do país sempre tem alguém pensando em ‘reverter esse quadro’. Quadro pintado por quem? Picasso? Monet? Reverter não é retroceder? Não seria melhor avançar esse quadro, transformá-lo?
Um clichê freqüentíssimo na mídia – ‘a boa notícia é que’… Antes ou depois de comunicar a ‘má notícia’, quem escreve se sente no dever de frisar que há algo que se pode comemorar. Tudo vai mal… mas a boa notícia é que o prefeito, o ministro ou o presidente ou um Congresso inteiro está analisando novos projetos e possivelmente teremos a solução de tudo daqui a algumas décadas…
‘Caldo de cultura’
No campo do ensino, volta e meia leio: aquele programa, aquele recurso, aquele livro será uma ‘ferramenta’ a mais para conseguir isso ou aquilo. Talvez tenhamos de apertar algum parafuso, cravar um prego, vai saber! Não é o que dizem, que a educação do país precisa ser construída?
‘Seria trágico se não fosse cômico’… outra frase feita que me persegue. Mas é cômico mesmo? As noções se confundem ou perdemos a noção do trágico? As tragédias viram piada fácil. Fidel Castro já se tornou protagonista de várias, recentemente. Isso é trágico? Ou cômico?
Políticos soltos, vários prometem um ‘choque de gestão’. Quem será eletrocutado no final da história?
Não só nos negócios, mas em tudo, a preocupação é com a ‘relação custo/benefício’. Calculismo, avareza. Há um custo, e ninguém se contenta em abrir mão dos benefícios. O problema é que transformamos tudo em investimento.
Confesso: a consciência destas implicâncias nasceu da leitura de uma crônica de Ary Nicodemos Trentin, autor de Baú de imagens (Blumenau, Edifurb, 2002). O autor tem lá suas implicâncias. Com ‘caldo de cultura’ e ‘efeito multiplicador’. Eu também.
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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br