Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Manifesto contra o criacionismo

Um grupo de 30 cientistas, entre eles Richard Dawkins e David Attenborough, assinou uma petição defendendo a ideia de que a teoria da evolução deve ser ensinada às crianças a partir dos cinco anos. Em carta ao governo britânico, o grupo pede “o combate às aulas de criacionismo nas escolas”. Para esse grupo, o criacionismo teria ganhado espaço com sua “nova roupagem” que, para eles, é a teoria do design inteligente. Segundo reportagem publicada no jornal O Globo, “a teoria científica de Darwin, internacionalmente aceita, sustenta que todos os seres vivos se desenvolveram a partir de organismos primitivos por meio de mutações genéticas aleatórias e de um processo chamado de seleção natural – em que as espécies mais bem adaptadas sobrevivem”. Dawkins, em texto publicado no jornal Times, afirma que “a evolução é uma explicação para a existência verdadeiramente satisfatória e completa; suspeito que isso seja algo que uma criança possa apreciar desde muito nova”.

Chamar Dawkins de “cientista proeminente” (como faz a matéria de O Globo) é forçar a barra. Há quantos anos ele não põe os pés num laboratório? Que descoberta ou pesquisa científica ele fez? O neoateístaultradarwinista-mor vive da venda de seus livros polêmicos e, certamente, de sua aposentadoria de ex-professor universitário. Ele não faz ciência, apenas divulga estridentemente seu naturalismo filosófico antiteísta e anticriacionista por meio de livros, campanhas mal-educadase, inclusive, acampamentos para doutrinação de crianças. (Aliás, o último livro dele para crianças tem como título The Magic of Reality. Isso é muito estranho porque, anos atrás, o biólogo que também escreveu Deus, um Delírio, disse que ensinar religião para crianças é como praticar estupro. Mas ele pode ensinar ateísmo travestido de ciência?)

Extrapolação metafísica

A verdade é que o próprio Dawkins admiteque foi por razões filosóficas e não científicas que ele se sentiu atraído para a ciência: “My interest in biology was pretty much always on the philosophical side”, ele disse, listando a seguir as questões essenciais que o guiaram: “Why do we exist, why are we here, what is it all about?” Essas são questões metafísicas e não necessariamente científicas. Mas misturar as coisas parece atitude comum no pensamento e nos textos do britânico.

Dawkins mistura propositalmente o criacionismo e a teoria do design inteligente, mas ele sabe que há diferenças entre ambos. Enquanto os criacionistas (bíblicos) sustentam que o Designer é Yahweh, os teóricos do design inteligente “não se preocupam” com a identificação do Designer, uma vez que se atêm ao método científico e às ferramentas de detecção de projeto na natureza. Eles deduzem, a partir da existência de informação complexa específica e complexidade irredutível nos seres vivos, que o acaso e a aleatoriedade jamais poderiam ser responsáveis pela existência/surgimento da vida. É mais ou menos como a ciência forense que detecta evidências na cena do crime, ainda que o criminoso tenha se evadido do local. Nesse sentido, não há por que não se ensinar design inteligente nas escolas, uma vez que o conteúdo religioso não fará parte do currículo. Por que existe esse medo de se questionar o evolucionismo? Por que apresentá-lo como “fato”, quando se sabe de suas insuficiências epistêmicas? E por que fazer isso justamente com crianças que não terão visão crítica suficiente para se posicionar? Suspeito que o objetivo final de Dawkins e seus pares seja o de criar uma sociedade ateia, usando a ideia de um não ateu (agnóstico) útil: Charles Darwin.

A teoria segundo a qual todos os organismos se desenvolveram a partir de seres primitivos (se é que podemos chamar assim seres que já possuíam as indispensáveis máquinas moleculares e a tremenda informação genética da qual dependem) é a macroevolução, nunca demonstrada em laboratório ou observada na natureza. O que Darwin constatou foi a diversificação de baixo nível que promoveu mudanças no tamanho e formato do bico e na plumagem dos tentilhões, de uma ilha para outra, em Galápagos. Somente isso. O resto é extrapolação metafísica. E é isso que Dawkins e sua turma querem empurrar para a cabeça das crianças indefesas. Doutrinação pura!

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[Michelson Borges é jornalista e mestre em teologia]