Criar um movimento social que, como diz a designação, tenta mover as coisas em países desumanamente injustos, nos quais alguns lutam para torná-los mais justos e igualitários e outros lutam, com recursos infinitos, para mantê-los como estão, nunca foi fácil em parte alguma do mundo. E, no Brasil, é particularmente mais difícil lutar para torná-lo mais justo, democrático e igualitário. Por isso, apesar de alguma contrariedade por que tenho passado por conta de ataques ao Movimento dos Sem-Mídia – MSM e até a este que escreve, devo destacar a postura democrática do Observatório da Imprensa de oferecer espaço a um debate candente que, espero, venha a ser desinfetado de radicalismos e partidarismos que o têm turvado até aqui.
Este é um país em que há várias categorias de cidadãos, ainda. Alguns deles têm direitos infinitos e quase nenhuma responsabilidade. São os que habitam os estratos superiores da pirâmide social. Algumas pessoas desse grupo social – não todas, claro, mas uma parcela delas – matam, torturam, incendeiam semelhantes, caluniam, sonegam impostos, enfim, fazem o que querem, como e onde querem, e só são chamadas a responder por seus atos quando a mídia, seletivamente, por alguma razão decide expor alguma dessas pessoas. Já cidadãos dos estratos sociais inferiores correm risco até de ir parar na cadeia se abrirem demais suas bocas, e podem ser insultados, caluniados, espancados, incendiados e torturados quando os de cima bem entendem que nada lhes acontece.
Quando propus aos leitores do meu blog que criássemos um movimento social que protestasse contra a seletividade ética da grande mídia, contra as escolhas editoriais que excluem o contraponto e fazem por sobrepor as idiossincrasias políticas, ideológicas, culturais etc. dos magnatas da comunicação, eu sabia que estava mexendo com gente poderosa, com multimilionários que têm hordas de ‘simpatizantes’ para agirem em seu lugar, até para bajulá-los, e meios infinitos para combaterem quem lhes oponha resistência. Não me surpreenderam, portanto, os ataques e armadilhas que começaram a colocar no caminho do Movimento dos Sem-Mídia. E eu, na condição daquele que deu um rosto, um nome de pessoa física, uma personalidade humana a esse Movimento, não posso me surpreender por ter sido transformado em alvo. Estava previsto.
Informação errada
Assim sendo, será preciso ir desmontando as armadilhas. Quando necessário, quando o ataque for mais persistente e não apenas uma tocaia rápida que vise a difundir mentiras e, em seguida, bata em retirada, usando táticas de guerrilha, será preciso recorrer à Justiça. Por isso, o Movimento dos Sem-Mídia constituiu, em sua assembléia do dia 13 de outubro, uma diretoria jurídica, pois estamos conscientes de que estamos incomodando gente poderosa, milionários donos de verdadeiros impérios da comunicação, empresas que faturam centenas de milhões de dólares, mas que agem como se fossem coitadinhos que poderiam ser calados por um grupo de algumas centenas de cidadãos de classe média que lutam de sol a sol para se sustentarem com dignidade, como são os integrantes do MSM.
Nos últimos dias, os ataques começaram a se tornar mais contundentes e sistemáticos. No blog Cidadania.com, nascedouro e sede virtual do MSM, tem sido uma luta diária contra comentários caluniosos. Mas os ataques não se restringem ao que passa em todo blog polêmico – e o Cidadania é, claro, polêmico por natureza. Essa luta, não só pelos objetivos do movimento, legítimos e constitucionais, será travada com serenidade e responsabilidade. Por isso, cumpre-me reparar um equívoco que foi cometido em artigo anterior que postei no OI, mas que decorreu, como ficará demonstrado, de equívoco cometido por um órgão de imprensa que, junto com o MSM, acabou sendo vitimado por uma sucessão de equívocos de ambas as partes.
Um caso que reportei em artigo publicado na edição anterior do Observatório, um artigo que dava conta da transformação do MSM em ONG, precisa ser esclarecido. Devido a informação errada contida em matéria do site Portal Imprensa, outros sites entenderam o que a matéria, de fato, dava a entender e transformaram o título usado pelo portal naquela matéria em outro título até mais coerente com o que ela dizia. Os sites Adnews e da Associação Riograndense de Imprensa (ARI) publicaram matéria do portal sob um título diferente que eu, no artigo anterior ao qual me referi, disse que era daquele portal porque uma pessoa da diretoria do MSM havia-me relatado que tinha visto tal título lá. Mas foi um equívoco, e ele tem que ser reparado.
