Monday, 16 de September de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1305

Licitação, obras e corrupção

 

Obra pública no Brasil é sinônimo de esbórnia ou de campo fértil para a corrupção; corruptos e corruptores sabem muito bem disso. A grande mídia o ignora. A notícia de qualidade não é apontar que a Delta – empreiteira implicada com a quadrilha de Carlinhos Cachoeira – mantém alguns bilhões de obras em diferentes governos estaduais. A notícia de qualidade será mostrar o quanto desses bilhões foi investido realmente em obras e o quanto foi desviado para os cofres dos diversos componentes da quadrilha.

Nos últimos dez anos – e só nos últimos dez anos – o país avançou nos campos regulatórios, fiscalizatórios e referenciais de custo das obras públicas. A confusão ainda persiste. E junto com ela abrem-se as brechas para desvios de montanhas e mais montanhas de verbas públicas. O Espírito Santo não é o Brasil, mas serve como exemplo do que acontece pelo país afora. Em julho de 2011, o jornal A Gazeta, forte diário capixaba, mostrou o que acontecia com várias obras municipais e estaduais em execução no estado. Manchete do jornal: “Só em cinco projetos foram gastos R$ 73,1 milhões a mais”.

Dobro do preço

Num trabalho nem de longe imitado pela grande mídia nacional, A Gazeta baixa a lente em obra por obra para concluir: municípios e estado justificam o aumento no valor dizendo que surgem imprevistos não incluídos no orçamento do projeto básico. Os maiores culpados seriam o clima chuvoso e o solo. Mas os excessos aparecem, hoje, como regras, quando deveriam ser exceção.

Vejam agora o que diz, no mesmo material, o controlador de recursos públicos do Tribunal de Contas do Espírito Santo, Donato Volkers: “O problema começa quando a prefeitura acha que o projeto básico não precisa ser completo. Mas a lei é clara ao mostrar o que deve ter o projeto, e eles não cumprem. É comum ver obras que só têm o desenho arquitetônico, e eles licitam assim mesmo”.

É triste constatarmos que o Brasil, tão necessitado de infraestrutura, tenha de pagar sempre o dobro do preço – talvez mais que isso – pela obra pública diante dos olhos complacentes da grande mídia nacional.

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[Dirceu Martins Pio é ex-diretor da Agência Estado e do jornal Gazeta Mercantil; atual consultor em comunicação corporativa]