Wednesday, 25 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O horror à política

Numa entrevista ao O Jornal, em 1935, Mário de Andrade revelou seus sentimentos com relação à política, em plena Era Vargas. O repórter lhe perguntou sobre aquela “sereia” que tantas carreiras desviava… e o escritor paulista respondeu: “Não fale em política. Tenho horror à política”.

Propagam-se frases que podem aumentar esse horror, ou ao menos provocar certo nojo. Ler as palavras de Maluf – “sou tão correto quanto os outros políticos do Brasil” – é ter encontrado, enfim, a formulação perfeita da ética despojada de parâmetros éticos…

A mídia tem acompanhado os escândalos, as denúncias, as declarações bombásticas. Roberto Jefferson acaba de lançar o livro Nervos de aço, com a ajuda do jornalista Luciano Trigo, autor de um livro de contos chamado Todas as histórias de amor terminam mal. Todas essas histórias de amor e traição na política terminarão mal. Essas histórias nos deixam com os nervos à flor da pele.

O horror à política que o escritor Mário de Andrade sentia e expressava muita gente experimenta também. Fruto de sucessivas desilusões. A literatura, a arte, a própria filosofia… podem dizer alguma coisa de valor ao homem. A política… os políticos podem? Horror.

Dez anos depois

Recentemente, num chat do portal Terra, Luana Piovani disse as mesmas palavras, teclando com uma fã. A fã lhe perguntou: “Luana, você aceitaria algum cargo político?”. Resposta: “Jamais, tenho horror a política!” Em contrapartida, do meio artístico surgiram agora dois nomes inesperados: Clodovil Hernandes, o quarto deputado federal mais votado nestas eleições (pelo Partido Trabalhista Cristão), e o cantor Frank Aguiar, também deputado federal, pelo PTB.

Em 1996, o romancista Antônio Callado, alguns meses antes de falecer, declarou ao professor Marcelo Ridenti:

“Eu tenho horror à política. […] Hoje a gente tem ódio dos deputados. No entanto, a gente quer o quê? A volta do Médici? Não é, né? Então o que é que a gente quer, o que é que se pode fazer num país como o Brasil? Eu não posso fazer nada, porque daqui a pouco morro, não tenho tempo. Eu teria que ter mais 40 anos pela frente para ter esperança de alguma coisa. Esperança.”

Passaram-se dez anos. Uma certa esperança venceu o medo. E foi esmagada pela falta de escrúpulos. Talvez, no segundo turno, a maioria dos eleitores formule outra frase. Talvez eles digam: “Preferimos um gerente anódino”. E Lula-Cristo? Crucifiquem-no!

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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br