Percebe-se certo desconforto na imprensa com relação à ofensiva do Supremo Tribunal Federal contra o nepotismo. Ao vetar a contratação de parentes, até terceiro grau, de autoridades nos três Poderes, o STF busca corrigir uma prática nefasta que freqüentemente é criticada pela imprensa. Mas a decisão também é vista como um risco de desequilíbrio no sistema da República, pela iniciativa do Judiciário em cobrir indefinições deixadas nas normas civis pelo Legislativo.
O que produz certa inquietação nos jornais, conforme se pode notar no noticiário dos últimos dois dias, é a recorrente utilização, pelo Supremo, da súmula vinculante. Trata-se de um instrumento estabelecido pela Constituição e que permite ao Poder Judiciário complementar ou regulamentar matérias que tenham sido negligenciadas pelo Legislativo.
A imprensa critica constantemente o Congresso, fonte inesgotável de pautas, em especial de pautas escandalosas. Mas os editores sabem que o eventual excesso nas intervenções do Judiciário pode levar a uma crise institucional.
Política do ‘jeitinho’
Recentemente, quando o Supremo Tribunal Federal baixou a medida restringindo o uso de algemas nos atos de prisão de suspeitos, para resguardar direitos de supostos inocentes, a imprensa manifestou-se maciçamente favorável à decisão.
No caso da proibição do nepotismo, o noticiário também revela pleno apoio dos jornais.
A extensão da medida, que inibe também o nepotismo cruzado, quando um servidor contrata parentes de outro, em trocas de favores, o que indica a determinação do STF de erradicar o problema, já começa a produzir certa preocupação com um possível exagero na ação legisladora do Judiciário.
Ao mesmo tempo em que, refletindo o que se supõe sejam os desejos da população, a mídia reproduz o contentamento geral com atos decisivos de controle dos desvios permitidos por uma legislação cheia de falhas, começa a manifestar também certa preocupação com um possível avanço exagerado do Judiciário sobre terrenos dos outros Poderes.
Essa preocupação tem suas razões. Afinal, sabe-se que, desde a redemocratização, a política do ‘jeitinho’ vem dominando o Congresso Nacional, produzindo um sistema de leis semelhante a um queijo suíço. Mas o risco de sobreposição de um poder a outro sempre deve ser levado em conta, quando se trata da preservação da democracia.