SEGUNDO MANDATO
Chaves que mais gosto é o do SBT, diz Costa
‘O ministro das Comunicações, Hélio Costa, e o embaixador da Venezuela no Brasil, Júlio Garcia Montoya, travaram discussão nos últimos dias a respeito do modelo de TV estatal produzido pelo país de Hugo Chávez. Em nota divulgada na sexta-feira, o diplomata disse que Costa cometeu ‘desatino político e diplomático’ ao definir TV estatal como ‘o que o Chávez faz’. Ontem, foi a vez de Costa rebater as declarações de Montoya: ‘Esse embaixador é um mal-educado e deselegante.’
Em tom duro, o ministro reafirmou as críticas que fez na última semana à TV estatal produzida na Venezuela e disse que Chávez escolheu mal o embaixador no Brasil. ‘O presidente Hugo Chávez é um líder carismático, mas faz uma TV estatal que eu, como profissional, acho muito ruim, e acho que ele poderia mudar o seu método de escolher o embaixador para um país amigo como o Brasil’, declarou o ministro, que foi por muitos anos jornalista da TV Globo.
O titular das Comunicações insistiu que, em sua opinião, a TV estatal venezuelana tem ‘péssima’ qualidade, mas explicou estar se referindo ao lado técnico e de programação. ‘O programa do Chaves que eu gosto mais é aquele do SBT, até porque é engraçado’, ironizou, comparando a TV estatal da Venezuela ao humorístico mexicano Chaves, cujo ator principal é Roberto Goméz Bolaños.
‘Fiz uma observação sobre a TV estatal venezuelana, que está no sistema de TV a cabo brasileiro. Tenho o direito de ter opinião. O embaixador venezuelano deveria ter mais respeito ao se referir a um ministro e senador da República que teve 3,5 milhões de votos’, completou Hélio Costa, que é senador pelo PMDB de Minas.
‘Acho engraçado que aqui no Brasil chamam a proposta de TV pública de ‘TV Lula’ e está tudo bem, ninguém fala nada, pois somos um país democrático. Lá, eu faço uma observação e sou bombardeado por um embaixador que me chama de insano. Certamente não é um diplomata de carreira’, disse.
Na última quarta-feira, o ministro, ao falar sobre a futura TV do Executivo, já apelidada pela oposição de ‘TV Lula’, afirmou que ela não seria emissora estatal. ‘TV estatal é o que o Chávez faz, TV estatal é o que se faz em Cuba’, declarou.
As comparações provocaram a contundente reação do embaixador venezuelano no Brasil. Na nota divulgada na sexta-feira, Montoya classificou as declarações de Costa de ‘insultantes e perigosas’ porque partiam de uma visão falsa da realidade de que os meios de comunicação estatais na Venezuela seriam instrumento de marketing presidencial.
Após uma explicação a respeito do funcionamento da TV estatal na Venezuela e dos esforços para democratizar o acesso aos meios de comunicação por intermédio de TVs públicas comunitárias, o embaixador afirmou que Costa ignorava a realidade do país e que suas declarações foram infelizes.
Ele finalizou a nota dizendo crer que o ministro sofreu ‘um deslize emocional’ em virtude da pressão a que foi submetido por jornalistas. ‘Queremos crer nisso, para não pensar que sua referência ofensiva ao nosso governo tenha um sentido maior’, diz, concluindo que, se for diferente, o governo brasileiro terá que dar satisfações.’
TELECOMUNICAÇÕES
Teles e TVs brigam por banda larga
‘Ano passado, o total de assinantes de telefonia fixa caiu 3,3%. A TV paga cresceu 9,5% e o celular, 15,9%. A banda larga, no entanto, deu um salto de 47,4%. De olho nesse mercado, as operadoras de telecomunicações e as empresas de TV paga oferecem os chamados pacotes triple play, que reúnem telefone fixo, internet rápida e televisão. Algumas empresas, como a Brasil Telecom e a Telemar, já estão no quadruple play, que adiciona celular ao pacote.
Para o cliente, existem algumas vantagens óbvias no empacotamento dos serviços. Uma delas é o desconto que recebe por contratar todos os serviços de uma vez. Outra é falar com uma única empresa quando tem algum problema ou quer mudar alguma coisa e receber tudo em uma conta só. Mas quais são as vantagens para as empresas? ‘Conhecemos melhor as necessidades do cliente’, disse Maurício Giusti, vice-presidente de Estratégia e Regulamentação da Telefônica. ‘E temos custos menores em atendimento e faturamento.’
