Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mídia quer Robinho fora do Brasil

O assédio do Real Madrid ao atacante Robinho, além da enxurrada de notícias sem confirmação divulgadas pela mídia esportiva, tiraram do sério o presidente do Santos, Marcelo Teixeira. A revolta do dirigente – e da torcida santista – faz sentido. De uma semana para cá, as manchetes de jornais e sítios de notícias em tempo real põem Robinho no time merengue. E o mais espetacular: sem que o Santos, que detém 60% dos direitos federativos do jogador, saiba.

Em dezembro do ano passado, este Observatório publicou artigo em que destacamos as ‘barrigas’ da mídia esportiva em 2004. Entre tantas notícias falsas, uma em especial nos chamou a atenção: a venda de Robinho. Dissemos que, se as notícias de rádios, jornais e sítios fossem verídicas, Robinho estaria jogando na Europa há pelo menos dois anos e, pasmem, por cinco clubes diferentes.

O ano de 2005 começou igualmente com fortes rumores de que Robinho não jogaria sequer o Campeonato Paulista. Já seria jogador do Real. Houve quem noticiasse a transferência do atleta, mas o Santos estaria negociando para liberá-lo apenas após a Copa Libertadores da América. Ao mesmo tempo em que a mídia dava crédito a empresários e dirigentes do time espanhol, a diretoria do clube brasileiro sequer era ouvida.

O Santos detém 60% dos direitos federativos de Robinho e, portanto, tem voz ativa e decisiva em qualquer negociação. Os 40% restantes são do jogador e do procurador Wagner Ribeiro – aquele mesmo que negociou o meia Kaká para o Milan por cerca de 8 milhões de dólares. Hoje, o ex-são-paulino não sai de Milão por menos de 30 milhões de dólares.

Na semana passada, quando até o criterioso Jornal Nacional, da TV Globo, que costuma apurar com profundidade suas pautas, deu a informação de que Robinho se apresentaria ao Real depois da Copa das Confederações, o presidente do Santos saiu da toca e fez um desabafo a amigos. Marcelo Teixeira reclamou de parte da imprensa esportiva, que estaria fazendo o jogo dos empresários do jogador e de representantes do time espanhol.

50 milhões de dólares

‘No momento em que estamos fazendo de tudo para segurar o Robinho, parte da imprensa, além de não valorizar a nossa diretoria, faz comentários para o menino se transferir, duvidando de nossa palavra, questionando a nossa postura e dando razão ao Real Madrid’, declarou.

O presidente santista continuou, dizendo que ‘Robinho nunca falou que não jogaria mais no Santos’. Teixeira se disse inconformado com as notícias veiculadas, situação que, segundo ele, coloca a torcida contra o jovem atacante. Ele classificou de absurdo o esforço que alguns jornais e jornalistas têm feito para ‘vender’ Robinho.

‘Se nos pagarem os 50 milhões de dólares referentes à multa rescisória, ele vai’, reafirmou o dirigente em entrevista coletiva, desqualificando a oferta do Real, de cerca de 15 milhões de dólares, por Robinho. O desabafo de Teixeira a amigos e assessores próximos prosseguiu: ‘Em vez de se unirem ao movimento para que o atleta fique no país, eles (jornalistas) alimentam a chance da transferência’. E finalizou o longo desabafo, invocando proteção divina: ‘Deus é maior!’

Aula aos jornalistas

As declarações do presidente do Santos foram feitas no sábado (25/6) – um dia antes de o programa Show do Esporte Interativo, da TV Bandeirantes, apresentado pelo embaraçado Roberto Avallone, garantir que Robinho deixará o Santos. A repórter Marília Ruiz, que participa do debate, disse que o jogador vai entregar nesta semana uma carta ao presidente do Santos na qual pedirá para ser negociado. A jornalista chegou a enumerar as razões que levariam Robinho a fazer o suposto pedido, como a falta de segurança para sua família.

Campeã em anunciar negociações não-concretizadas, Marília Ruiz, no entanto, perdeu a voz quando o comentarista Neto, seu companheiro de bancada, praticamente desqualificou sua ‘bombástica’ notícia. Ciente do que falava, o ex-jogador foi taxativo: Robinho não sairá do Santos. A declaração de Neto enrubesceu Marília Ruiz. Ele, que nunca escreveu profissionalmente uma lauda de matéria, muito menos se sentou num banco de faculdade de Jornalismo, deu aula sobre ‘furos’ aos jornalistas do Show Interativo – Avallone, Marília Ruiz e Mauro Beting, justamente os três que declararam que Robinho estava de saída.

Mesmo não sendo jornalista de carteirinha (foi um ótimo meia-de-ligação, com chutes certeiros e cobranças de falta venenosas), Neto fez o feijão-com-arroz do jornalismo, isto é, apurou bem as informações para só depois levá-las ao conhecimento público. Foi seguro ao dar notícia diferente da de sua colega. Certamente, o ex-jogador consultou uma fonte de dentro do clube (possivelmente até o próprio presidente Marcelo Teixeira), porque ele sabia do que estava falando; Marília Ruiz, ao contrário, nem tanto. A loura atirou no escuro. E, mais uma vez, parece que vai errar.

Link para o ‘Fica’

O desabafo do presidente do Santos e as declarações despropositadas da repórter mostram a que ponto chegou o comportamento de grande parte dos veículos especializados na cobertura esportiva, com pautas mal apuradas, cujo resultado desse trabalho – as informações levadas a milhões de leitores, ouvintes e telespectadores – é jogado no papel, nos microfones e páginas virtuais na internet sem o menor compromisso com a verdade.

Um time com a história do Santos – apontado pela Fifa como o maior clube das Américas do século passado e também o melhor brasileiro nesse início de milênio – não consegue vencer as informações e contra-informações que partem da imprensa, auxiliada por fontes que nunca querem se identificar.

Evidentemente que o presidente santista não generalizou, até porque ele sabe que o jornal Lance!, por exemplo, aderiu à campanha ‘Fica, Robinho!’, organizada pela ONG Santos Vivo, com o apoio do portal Santista Roxo. O jornal abriu link para que os torcedores brasileiros enviem mensagens pedindo para que o craque santista permaneça por mais tempo no Brasil.

‘Furos momentâneos’

As ‘barrigas’ de Marília Ruiz são tão rotineiras que um livro só seria pouco para narrá-las. No início do mês, a repórter anunciou, no Show do Esporte Interativo, a contratação pelo Corinthians do atacante Vagner Love, ex-Palmeiras. A emissora guardou a informação como se fosse a bomba do ano, tanto que Avallone pediu para que a moça fizesse o anúncio somente no bloco seguinte do programa, após o intervalo comercial.

Na volta, Marília Ruiz teve o desatino de afirmar que a cúpula que responde pela parceria Corinthians-MSI estaria reunida, naquele momento (um domingo à noite), para comemorar o acerto com Vagner Love. Hoje, passados quase 30 dias da tal informação bombástica, o negócio não foi concretizado. E pior: recentemente, o jogador deu declarações de que não pretende deixar o CSKA, clube pelo qual joga na Rússia.

Tudo isso revela que, atualmente, o segmento esportivo vive de ‘furos momentâneos’, que, mais tarde, viram informação falsa. O torcedor que se dane. O pior é que o profissional que noticiou ou noticia o ‘fato exclusivo’, a bomba para os mais afoitos, não enrubesce jamais. Ao contrário. No dia seguinte, tá lá ele reinventando fatos. O excesso de ‘barrigas’ é tanto que recomendo um spa, além de sessões de lipoaspiração, a uma parte da mídia esportiva.

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Jornalista em Brasília