Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Maniqueísmo no espaço midiático

Retomando a questão do maniqueísmo. Dois pontos merecem um aprofundamento: a questão da maioria silenciosa com a internet se tornar ruidosa e o porquê só vingar, ou ser mais levado em conta, o discurso maniqueista. Penso que os dois pontos estão interligados. Isto é, o maniqueísmo adquiriu um status de importante na era do sensacional, do choque imagético, porque o público- alvo não só é mais numeroso como também adquiriu uma visibilidade que antes não existia. A imprensa que tratava de política e cultura em geral era um espaço onde só aqueles bem aquinhoados culturalmente tinham o peito de escrever.

De esquerda ou de direita, os pré-requisitos impunham um patamar mínimo, para o bem e para o mal, muito alem do cidadão médio. Daí que o cidadão comum não se atrevia a opinar em um terreno que não lhe era afeito. Até mesmo no cotidiano ele se cuidava muito para não passar a ideia de ser um despreparado. Fazia parte também de sua estratégia de sobrevivência se abrir somente na presença de seus iguais. Tempos não-democráticos exigiam cautela. O perigo rondava os opiniáticos demais. Todo este sistema coercitivo trabalhava tanto para calar aquele que tinha ideias progressistas e democráticas como aquele que era conservador e reacionário. Os notáveis eram a porta-vozes dos sem-voz que habitavam uma zona cinzenta e quieta.

O discurso político-filosófico amparado em argumentos racionais não tem o espaço na mídia formal e mesmo na mídia livre da internet porque, nós, contemporâneos da modernidade líquida, somos viciados em novidades e choques imagéticos. O discurso racional não atende estes pré-requisitos. Ao contrário, exige um vagar e uma capacidade de reflexão que colide com a velocidade e superficialidade exigida nos dias de hoje. Quem melhor do que a velha e manjada técnica do linguajar impactante e emocional para alimentar esta fome de novidade e sensacionalismo. O falar racional exige um espírito despido de rancor, raiva e ódio, ao passo que o maniqueísmo vive e se alimenta de rancor, raiva e ódio. Não seria errado dizer que neste quesito estamos aquém daquele mundo dos gregos que dava importância para uma discussão tão elevada como a encetada no Banquete de Platão. Hoje, um fato daqueles mereceria uma nota de rodapé nos jornalões ou seria tratado nas seções especializadas que poucos acessam. O pior é que parece vencido o embate pelos sofistas. No discurso maniqueista imperante, a questão do bom, do justo e do correto é secundária. Interessa é a vitória sobre o oponente.

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[Jorge Alberto Benitz é engenheiro e administrador de empresas, Porto Alegre, RS]