O que pode parecer estranho é que as empresa de TV a cabo atacam, com seus combos, o mercado de telefonia fixa, que está estagnado há quatro anos, e as teles vão para cima da TV paga, que teve crescimento de um dígito no ano passado, após cinco anos de paralisia. No centro da estratégia está a banda larga. Os descontos que as empresas conseguem oferecer com seus pacotes de serviços muitas vezes são o argumento necessário para fazer o cliente assinar o contrato ou continuar na base de assinantes. ‘Contribuímos drasticamente para aumentar a velocidade e derrubar o preço na banda larga’, disse Márcio Carvalho, diretor de Produtos e Serviços da Net.
COMPETIÇÃO
As empresas de TV a cabo trouxeram competição efetiva para os mercados de telefonia fixa e banda larga, dominados pelas concessionárias de telefonia local. Essa concorrência, entretanto, é limitada às regiões onde as redes de cabo estão presentes. ‘Hoje, nos Jardins (região nobre de São Paulo), o concorrente chega com voz, banda larga e televisão. Para atender às classes A e B, eu só tenho telefonia e internet. Não consigo oferecer TV com a minha própria rede. Essa assimetria acaba prejudicando os clientes e a própria dinâmica do mercado’, reclama Giusti, da Telefônica.
Para Carvalho, da Net, essa proposta convergente, de oferecer todos os serviços através de uma única rede, está na origem da TV paga no Brasil. ‘As operadoras de telefonia tentam chegar onde a gente já está’, destacou o executivo. ‘Com o DTH (televisão via satélite), eles estão maquiando três ofertas single play como triple play.’
As teles não podem oferecer televisão pelas suas próprias redes mais por motivos regulatórios que técnicos. Elas precisariam fazer uma atualização considerável das redes para oferecer televisão, mas o que as detém é a proibição de que elas ofereçam canais, com grade de programação, pela tecnologia de IPTV, em que o vídeo via banda larga vai direto pela televisão. Elas podem distribuir somente vídeo sob demanda, serviço em que o espectador escolhe o que quer ver na hora, como numa locadora virtual.
Por isso, a Telefônica fez uma parceria com a DTHi, que oferece TV paga via satélite, e depois conseguiu sua própria licença para oferecer o serviço. A Telemar e a Brasil Telecom fecharam um acordo com a Sky. Na semana passada, a Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) entrou com uma medida cautelar no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra a compra da TVA pela Telefônica, anunciada em outubro.
Por trás da disputa entre Net e Telefônica, está a concorrência regional entre o grupo mexicano Telmex/América Móvil e a empresa espanhola. A Telmex é dona da Embratel, que está no controle da Net. ‘No México, a empresa de cabo pode fazer telefonia e a Telmex pode fazer televisão’, disse Giusti, da Telefônica. ‘Existe simetria.’
‘A oferta de televisão, internet e telefonia aumenta a fidelidade do cliente’, afirmou o vice-presidente de Planejamento Estratégico e Assuntos Regulatórios da Brasil Telecom, Luiz Francisco Perrone. A TV paga responde por somente 4% da receita bruta do setor de telecomunicações. ‘Em outros mercados latino-americanos, como a Argentina e a Colômbia, a densidade do serviço é três ou quatro vezes maior’, destacou Perrone. ‘Aqui, o potencial é muito maior que o que existe hoje.’’
TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
Mundo vive o Big Bang da informação digital
‘O mundo produziu 161 bilhões de gigabytes ou 161 exabytes de informação, ao longo de 2006. Esse número representa 3 milhões de vezes o conteúdo de todos os livros já escritos – que formariam 12 pilhas de 149 milhões de quilômetros de altura, que é a distância que separa a Terra do Sol. E para cada habitante do planeta, caberiam 24 gigabytes em 2006.
Essas são algumas das conclusões do estudo intitulado O universo digital em expansão: uma previsão do crescimento mundial da informação até 2010, elaborado pela consultoria IDC, por encomenda da EMC, empresa norte-americana de armazenamento digital.
Para Hermann Pais, diretor-técnico da EMC no Brasil, esse ‘é provavelmente o primeiro levantamento mundial do volume de informação digital criada ao longo de um ano, feito com metodologia rigorosa, que nos mostra aspectos muito mais específicos do que os estudos anteriores’.
