Teria escrito a grande história da semana passada, talvez a melhor de muitos meses, quem contasse como foi a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na quarta-feira (18/1). Poucos detalhes foram narrados, na quinta e na sexta-feiras, um pouco pela Folha de S.Paulo e um pouco mais pelo Estado de S.Paulo.
A reunião durou 4h46m e foi a segunda mais longa durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A mais longa, em fevereiro de 2003, durou 5h25m. Na última semana, os membros do comitê resolveram cortar de 18% para 17,25% a taxa básica de juros. Segundo a nota divulgada à noite, a decisão foi unânime.
Como indicou um título do Estadão, o Copom levou quase cinco horas para tomar uma decisão prevista por todos – ou, no mínimo, pela maior parte dos consultores e economistas do mercado financeiro ouvidos nos dias anteriores. Mas no governo, já se sabia, havia uma torcida por um corte mais audacioso. Sobravam pelo menos duas boas perguntas: 1) por que tantas horas para formar unanimidade em torno de um número esperado pelo mercado?; 2) a proposta vencida era de um corte de 0,5 ou de 1 ponto de porcentagem?
A versão da unanimidade passou quase sem discussão nas edições de quinta-feira (19/1). A decisão do Copom saiu tarde e a maior parte dos jornais limitou-se a reproduzir a notícia, acentuando seu caráter conservador e apresentando as matérias habituais de repercussão.
A Folha chamou a atenção para as pressões sobre o Copom, lembrou o interesse do presidente Lula num corte maior e mencionou os comentários do secretário do Tesouro, Joaquim Levy, sobre os juros muito altos. Esses comentários haviam sido publicados na sexta-feira (13/1), pelo Valor. Mencionou também uma das causas da demora: um grande debate, entre os membros do Copom, sobre o ritmo de recuperação da economia e sobre o tempo necessário para surgirem os efeitos dos cortes de juros iniciados em setembro.
Discordância camuflada
Na sexta (20), a Folha continuou explorando os problemas internos do governo, com o presidente Lula cobrando um corte maior, mais conveniente para a campanha eleitoral, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, defendendo uma atitude mais cautelosa neste momento.
O Estadão, na sexta, foi mais fundo na história da reunião do Copom. Não contou quem defendeu este ou aquele número, mas afirmou com clareza a divergência entre os membros do comitê. Em dezembro, dois defensores de um lance menos conservador haviam sido vencidos.
Esse ponto de vista foi derrotado mais uma vez na quarta-feira passada (18). Mas houve uma diferença política. Em dezembro, tomou-se a decisão e assumiu-se publicamente a divergência entre os diretores do BC membros do Copom. Desta vez, preferiu-se ‘não expor à sociedade e ao governo’ a discordância. Daí o esforço para a formação da unanimidade – e daí, também, a demora excepcional da reunião. Houve, portanto, um cuidado político especial.
Avaliação de riscos
Segundo a matéria do Estadão, o presidente Lula e outros membros do governo acabaram aceitando, na quarta-feira à noite, a conveniência de uma política mais cautelosa, enquanto se espera, até março, uma visão mais clara da situação.
Seria muito bom, numa história mais completa, contar pelo menos quantos membros do Copom defenderam o corte mais amplo da taxa básica e expor seus argumentos. Poucos dias antes da reunião, o secretário do Tesouro havia proposto, numa entrevista ao Valor, uma discussão mais ampla sobre o potencial de crescimento econômico sem desajustes.
‘A discussão sobre o PIB potencial’, disse ele, ‘é a bola da vez.’ Este é um ponto crucial para as decisões do Copom. Segundo a informação disponível, um limite de crescimento de 3,5% ao ano tem balizado as decisões do Copom. Essa idéia tem sido contestada por alguns críticos da política de juros.
A discussão proposta por Joaquim Levy poderia trazer mais nitidez ao assunto. E seria especialmente interessante saber se entre os membros do Copom há discordância, agora, quanto a esse ponto, ou se a divergência está limitada à avaliação de riscos em 2006.
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Jornalista