Ao final de 2009, dois importantes megaatores da indústria da notícia, Rupert Murdoch (Grupo Fox) e Tom Curley (CEO da AP), sob holofotes chineses, portanto numa vitrine nevrálgica, da questão da cobrança (ou não) da notícia na internet, discutiram publicamente com representantes do governo chinês e da mídia a lesão em seus negócios pelo fato de websites de motores de busca, tais como o Google, obterem lucro veiculando suas notícias de graça, em suas áreas de conteúdo. Frequentemente resumidas, travestidas de apenas um link para um terceiro endereço, onde a notícia (às vezes alterada) estiver de fato publicada.
Enquanto isso, num outro extremo remoto, artigos de autores pouco conhecidos viajam pela internet livremente sem o seu autor sequer ser avisado, ainda que seja de seu interesse a divulgação. Aquilo e isto refletem uma evidência de lixo de notícia perpetuado circulando, acumulando, na grande rede.
Da mesma forma que recentemente uma quantidade monumental de lixo marinho (detritos de plásticos fotodegradados) foi encontrada acumulada nos giros oceânicos tropicais, tão fotodegradado esse lixo que é impossível o seu resgate, a limpeza dos oceanos desse lixo, já é impossível limpar a internet do lixo virtual, digitalizado e produzido sem o cuidado da apuração, nas pseudo-Wikis, em glossários, na blogosfera, nos websites de monetização duvidosa e por aí afora – notícias locais inclusas.
Conferência internacional no Havaí
Neste exato momento, aqueles atores fazem coro com um grupo que não é pequeno, preconizando a notícia paga na internet, difícil de colar, como algumas leis. Neste exato momento, também, três ou quatro grupos de pesquisa (uns velejadores aventureiros, outros pesquisadores de universidades) retornam de mares distantes divulgando aos quatro ventos que encontraram a pólvora, o estopim do lixo marinho no mundo, uma das maiores bombas que ameaça estourar sobre as nossas cabeças, de todos nós no planeta.
Enquanto isso, o lixo se acumula: na internet, o lixo da notícia; no mar, o lixo marinho. Aparentemente o grande público não dá bola, não se importa, nem com a qualidade da informação que circula pelos Yahoo, Google e outros sites menores, nem e muito menos com a produção de lixo marinho de fontes de bases terrestre e marítima. Da mesma forma que os animais marinhos confundem o lixo fotodegradado com alimento e a sua ingestão leva à subnutrição, ferimentos dos intestinos e à morte, o lixo da notícia pode estar sufocando, no mínimo alimentando mal os leitores da internet. Uma suspeita, não há pesquisa científica para provar a tese, ainda.
Hoje (15/04/2010), publiquei na Clínica Literária, em primeira mão, a notícia de que o UNEP – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em parceria com uma robusta agência reguladora americana, a NOAA – Administração Nacional Atmosférica e Oceânica (do Departamento de Comércio) dos Estados Unidos realizarão a 5ª Conferência Internacional sobre Lixo Marinho em Honolulu, Havaí, no início de 2011 e, ao pesquisar sobre o assunto, deparei com uma notícia fornecida pela AP ao Yahoo que denota o lixo se formando na internet, enquanto absorvemos informação mal trabalhada, infectada por lixo virtual espalhado de modo irresponsável.
Briga de cachorro grande
A notícia da AP, sobre manchas enormes de lixo marinho encontradas nos oceanos (notícia requentada), foi publicada hoje, 15 de abril de 2010 às 05:30 horas e por volta das 14:00 horas já havia 2.735 comentários postados por internautas sobre o texto. A manchete da notícia aparecia (até o momento em que produzo este artigo) no topo dos quatro artigos mais utilizados pelos internautas para repassarem em suas redes de relacionamento. Até aí, só fatos positivos, não fosse o fato de que os comentários mais recentes registravam a postagem oito horas atrás – isto é, não seria possível alguém comentar uma notícia que ainda não fora divulgada, especialmente essa notícia requentada que ainda nem havia sido levada ao fogo.
Frequentemente, deparo com artigos meus viajando no lixo da internet, ou talvez alguns deles sejam um pouco de resíduo também já na sua gênese (e de difícil resgate), mas dos quais nunca fui avisado sobre a sua utilização por publishers virtuais. Há até mesmo utilização em monografias das áreas de biologia e medicina, teses de mestrado de Oceanografia e doutorados de cursos de Letras e Jornalismo cujos autores nunca me procuraram para, pelo menos, apurar as informações contidas nesses meus textos que velejam por aí, produzidos muitas vezes com a mesma pressa com que estou produzindo este texto sobre o Lixo de Notícias Flutuando de Graça na Rede.
A discussão sobre a notícia paga na internet, como a discussão do diploma de jornalista, (no Brasil) tem defensores ferrenhos de ambos os lados, contra e a favor. Murdoch e o seu principal executivo Curley, naquele evento na China, falavam para mais de 300 representantes de peso, de mais de uma centena de veículos, de 80 países, todos ávidos por encontrar uma saída, ou oportunidades, para este desafio, o da lucratividade com a notícia na internet.
A diferença é que há neste cenário atores novos, de difícil controle pela velocidade com que absorvem (e criam) novas tecnologias, os sites de relacionamento e motores de busca em suas páginas de conteúdo. Aqueles executivos do evento da China pagam equipes de reportagem e pesquisa (teoricamente sérias); esses novos atores simplesmente publicam (e propagam) à velocidade da luz a enxurrada de notícias, lixo incluso, muitas vezes sem pagar um tostão. E é aí que começa a briga de cachorro grande. O que fazer quando se é menos do que um pequinês? Observar a imprensa e as novidades talvez, e discuti-las. Só nos resta isso.
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Escritor e jornalista