Vivemos, na realidade, uma espécie de Big Bang da informação digital. Basta lembrar que, em 1996, apenas 48 milhões de pessoas utilizavam a internet rotineiramente no mundo. Em 2006, já eram 1,1 bilhão. Em 2010, haverá mais 500 milhões de usuários da web. E um dado surpreendente: mais de 60% usuários de internet no mundo já dispõem de banda larga.
Dividindo-se o total de 161 exabytes de informação produzida no ano passado entre os 6,578 bilhões de seres humanos – cada habitante do planeta teria direito no ano passado a cerca de 24 gigabytes de informação digital.
E mais impressionante: esse volume anual vai sextuplicar nos próximos três anos, saltando dos atuais 161 exabytes para o total de 988 exabytes de informação a ser produzida ao longo de 2010 – equivalentes a 75 pilhas de livros que cobririam a distância entre Terra e o Sol. E a média por habitante passará de 24 para 150 gigabytes.
RUMO AO ZETTABYTE
O texto contido neste caderno de Economia do Estadão equivale a algo como 1 megabyte. A partir daqui, podemos entender melhor os grandes números, numa seqüência de múltiplos:
Mil megabytes equivalem a 1 gigabyte (ou mil cadernos de Economia como este).
Mil gigabytes correspondem a 1 terabyte, ou 1 milhão de gigabytes.
Mil terabytes perfazem 1 petabyte ou 1 milhão de gigabytes.
Mil petabytes valem o mesmo que 1 exabyte ou 1 bilhão de gigabytes.
Mil exabytes formam 1 zettabyte – que corresponde a 1 trilhão de gigabytes.
Conclusão: em 2010, a informação produzida no mundo – 988 exabytes ou 988 bilhões de gigagytes – equivalerá a 988 trilhões de cadernos de Economia do Estadão. Ou quase 1 zettabyte (mil exabytes) número que corresponde a um trilhão de gigabytes, ou 1 quatrilhão de cadernos deste jornal. Simples, não?
ASCENSÃO DO INDIVÍDUO
O mais surpreendente é que em 2010, caberá aos indivíduos ou pessoas físicas a criação de 70% da informação digital. Em contrapartida – e aí é que mora o perigo – caberá às organizações cuidar da segurança, da privacidade, da confiabilidade e da exatidão de pelo menos 85% do universo digital.
Uma das mais surpreendentes previsões do estudo diz que, em 2007, pela primeira vez, o montante de informação criada deverá ultrapassar a capacidade de armazenamento disponível no mundo. Ainda que nem toda informação criada precise ser armazenada – como, por exemplo, todos os sinais difundidos de TV digital, todas as páginas da internet e todas as chamadas telefônicas de voz – é bom lembrar que uma porcentagem crescente de outras informações terá que ser armazenada.
O estudo mostra, também, que as infra-estruturas atuais estão mal equipadas para atender ao crescimento do volume de informação e prover o grau de segurança e o nível de serviço exigidos, pois muitos serviços no mundo atual não admitem interrupção, ainda que por alguns segundos. Nesse aspecto, as organizações terão que empregar técnicas a cada dia mais sofisticadas de transporte, armazenamento e duplicação da informação adicionada a cada dia.
A EXPLOSÃO DA IMAGEM
O crescimento do tráfego de e-mails na internet tem sido incrível, pois o número médio de mensagens enviadas por usuário triplicou de 1998 a 2006, mesmo excluindo os spams, indesejados.
Mas a grande massa de informações produzida nesse universo digital é constituída hoje pelas imagens capturadas por mais de 1 bilhão de dispositivos. São celulares, câmeras fotográficas, de vídeo, de segurança e equipamentos de imagens médicas em todo o mundo.
Imaginem que o número de imagens capturadas apenas com as câmeras fotográficas (de imagens fixas ou still pictures) passou de 150 bilhões em todo o mundo, no ano passado. E as fotos e imagens de vídeo capturadas por telefones celulares chegaram a quase 100 bilhões. A IDC estima que o mundo quebre a barreira dos 500 bilhões de imagens capturadas em 2010.
Eis aí uma pequena amostra do Big Bang digital que vivemos.’
