A mídia cria, a mídia destrói. Isso parece familiar, não?
É um fato mais do que comprovado, mas ainda assim cada vez mais pessoas se dispõem a tudo e qualquer coisa para ter seus cinco minutos de fama.
Quando se fala em fama, o público geralmente pensa em status, popularidade, regalias e dinheiro. Porém, poucos se lembram do preço a pagar. E eis que surge o exemplo vindo de Susan Boyle.
Susan Boyle foi ‘a voz de anjo’ revelada pelo programa Britain´s Got Talent e cuja performance encantou o mundo. Escocesa, 48 anos, completamente fora dos padrões de beleza vigentes, tornou-se a personalidade mais vista na internet. Tida como favorita para vencer o reality show, acabou em segundo lugar, frustrando todas as expectativas.
E a partir daí, começou toda a história. Ou a outra história.
Após a derrota no programa, Susan foi internada em uma clínica psiquiátrica devido ao stress. Toda a pressão a que foi submetida, a perseguição que passou a sofrer na mídia e a frustração com a perda do primeiro prêmio resultaram em esgotamento nervoso.
E a partir daí veio o que começaram a chamar de ‘a verdadeira história’.
De ‘vitoriosa’ a ‘coitadinha’
No Fantástico (07/6), uma reportagem contou que a cantora sofre de ‘uma espécie de atraso mental’. As chamadas veiculadas durante os intervalos comerciais da semana vieram exatamente com essas palavras, sem explicar o que seria isso. Qual a impressão que essas palavras causaram nos telespectadores? A pior possível, até modificarem a chamada e explicarem o problema: Ao nascer, ela teria aspirado líquido amniótico e, com isso, teve uma parada respiratória. Como consequência, a falta de oxigênio teria afetado seu cérebro.
E a coisa não fica por aí: vejam só.
‘O assunto continua sendo notícia nos dois lados do Atlântico. Alguns jornais denunciaram a edição do programa, que teria manipulado nas caras e bocas da platéia e dos jurados quando Susan se apresentou pela primeira vez. Segundo a denúncia, Susan já tinha cantado para os produtores e todos, inclusive os jurados, já sabiam que ela ia arrasar.’
Falaram também que os produtores do programa estão sendo acusados de perder o interesse em Susan Boyle: a razão seria o fato de que ela tem um repertório minúsculo. Com isso, estaria explicado o motivo da repetição da música no dia da grande final. Acusações não faltam: especialistas afirmam que o programa é desnecessariamente cruel com os candidatos (o que de fato, é) e que os produtores já sabiam dos problemas de Susan mas não providenciaram acompanhamento psicológico.
E no meio de tantas acusações, a venda de tablóides. Esqueceram-se da própria cantora, fazendo a brusca inversão de papéis: de figura ‘vitoriosa’ e ‘persistente’ para coitadinha e vítima.
Os ‘cinco minutos de glória’
A mesma mídia que a construiu agora parece fazer questão de destruí-la. Parece ter prazer em fazer isso, em inverter a situação, em mostrar o seu poder como se dissesse: ‘Está vendo? Olha o que eu posso fazer? Você pode ser o próximo! Curve-se a nós!’
E o que fazemos? Aceitamos, quase sem contestação. Mas por qual motivo?
Medo?
Não. É que os mesmos que temem são aqueles que amam ver o circo pegar fogo. Aqueles que amam ver ascensão e queda, destroços e restos. Uma sociedade que se alimenta de escândalos e tem prazer em ver pessoas na arena, sendo jogadas aos leões.
Somos hipócritas. Manipulados e manipuladores. É isso o que somos. Sustentamos esse comportamento e também somos sustentados por ele. Não há mais pessoas: somente mercadorias em potencial. Seja quem for.
A fama tem seu preço. E um preço alto demais. Ainda assim, há aqueles que continuam na mesma corrida louca, fazendo de tudo para ter os ‘cinco minutos de glória’, torcendo para que sejam piedosos quando chegar a sua vez.
E mal sabem que não há misericórdia.
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Jornalista, criadora do blog Limão em Limonada; São José do Barreiro, SP