Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Muita tecnologia, muita notícia, pouco conteúdo

A cobertura da corrida presidencial americana está mostrando os efeitos que as mais recentes tecnologias de comunicação podem ter sobre o jornalismo, como aponta reportagem de Eric Slater para o Los Angeles Times [5/4/04]. Armados de notebooks, celulares, palmtops, gravadores digitais e mini-câmeras de vídeo com qualidade de imagem profissional, os repórteres que acompanham os candidatos têm a possibilidade de enviar notícias a seus veículos a qualquer instante. E, por terem essa condição, passa a ser exigido que produzam conteúdo várias vezes por dia. O resultado disso é uma enxurrada de notícias telegráficas que não ajudam muito a compreensão do leitor.

Recentemente, por exemplo, o candidato democrata John Kerry se submeteu a uma cirurgia no ombro. Quando a operação terminou, um repórter enviou e-mail para a redação: ‘Ele saiu da cirurgia’. Aquilo imediatamente virou notícia. O mesmo aconteceu quando o então pré-candidato Wesley Clark escorregou no gelo. O vídeo da queda chegou ao público em poucas horas.

Os jornalistas têm digitado notícias em pequenos computadores de mão enquanto se deslocam de um lugar para o outro e têm tido de se preocupar em encontrar conexões de internet de alta velocidade para enviar trechos de vídeo. Aqueles que acompanham o atual presidente, George W. Bush, ainda têm se deparado com a lentidão de conexões discadas. Mas a equipe de Kerry, de olho na nova tendência da mídia, contratou uma empresa que disponibiliza internet de banda larga para os jornalistas em cada lugar por onde passa o candidato.

Segundo o crítico de mídia do National Journal William Powers, a tecnologia está forçando os jornalistas a serem mais analíticos ao produzirem suas matérias diárias. ‘Mas a tecnologia não ajuda a escrever boa análise. Temos mais análise, mas não tenho certeza de que estejamos tendo melhor análise’. O chefe do departamento de Jornalismo da Universidade de Nova York, Jay Rosen, concorda: a cobertura minuto a minuto ressalta o aspecto instantâneo de ‘quem subiu e quem desceu’ na corrida eleitoral, em detrimento das reais diferenças programáticas dos candidatos. ‘O melhor exemplo disso é a cobertura dos resultados de pesquisas de intenção de voto como se fossem notícia, quando, na verdade, são algo que os veículos conduziram por conta própria, ao patrocinarem a enquete’.