JORNALISMO / EUA
Um tempo de manobras radicais
‘Três processos estão em curso no jornalismo americano. O primeiro mostra que, na TV a cabo e no rádio, o jornalismo opinativo está em alta. O noticiário em que repórteres discretos apresentam os dois lados, a análise da notícia, não atrai mais o público. Personagens como o âncora da FoxNews Bill O’Reilly – sempre disposto a lições de moral conservadora – são os homens que conseguem segurar e até aumentar a audiência em ambos os lados do flanco ideológico.
O segundo processo aponta que a internet, de ameaça, começou a se integrar aos veículos e não é mais curiosidade. Da revista Time ao New York Times, os sites foram ampliados em 2006, ficaram mais sofisticados e interativos e servem cada vez mais para completar a informação do impresso. Enquanto nas redações tradicionais ainda se demitem jornalistas, a rede está contratando. Mas a promessa de um jornalismo independente das grandes empresas de mídia, seja em blogs, seja em áudio ou vídeo, segue como promessa.
Por fim, o jornal diário e os noticiários de TV aberta agonizam. No primeiro caso, os impressos estão começando a reagir, um pouco por abraçar a internet, também por apostar em veículos de nicho que complementem a renda. Para as três redes de TV, NBC, ABC e CBS, que juntas têm uma audiência de 26 milhões de espectadores e há mais de duas décadas perdem um milhão por ano, está difícil. Pior: quem vê os telejornais da noite tem uma idade média de 60 anos. Além de indicar que não está havendo renovação de público, para o mercado publicitário, os consumidores que interessam estão na faixa entre 25 e 54 anos.
Estas são as conclusões do relatório The state of the news media – ‘O estado da imprensa’ -, um calhamaço de 700 páginas impressas, divulgado pelo Projeto pela Excelência do Jornalismo que o Aliás resume adiante:
REVISTAS
As revistas estão promovendo as mudanças mais radicais de formato. A campeã de circulação – Time, 4 milhões por semana – puxa o bonde. Em 2006, aumentou o preço de capa e informou aos anunciantes que diminuirá a circulação. Faz sentido econômico: muitas das assinaturas vieram ao custo de promoções e descontos. Vendendo menos e a um preço maior, atrai leitores mais ricos e anúncios mais caros.
Pelo mesmo motivo – atrair melhores anunciantes – parou de circular às segundas e seguiu para as sextas-feiras, quando pode disputar com jornais um tipo de anúncio mais farto, voltado para consumidores que aproveitam o fim de semana para as compras. A maior ousadia da revista é outra. Está editorialmente menos preocupada com furos de reportagem e se voltando para análise. O noticiário do dia-a-dia vai para o site. É um projeto multimídia: a revista amarra a semana que o leitor acompanhou online. Agora, torce para que leitores e anunciantes gostem do conceito.
O ano foi particularmente generoso com revistas de nicho: todas aumentaram a circulação, incluindo a Week, que oferece semanalmente um resumo do noticiário, a britânica The Economist, que cresceu 12% nos EUA, e a tradicional New Yorker, que sob seu novo editor aumentou o espaço para longas reportagens ligadas ao noticiário. A fórmula da Economist, mais analítica e profunda, permite à revista atrair o leitor mais jovem das revistas semanais, com uma média de 40 anos de idade.
TV A CABO
Os canais que oferecem noticiário 24 horas, antes procurados por quem queria notícia a qualquer momento, perderam para a internet, mas consolidaram um novo modelo. Os jornalistas de personalidade forte e opinativos têm por símbolo Bill O’Reilly, âncora do vespertino The O’Reilly Factor, campeão de audiência imbatível há anos.
Seu sucesso provocou, na CNN, a conversão do repórter de finanças Lou Dobbs num editorialista da causa anti-imigração. Na MSNBC, terceira no ranking, Keith Olbermann – cuja audiência cresceu respeitáveis 67% em 2006 – além de oposição ao governo Bush, apresenta um quadro chamado ‘a pior pessoa do mundo’. Lá, faz piada de Bill O’Reilly.
A verborragia e a estridência do novo âncora típico do cabo são polêmicas. Uma mãe de filho desaparecido cometeu suicídio, no início do ano, após ter sido repreendida ao vivo por uma âncora da CNN.
