O deputado Ibsen Pinheiro, também jornalista e advogado, disse que vai perfumar o bode e enviá-lo ao Senado. A metáfora ampara-se no conhecido modo de resolver um conflito: põe-se um bode fedorento no recinto em que estão os conflitantes. E depois negocia-se, não o conflito, mas a retirada do bicho, sempre aprovada por unanimidade como bom começo de conversação. O bode é a emenda que leva seu nome, na Câmara dos Deputados, surrupiando do Rio de Janeiro uma montanha de dinheiro, algo em torno de R$ 7 bilhões, e afetando não apenas o município e o estado. O governador Sérgio Cabral, chorando diante de microfones e câmeras de foto e vídeo, disse que 90 dos 92 municípios fluminenses serão afetados ainda este ano.
Aos telejornais, Ibsen Pinheiro disse mais ou menos o seguinte: de cada dez poços que a Petrobrás fura, nove não dão em nada e apenas um rende petróleo, gás etc. Quem paga as despesas? Todos os estados da União. Por que, então, os royalties têm que ser apenas dos estados produtores, especialmente Rio de Janeiro e Espírito Santo? E, advogado militante, argumentou que os reclamantes não têm razão e não têm maioria. Mas resta uma esperança: o presidente Lula pode vetar a emenda.
Depois de muita celeuma, o deputado Ibsen Pinheiro veio com esta do ‘bode perfumado’. E por que perfumar o bicho? Porque, com razão ou sem razão, o governador do Rio lembrou que se a emenda Ibsen vigorar, ‘não é que a gente não consiga fazer as Olimpíadas. A gente não consegue fazer mais nada. Nem pegar um empréstimo’.
Mexeu numa abelheira com vara curta
Ibsen Pinheiro andou como que fora de órbita de 1994 a 2004. Era presidente da Câmara Federal quando esta cassou o mandato do presidente Fernando Collor de Mello, em 1992. Mas também foi cassado em 1994, no episódio conhecido como ‘Os anões do Orçamento’. Recomeçou a vida política como vereador em Porto Alegre, em 2004, e elegeu-se deputado federal de novo em 2006. É um aliado do presidente Lula.
Ele é natural de um estado que fez guerra ao poder central por causa de um produto em que o sal também estava presente. Era o charque, que levou o Rio Grande do Sul a fazer a Revolução Farroupilha (1835-1845), cuja derrota para o Império é celebrada todos os anos no mês de setembro. Mais ou menos como São Paulo faz com a Revolução Constitucionalista de 1932, que desde então marca uma estranha singularidade que faz com que o estado de São Paulo seja diferente de todos os outros num detalhe: há um grande número de ruas e avenidas 9 de Julho e poucas homenageando Getúlio Vargas.
O pré-sal está dando muito o que falar. O pós-sal vai dar mais ainda. No Oriente Médio, há vários países cujas fronteiras nada têm a ver com o que se entende por nação. Não passam de potentados cuja única razão de existirem é o petróleo. Em Angola, nossa nação irmã lusófona, já se fala em separatismo por causa do petróleo de Cabinda e também de suas reservas de diamante, de fosfato, de magnésio etc.
O deputado Ibsen Pinheiro mexeu numa abelheira. E, pelo jeito, com vara curta. Cabe à mídia aprofundar a questão.
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Escritor, professor da Universidade Estácio de Sá e doutor em Letras pela USP; seus livros mais recentes são o romance Goethe e Barrabás e De onde vêm as palavras