Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Imprensa, fontes e sigilo

A primeira emenda da Constituição norte-americana diz que ‘o Congresso não deve fazer leis a respeito de se estabelecer uma religião, ou proibir o livre exercício das mesmas; ou diminuir a liberdade de expressão, ou da imprensa; ou sobre o direito das pessoas se reunirem pacificamente e fazerem pedidos ao governo para que sejam feitas reparações por ofensas’.

Sempre se imaginou que tal diretriz seria garantia de liberdade de imprensa e sigilo das fontes dos jornalistas, mas sucessivas decisões judiciais, inclusive da Suprema Corte, põem por terra uma das grandes premissas do trabalho dos profissionais de imprensa nos EUA.

Até o projeto de lei sobre o ‘Fluxo Livre de Informação’, proposto por senadores democratas e que permitiria aos jornalistas o sigilo absoluto das fontes perante os tribunais, teve a votação obstruída pela oposição de líderes republicanos do Senado em 30 de julho. Além de não ter conseguido sequer ser debatida, a medida é rejeitada pelo atual presidente, George W. Bush, que ameaçou vetá-la em caso de aprovação.

Roteiro cinematográfico

As tentativas mais recentes de quebra do sigilo nos remetem ao caso do jornalista William Gertz, do diário Washington Times, que foi intimado em 14 de julho por um juiz da Califórnia a identificar as fontes que originaram um artigo sobre possível intenção de espionagem chinesa em solo americano. Já o Tribunal Federal de Apelações anulou em 17 de novembro uma ordem de desacato que exigia que a jornalista americana Toni Locy, ex-repórter do USA Today, pagasse multas diárias de até US$ 5 mil por se recusar a revelar fontes usadas em matérias sobre os ataques com antraz, em 2001. Em outro episódio, um juiz federal determinou que o jornalista David Ashenfelter, do Detroit Free Press, responda na justiça sobre fontes anônimas que usou em matéria de 2004 sobre uma investigação sofrida por um procurador.

Mas o exemplo mais rumoroso e recente da tentativa de quebra de sigilo das fontes de notícias em solo americano virou inclusive roteiro cinematográfico de Hollywood. Estréia em 17 de dezembro o filme Nothing but the Truth (Nada além da verdade), baseado no caso do vazamento da identidade da ex-agente da CIA Valerie Palme. No elenco, astros e estrelas como Matt Dillon, Alan Alda, Kate Beckinsale e Angela Bassett retratando o enredo que abalou as bases da mídia americana e mundial.

Inspiração preocupante

Em 2003, a identidade secreta da então agente da CIA foi revelada à imprensa depois que seu marido, um ex-embaixador crítico ao governo Bush, escreveu um artigo no New York Times questionando as razões do presidente para invadir o Iraque. Foi aberto um inquérito para descobrir a identidade do informante e diversos jornalistas foram intimados a depor. Judith Muller, na época repórter do NYT, negou-se a identificar sua fonte e acabou presa por 85 dias, sendo libertada depois de receber permissão de Lewis Libby, então chefe de gabinete do vice-presidente Dick Cheney, para identificá-lo. Libby acabou como único indiciado no inquérito, acusado de perjúrio e obstrução à justiça.

Estes sucessivos ataques à garantia de sigilo dos informantes dos profissionais da imprensa parecem ter inspirado algumas autoridades brasileiras para defender a flexibilização do mesmo, mas isto é matéria para o próximo artigo.

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Jornalista, auditor, diretor da Associação Riograndense de Imprensa, da Associação Gaúcha dos Auditores Fiscais da Receita Federal e da Fundação Anfip de Seguridade Social