INTERNET
Embora ofereça crescimento amplo e continuado, a grande rede permanece a maior incógnita para o jornalismo. Um dos motivos tem a ver com dúvidas a respeito da propaganda. A web será mais como as Páginas Amarelas, para a qual o leitor se dirige para encontrar onde comprar algo? Se for, a publicidade renderá pouco aos sites noticiosos. Por enquanto, na rede a propaganda aumenta de valor 30% ao ano.
Este leitor de notícias na web receia tecnologia. Inovações, como programas de áudio para iPods – podcasts -, e notícias pelo celular, que foram promessas de há um ano, não renderam. Ele também busca órgãos tradicionais de imprensa: sites de redes de TV, depois portais como Yahoo e Google, então sites de jornais locais. Blogs independentes estão em último na lista. Mas, durante a campanha eleitoral de 2006, pelo menos metade dos leitores complementaram o noticiário político com blogs.
Se o número de usuários da rede permaneceu mais ou menos constante em 2006, nos EUA, as conexões lentas estão sendo substituídas por banda larga. Resultado: vídeos. Quem está na internet consome 100 minutos de vídeo por mês. O campeão de audiência são previsões de tempo, seguidas de entretenimento e videoclipes vistos no site da FoxNews, em segundo no Yahoo, YouTube os segue.
JORNAIS
Por demitirem muito, os jornais cobrem cada vez menos as cidades onde circulam e publicam cada vez mais material nacional das agências. É uma vida dura. Entre os anos 1960 e o início dos 90, tinham classificados e anúncios de grandes dimensões. Com a internet, perderam. Ninguém do ramo acredita que a tendência de queda continuada de circulação seja reversível a médio prazo.
Alguns acreditam que a saída é abraçar a internet e recuperar leitores. Enquanto isso, os grandes jornais partem para alternativas em nichos. Jornais gratuitos para os jovens, em espanhol para migrantes.
Ainda assim, há quem busque comprar jornais. A grande novidade do ano é o movimento de David Geffen, um dos maiores produtores de discos do país, interessado no Los Angeles Times; Jack Welch, ex-presidente da GE, quer o Boston Globe.
A esperança é que estes indivíduos, já ricos, se contentem com lucros menores. Como serão donos, não precisarão responder às pressões típicas do mercado a empresas de capital aberto. Assim, os resultados nos relatórios trimestrais podem ser ignorados e o objetivo de busca de qualidade e credibilidade, que garantem sobrevivência a longo prazo, poderão voltar à pauta.’
MERCADO EDITORIAL
Gigolôs da criação alheia
‘Herdeiros? Melhor não tê-los.
A paráfrase do Poema Enjoadinho, de Vinicius de Moraes, termina aqui. Passo ao largo de sua continuação (‘Mas se não os temos, como sabê-los?’), menos por discordar do pronome pluralizado pela liberdade poética (‘sabê-lo’ não faria mais sentido?) do que por considerar que certos herdeiros, ao contrário dos filhos evocados por Vinicius, não merecem o benefício da dúvida. Bem fez Brás Cubas ao negar-se a passar adiante o legado da sua miséria. Assim evitou que seus eventuais herdeiros arrumassem um jeito de ganhar algum explorando os direitos sobre o emplasto por ele inventado e com ele sepultado.
À exceção dos que merecem ser excetuados – e logo me ocorrem os que doaram a uma instituição os espólios de Hélio Pellegrino, Pedro Nava e Antonio Callado -, a espécie é de lascar. Em geral, gente que nada criou e nada faz a não ser viver à custa do legado artístico de seus pais ou avós, quase sempre com mais folgança e fartura do que o responsável pelo bem-bom conseguiu viver.
Até aí, tudo bem; o mundo é mesmo injusto. Também nada a objetar se se defendem de trambiqueiros e mal-intencionados, como estão fazendo os herdeiros de mais de 300 artistas da antiga gravadora Decca, que cobram na justiça o beiço que a Universal, dona do acervo da Decca, lhes deu sobre a venda de milhões de discos gravados antes de 1962. Tudo muda de figura quando os herdeiros desvirtuam sua legitimidade comportando-se não mais como guardiões, mas como gigolôs de um patrimônio que, por ser artístico, não pode ser tratado como se fosse uma casa, uma gleba, uma jóia ou um monte de barras de ouro. Propriedade privada, sim, mas, acima de tudo, um bem público, a ser zelado sem a ganância que tantas galinhas de ovos de ouro já matou e tantas criações já condenou ao ostracismo.
