Há quem diga que Jô Soares é uma fonte de pura intelectualidade, credenciada a debater múltiplos assuntos com a máxima competência. De humorista, ele passou a apresentador de um espaço de entrevistas com grande visibilidade na televisão brasileira, formato copiado do talk show norte-americano The tonight show, originalmente comandado por Johnny Carson, pai do gênero. O desempenho do multifacetado Jô já foi dos melhores, mas o que se percebe em seus programas, atualmente, são muitas piadas sem humor, ausência de criatividade, carência de inovação e, o que é pior, unilateralidade. Será que ele cansou?
Ainda que Jô se arvore em realizar entrevistas com personagens desconhecidas, o que mais se vê, depois da mudança do SBT para a Globo, é o uso da atração como ferramenta promocional de artistas, celebridades e personalidades em geral. Os poucos anônimos chamados para o sofá – minoritários, em meio aos famosos de plantão – não possuem, em regra, o humor e a originalidade daqueles que passavam pelo velho Jô Soares onze e meia, do SBT.
O atual Programa do Jô, exibido diariamente pela Globo (com áudio retransmitido pela rádio CBN), prima pela falta de senso de diálogo, comprovado pelo domínio exercido sobre a fala dos entrevistados. Nesse sentido, não faz comunicação. Jô Soares parece esquecer que todos os conceitos podem ter mais de uma ótica e é de estranhar que uma pessoa dotada de considerável acúmulo de conhecimento tenha um posicionamento tão fechado em uma só visão, desvalorizando questionamentos.
O jogo do sistema
O caso da classificação indicativa dos produtos culturais, proposta pelo Ministério da Cultura, é emblemática. Na ocasião, foram colocadas argumentações incisivas por Jô num único rumo, sendo convidados essencialmente artistas convencidos da liberdade descompromissada pós-moderna (na verdade, a serviço do mercado). Tornou-se repetitivo, ao colocar toda e qualquer forma de regulamentação pública como censura e cerceamento da liberdade de expressão. As opiniões do apresentador, sem embasamento, não condizem com um homem poliglota, de sofisticado gosto cultural, intelectualizado e viajado, até porque deveria estar ciente de que a noção de uma classificação indicativa se faz presente em países desenvolvidos, como Canadá, Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha.
No entanto, a unilateralidade tem sido uma constante, sejam os temas banais ou sérios. Quando debatia a agenda da semana com as denominadas meninas do Jô, toda quarta-feira, a voz única e a observação rápida, sem embasamento, também imperavam, com particular contundência. Não faziam jornalismo, nem um bom show de conversa. Faziam o que fazem melhor: o jogo do sistema, o interesse primeiro da reprodução hegemônica.
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Pela ordem, doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas e professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos; graduando em Jornalismo pela Unisinos; e mestranda em Ciências da Comunicação pela Unisinos