Incoerência jornalística
O Portal Imprensa publicou matéria sob o título ‘José Dirceu convoca internautas a apoiarem Movimento dos Sem Mídia’. Essa matéria diz que o ex-ministro publicou um post em seu site em que reproduz trecho de manifestação minha, e que o post de Dirceu convocava internautas a apoiarem o MSM. Os sites Adnews e ARI mudaram o título da matéria do Portal para ‘José Dirceu encabeça o Movimento dos Sem Mídia’. Nenhuma das coisas é verdade. José Dirceu não escreveu uma só palavra sobre o MSM. Assim como fez o Portal Imprensa, como fez o Terra Magazine, como fez o site Conversa Afiada, como fizeram os sites das revistas Caros Amigos e Fórum, como fez o Portal Vermelho, como fez o site da Agência Carta Maior etc., Dirceu abriu espaço em seu site para que eu me manifestasse. Assim, escrevi um artigo para o site de Dirceu intitulado ‘Apóie os sem-mídia’.
Claro que deve ter sido um erro de interpretação da pessoa do Portal que leu meu artigo no site de Dirceu e escreveu que ele havia convocado internautas a alguma coisa. Todavia, precisa ficar claro que a publicação de um artigo no site do ex-ministro em nada difere de manifestações minhas no Observatório da Imprensa, por exemplo. O Observatório não endossou o MSM ao me abrir espaço para publicar o artigo da semana passada falando do movimento que presido, ou ao publicar o ‘Manifesto dos Sem-Mídia’ antes da manifestação que o movimento fez diante da Folha de S. Paulo em 15 de setembro. Assim, se alguém publicar uma matéria sob o título ‘Observatório da Imprensa convoca internautas a apoiarem o Movimento dos Sem Mídia’ só porque eu publiquei artigos aqui, estará incorrendo em grave erro, no mínimo.
Por conta dessa confusão toda, o Portal da Imprensa publicou um texto de um de seus colunistas comunicando a decisão do veículo de ‘não cobrir mais as atividades do MSM’. É um direito de uma organização autônoma, mas, como decisão jornalística, é o fim da picada. Só para se ter uma idéia da incoerência jornalística de uma decisão dessas, vou me valer de imagem construída pelo ex-repórter da Globo Luiz Carlos Azenha: imaginem que, na próxima manifestação ou assembléia dos sem-mídia, caia um Boeing sobre nós e nos transforme em patê. Segundo o Portal Imprensa, o veículo nada irá noticiar.
Várias inverdades
Ora, à imprensa não cabe zangar-se e fazer beicinho. Eu, por exemplo, poderia dizer que não daria mais entrevistas ao Portal Imprensa porque julgo que o veículo reproduziu erroneamente um fato e isso afetou negativamente o MSM, mas, presidindo um movimento social que interessa a todos, ao público, não tenho esse direito. Assim, pondo fim a essa polêmica, deixo registrado que estarei sempre à disposição de qualquer meio de comunicação – inclusive do Portal Imprensa –, de qualquer político, de qualquer organização legítima ou pessoa respeitável que queira me dar espaço para difundir o MSM, pois sou um sem-mídia e, portanto, não posso recusar mídia nenhuma. Seria uma incoerência.
Bem, mas vamos em frente que ainda tenho bastante a dizer.
Os ataques mais pesados ao MSM, até agora, vieram dos comentários ao meu artigo da semana passada no OI. Selecionei algumas ‘pérolas’ que foram veiculadas ao pé do texto que escrevi. Foram calúnias e distorções dos fatos que chegaram a ultrapassar a fronteira da legalidade. Mas não recriminarei o OI por publicar esses ataques. Inicialmente, fiquei contrariado, mas depois, refletindo, cheguei à conclusão de que esses ataques viriam cedo ou tarde e foi melhor que tenham vindo num espaço democrático como o Observatório, no qual é possível rebatê-los.
Contudo, é preciso desfazer algumas das várias inverdades publicadas ao pé de meu artigo anterior aqui no OI.