Chegou ao conhecimento público, na segunda-feira, que o advogado que representa as famílias de Manuel Bandeira e Cecília Meireles cobrara R$ 40 mil à TVEscola do MEC para usar a imagem dessas duas glórias da poesia brasileira num documentário para tvs e escolas públicas. Resultado: Cecília e Bandeira ficaram fora do projeto. Todo mundo perdeu, inclusive os herdeiros. A ex-atriz Maria Fernanda, dona de um terço dos direitos sobre a obra de Cecília, apressou-se em explicar que jamais cobraria um centavo sequer a uma iniciativa eminentemente cultural como aquela, jogando a culpa nas duas irmãs e no advogado delas, neto de Cecília. A bonita edição da Edusp do Romanceiro da Inconfidência, com desenhos de Renina Katz, cedidos por José Mindlin com a concordância da artista, quase não saiu em 2004. Adivinha por culpa de quem?
Apesar dos pesares, Bandeira e Cecília estão em boa companhia: Guimarães Rosa, Monteiro Lobato e Nelson Rodrigues também se transformaram em abacaxis editoriais por conta da cupidez de seus herdeiros. Os de Rosa não se entendem, os de Nelson cobram até por ensaios fotográficos inspirados em personagens do dramaturgo, e os de Lobato só conseguiram uma coisa: banir seus livros da cabeceira de, pelo menos, duas gerações de crianças. Rosa deixou os direitos sobre Grande Sertão:Veredas para a segunda mulher, Aracy, dividindo o resto de sua obra entre Aracy e as duas filhas que teve com a primeira mulher. Confusão garantida, cultura lesada.
Também no início da semana vazou a notícia de que Carlos Prata, vulgo Pratinha, filho de Grande Otelo, exigiu compensação financeira pelo uso da imagem de seu pai na edição de fevereiro da Revista de História, editada pela Biblioteca Nacional. Embora a nada tivesse direito (a foto, cedida pela Cinemateca do MAM, era uma cena do filme Macunaíma, cuja publicação fora autorizada por uma das filhas do cineasta Joaquim Pedro de Andrade), ofereceram-lhe R$ 800, que Pratinha não aceitou. ‘Isso não é nada diante da importância do Grande Otelo’, argumentou, sem levar em consideração que a revista é uma publicação cultural e estava reconhecendo a importância de seu pai da melhor maneira a seu alcance, honrando-o com uma capa.
O filho de Grande Otelo seguiu os maus passos de Estela (neta de Clementina de Jesus) e Paulo Cesar Valdez (filho de Elizeth Cardoso). Estela cobrou R$ 2 mil pela utilização de uma foto da avó que pertencia ao arquivo pessoal de Hermínio Bello de Carvalho. Valdez impetrou uma liminar contra o uso da imagem e do nome da mãe num show em homenagem à cantora, alegando que seu nome não estava grafado corretamente nem no título do espetáculo (Divina-80 Anos de Elisete), nem nos cartazes, nem no material de propaganda.
Ora, Elizeth já fora grafada Elisete em outras ocasiões, até mesmo numa caixa (com quatro CDs), produzida um ano antes pela EMI, sem provocar a ira do filho da cantora. Porque, na verdade, agia de má-fé, pretendendo direitos autorais que cabiam apenas aos autores das músicas cantadas no show, Valdez teve sua liminar cassada por um desembargador, que fez questão de salientar, em seu parecer, que o que denegria a imagem de Elizeth era impedir a realização da homenagem.
Não menos grotesca foi a perseguição movida por um advogado espertalhão à biografia de Garrincha, escrita por Ruy Castro e publicada em 1995. Representando as filhas do jogador, o causídico passou cinco anos azeitando a chicana. Primeiro, tentou proibir o livro, imputando-lhe imaginárias ofensas à memória de Garrincha. Depois, tirou a máscara: as herdeiras sem herança palpável (o craque morreu na pindaíba) queriam, mesmo, era descolar uma grana sem fazer força. Afinal descolada, com a inacreditável anuência de uma juíza, que em 2000 condenou a Cia. das Letras a pagar R$ 151 mil à família de Garrincha.
Sob o manto do direito de imagem, procriam as sansessugas. Aqui e lá fora. Em nossos costados até hirudíneos europeus já vieram bater e exibir suas ventosas. Há quase três anos, os herdeiros do artista plástico francês Paul Landowski procuraram os tribunais para impedir que o Cristo Redentor, criação do artista, continuasse sendo explorado comercialmente sem um ou vários dízimos depositados na conta bancária dos Landowski. Consolo: o Cristo, há quase 76 anos no alto do Corcovado, cairia em domínio público em 2031. Se aberto o precedente, o que aconteceria com a Estátua da Liberdade e a Torre Eiffel?
Que ninguém se surpreenda se algum descendente de Estácio de Sá arvorar-se de herdeiro do morro Cara de Cão, cobrando percentagem sobre a venda de cartões postais e o que mais o Pão de Açúcar tenha ilustrado ou venha a ilustrar – além, é claro, de tributos aos negociantes nele estabelecidos. Pois tudo é possível nestas paragens ainda atreladas juridicamente a privilégios imemoriais. Se desde os tempos das capitanias hereditárias os moradores do lado par da rua São Clemente, no bairro carioca de Botafogo, pagam 2,5% de laudêmio à família Silva Porto a cada negociação imobiliária, por que, diabos, não facultar aos descendentes de Estácio de Sá uma enfiteusezinha?, poderá perguntar um dos muitos rábulas que por aí pululam, sempre a postos para mais uma gigolagem jurídica.’
PUBLICIDADE
Investimentos em anúncios crescem 9,3%
‘O mercado publicitário movimentou R$ 23,974 milhões em 2006, aplicados principalmente em televisão (59,4%), jornais (14,7%) e revistas (10,5%). Os três segmentos ficaram com 84,6% da verba investida pelos anunciantes, segundo o estudo anual do Projeto Inter-Meios, indicando que, apesar dos inegáveis avanços da mídia digital, as plataformas tradicionais mantêm presença dominante na comunicação das empresas.
O crescimento do bolo publicitário em relação ao ano anterior foi de 9,3%, mas ainda assim ficou aquém do esperado, segundo José Carlos de Salles Gomes Neto, presidente do Grupo Meio&Mensagem e responsável pelo Inter-Meios. ‘Tivemos um primeiro semestre animador que projetava um crescimento de 16% para o setor por causa da intensa movimentação em torno da Copa do Mundo’, diz ele. ‘Mas o segundo semestre puxou o resultado para baixo.’ A desaceleração na segunda metade do ano é atribuída ao efeito eleição. ‘As empresas pararam de investir na expectativa do que viria depois das eleições’, diz Salles Neto.
A primazia do varejo sobre outros setores – como automobilístico, financeiro e de telecomunicações – e a forte incorporação das classes D e E ao consumo continuam a marcar o setor. Embora a listagem dos maiores anunciantes e das agências de 2006 ainda esteja em elaboração, já é sabido que as Casas Bahia devem liderar o ranking como nos últimos quatro anos.
Com a contabilização da prática de descontos entre agências, veículos e anunciantes, comum no setor, o levantamento do Projeto Inter-Meios mostra números substancialmente diferentes dos apurados pelo Ibope Monitor, que retrata os valores das tabelas oficiais dos veículos. Para o Ibope, os investimentos publicitários aumentaram 15,5% em 2006 e somaram R$ 39,821 bilhões – mais de 60% superiores aos apontados pelos dados do Inter-Meios.
Para chegar ao bolo publicitário total, o cálculo do Inter-Meios considera três etapas. A maior parte dos dados, 90%, corresponde ao que é efetivamente investido em mídia no País. Os outros 10% são projeções dos números de veículos que não informam seus dados. Sobre esse valor são acrescidos 19%, porcentual estimado para o que se aplica na produção de anúncios, comerciais de tevê, spots de rádio, etc. – enfim, todo o arsenal de campanhas.
Os números desse levantamento são referência para o mercado e utilizados pela Standard&Poor’s para monitorar o setor de mídia no Brasil, segundo o diretor associado Jean-Pierre Cote Gil. A S&P vê recuperação dos investimentos publicitários com base em dois indicadores: a relação das verbas com o Produto Interno Bruto (embora o parâmetro ainda seja o PIB não recalculado pelo IBGE) e a evolução real dos valores nos últimos dez anos, descontada a inflação medida pelo IPCA. A participação no PIB, por exemplo, chegou a 0,87% em 2006, muito perto do melhor desempenho da década, registrado em 2000 (0,89%). A movimentação de verbas entre os diferentes veículos, no geral, é pequena. Os investimentos em televisão aberta, por exemplo, caíram de 59,9% para 59,4%; em jornais, de 15,4% para 14,7%. No caso de outdoors, a queda foi de 5% para 3,5%, e já reflete o efeito da Lei Kassab, que proíbe o uso de mídia exterior na cidade de São Paulo.