Acusação infundada
Em primeiríssimo lugar, está a questão de que o MSM pretenderia calar a mídia ou fazê-la parar de publicar críticas e denúncias contra o governo Lula e seus aliados. As pessoas que disseram isso não tiveram o cuidado de se informar sobre o que disseram. O Estatuto do Movimento, que pode ser lido acessando link no blog Cidadania sob o nome ESTATUTO, que fica no topo da lista de sites que o blog recomenda, reiteradas vezes, que o MSM não quer que a mídia pare de criticar governo nenhum, nem o de Lula, nem o de Serra, nem o de Aécio Neves – de ninguém, de partido algum. O que se quer é tratamento equânime para todos os grupos políticos, sem privilegiar ou prejudicar qualquer um. Em suma, queremos que a mídia fale tudo que tem falado, mas queremos que fale mais, que permita espaço a quem discorda. No caso dos meios de comunicação impressos, a obrigatoriedade de dar espaço ao contraditório e de praticar a pluralidade é apenas ética, mas, no caso das concessões públicas de rádio e TV, essa obrigatoriedade é impositiva por lei, pois uma Globo, por exemplo, não é dona da faixa de onda que usa para veicular sua programação. Essa faixa do espectro radioelétrico é de todos e precisa, portanto, ser usada como um bem público.
Em segundo lugar, devo desmentir uma das graves acusações que foram feitas a mim e, por extensão, ao MSM. Um leitor do OI postou comentário sob meu artigo da semana passada dizendo que eu ‘arrumei boquinhas para minhas filhas no MSM’. É grave. Isso não existiu. Minha filha primogênita participou da assembléia-geral na qual foi constituída legalmente a ONG dos sem-mídia e, diante do fato de que ninguém tinha se apresentado para o cargo de conselheiro fiscal da organização, ela se propôs a exercer o cargo. Eu, porém, não permiti. Pedi que ela retirasse sua candidatura, ainda que os cargos da direção do MSM não sejam remunerados. Fiz isso prevendo justamente que haveria exploração do fato. Pessoas mal-intencionadas me acusariam de nepotismo, ainda que o MSM não receba dinheiro público, porque em seu estatuto consta proibição de recebermos dinheiro público. Nosso movimento irá se financiar, única e exclusivamente, por meio de doações de seus filiados. O pior, porém, é que só uma de minhas filhas participou da assembléia do MSM. A outra, no sábado retrasado, estava trabalhando. Mas uma acusação dessas poderia prejudicá-la em seu trabalho. Vejam só a que ponto algumas pessoas chegam. E o mais intrigante é que esse caso da candidatura natimorta de minha primogênita ocorreu no âmbito restrito da assembléia. Não saiu na imprensa alternativa que cobriu o evento. Como foi, então, que essa pessoa que fez tal acusação tomou conhecimento de que minha filha havia postulado cargo no MSM? Dá o que pensar, não é?
Formiguinhas e mastodontes
Esses ataques que mencionei são autônomos? Não sei. Provavelmente são, mas a simples hipótese de que tenham partido daqueles que estão sendo incomodados pelo MSM produz uma preocupação imensa. Não dá para imaginar que grandes impérios de comunicação se sentiriam incomodados pelo questionamento que nosso movimento lhes tem feito a ponto de organizarem ataques desse jaez que descrevi acima. Mas, até para os grandes meios de comunicação, torna-se preocupante que esses ataques ocorram, porque muitos verão neles ações orquestradas próprias, não de respeitáveis empresários de mídia, mas de verdadeiros gângsteres que tentariam intimidar um movimento social legítimo e legal. Assim, a você que acha que está combatendo o MSM, na verdade está levantando suspeições sobre empresas que suponho que jamais mandariam prepostos atacarem o Movimento dos Sem-Mídia…
É uma tragédia que algumas pessoas não entendam que um debate como o que o MSM está levantando deve permanecer no campo do debate, e não da guerra. Oponham argumentos ao MSM. Discutam nossas propostas e queixas. Mostrem, com argumentos serenos e respeitosos, que estamos errados, se forem capazes. Não tentem vencer o debate usando ataques pessoais, acusações improcedentes – e ridículas – sobre uma organização de cidadãos de classe média que decidiram debater publicamente o papel da mídia no Brasil. Essas acusações são ridículas. Os grandes meios de comunicação brasileiros são verdadeiros impérios, poderosíssimos. Não teríamos como censurá-los nem se quiséssemos. Somos como formiguinhas questionando um mastodonte.
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Presidente do Movimento dos Sem-Mídia – MSM