Na mesma comparação, cresceram em participação mídias como internet (de 1,5% para 2%), TV por assinatura (2,7% para 3,5%) e cinema (0,4% para 0,6%). ‘É verdade que a base de comparação é baixa, mas a internet avançou 0,5 ponto, o que representa aumento de 36% ante 2005’, diz Salles Netto.
Na avaliação de Cotes Gil, a volta do setor de mídia aos bons resultados da década faz com que cresça a possibilidade de as empresas de comunicação partirem para a abertura de capital. ‘Mais do que uma necessidade para expansão dos grupos, há demanda do mercado financeiro que vê o momento como propício para a abertura de capital’, diz ele.’
TELEVISÃO
Colunismo social
‘Sorry, periferia. Em sociedade, tudo se sabe. Era o que dizia Ibrahim Sued na coluna que publicou em O Globo durante 40 anos. O estilo Ibrahim fez escola. O colunismo social que ainda se pratica em jornais regionais e em capitais fora do eixo Rio-São Paulo é permeado pelas movimentações do high society local, à semelhança do que era feito lá trás.
Em São Paulo e Rio de Janeiro, os sucessores de Ibrahim tomaram outros rumos, privilegiando a política, economia e cultura, porque o mundo mudou. O espaço antes dedicado aos bastidores das rodas sociais (para usar um termo da época de Ibrahim) foram ocupados pela informação que de certa maneira fazem mais diferença na vida da parcela maior dos leitores. Porção essa que se interessa pelo que rola numa sociedade mais ampla: nas grandes corporações, nos escalões mais altos do poder e nas movimentações do mercado.
Com o advento da televisão, Ibrahim foi parar no vídeo. Nos anos 60 e 70, teve um programa na Globo e, mais tarde, um quadro no Fantástico. Mas ao contrário do que ocorreu na mídia escrita, seu colunismo social não prosperou como gênero na TV, apesar das inúmeras tentativas.
Luciano Huck começou na Gazeta circulando por festas em São Paulo até ser atraído pela Bandeirantes para fazer programa de auditório. Athaíde Patreze, o do microfone de ouro, esteve no ar exaltando o luxo, mas quando morreu já estava fora do vídeo há bastante tempo. Otávio Mesquita tentou um colunismo mais escrachado, mas acabou abandonando as maratonas de badalação para atuar dentro do estúdio.
Poucos sobraram na trincheira. Os sobreviventes são Ramy – que compra um horário semanal na TV Gazeta – e Amaury Jr, que fecha a noite na RedeTV! e está comemorando 25 anos de televisão.
O prestígio de Amaury é surpreendente. Candidatos fazem fila para aparecer a seu lado e contar a última em seu microfone. Ter Amaury e sua equipe nos eventos é objeto de desejo de qualquer produtor. É indício de que a festa é boa. E olha que estamos falando de um programa que passa na RedeTV!, depois da meia noite e que registra entre 1 e 2 pontos de média no Ibope (Grande São Paulo). O que isso quer dizer?
Em primeiro lugar é que a força da TV é incomparável. Na pior das hipóteses, o programa é disponibilizado para cerca de 100 mil pessoas.
É muita gente, por isso a probabilidade de alguém ser visto por algum conhecido é bem grande. Especialmente se for levado em conta que quem pode assistir TV tão tarde é, em tese, aquele que também pode virar a noite em festas. E é esse público (segundo o Ibope, composto 54% das classes A e B) que querem atingir os anunciantes que pagam a conta do programa. E garantem o caviar e o champanhe de cada dia.
É olhando para esse prestígio e essa receita, que proliferam nas emissoras regionais clones de Amaury. Assim como Ibrahim, ele acabou fazendo escola. Calcula-se que hoje estejam em ação nas festas do interior cerca de 400 colunistas de TV, provavelmente tão bajulados quanto Amaury.
Não se sabe se com a mesma habilidade de Amaury para tirar boas histórias de seus interlocutores. Mas, com toda certeza, com cancha para tranqüilizar os entrevistados de que não serão colocados em saias justas, como faz o mestre.’
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