Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O povo sabe

“Saber que sabe é um dom da gente do povo” (Antônio Luiz da Costa, educador)

O cidadão comum brasileiro denota possuir grau de percepção social infinitamente superior ao de ponderável grupo de analistas, comentaristas, cientistas políticos eruditos e renomados que frequentam habitualmente colunas da grande mídia com interpretações pessoais dos fatos socioeconômicos. O sentimento popular, expresso em manifestações de satisfação e de sempre esperançosa expectativa, bate de frente a toda hora com a obsedante mensagem negativista lida e ouvida no noticiário nosso de cada dia. O crescimento acelerado dos últimos anos, que concedeu ao Brasil posição de enorme realce no cenário internacional, revela sem margem a contestações que, nessa divergência de opinião, o povo é que está com a razão.

Apontando a medida como indispensável no combate inflacionário, o governo federal anunciou um corte orçamentário de 50 bilhões de reais. Anunciou, também, respaldado em pareceres dos tecnocratas de sempre, novas e questionáveis elevações na taxação dos juros. A redução de investimentos impacta naturalmente várias iniciativas na área social, que terão de ser sobrestadas. A decisão não vai afetar, todavia, como não poderia, aliás, deixar de ser, o Bolsa-Família, programa da maior relevância no resgate paulatino da colossal dívida social acumulada anos a fio pela nação. As alterações para mais nos valores dispendidos com esse item específico da ação governamental estão estimadas, ao que se informou, em 2,5 bilhões.

O melhor negócio jamais feito

O comunicado dessa majoração nas verbas do Bolsa Família provocou, por incrível que pareça, reações zangadas de não poucos elementos com acesso à divulgação midiática. Não deixa de ser intrigante anotar que esses comentários críticos sobre a palpitante matéria são emitidos numa mesma ocasião em que, por força da pujança econômica brasileira, negada sistematicamente por esses mesmíssimos setores, grandes organizações empresariais sobretudo bancárias, tornam público estrondosos recordes em lucratividade nos negócios em que atuam. Soa estranho que a nenhum dos responsáveis pelas despropositadas restrições ao Bolsa-Família ocorra a ideia de sugerir que pequena parcela dessa espiral de bons resultados financeiros – algo, diga-se de passagem, incomparável em qualquer outro canto do mundo – possa ser carreada, por meio de um pacto tributário sério, aos programas sociais, com a eliminação, quem sabe, até da necessidade de se operarem cortes no orçamento federal. Cuidemos de aquilatar a dimensão dessa lucratividade recordista, atingida pelas eficientes empresas do ramo bancário, para ficar num exemplo. Os números somados de não mais que meia dúzia delas são suficientes para superar a cifra de 50 bilhões correspondentes à redução de gastos orçamentários feita pela União.

Está aqui, escancarado em jornal, outro exemplo talqualmente sugestivo. Diz respeito a uma grande empresa industrial. No período de apenas três meses (julho a setembro de 2010), como fruto de eficaz gestão administrativa, ela conseguiu incorporar ao patrimônio lucro líquido, em dólares, de 6.229 bilhões. O nome da empresa é Vale (do Rio Doce), segunda maior organização produtiva brasileira. Em seu segmento, a maior do mundo. É interessante frisar que a dinheirama auferida é bem maior do que o valor recebido pelo Estado no leilão, anos atrás, referente à sua privatização. Essa privatização foi considerada como o melhor negócio jamais feito no orbe terráqueo desde que os índios pele-vermelha, antigos povoadores dos Estados Unidos, transferiram para os caras-pálidas os direitos de propriedade sobre o território hoje conhecido por Manhattan.

É só sair perguntando por aí

Isto tudo posto, irrompe uma pergunta. Será que não dá pra tentar uma reavaliação, por meio evidentemente de negociações, da contribuição dessas empresas, tão prodigamente remuneradas no contexto produtivo, na formação dos recursos investidos nas políticas sociais? Por que nas observações, insistentemente pessimistas, que fazem a respeito dos rumos que o Brasil percorre em sua busca frenética do desenvolvimento visando a garantir melhores índices de prosperidade social, os especialistas em previsões catastróficas de nossa mídia não se animam a propor, como formadores de opinião que são, um debate esclarecedor a respeito da conveniência de um novo pacto regulatório na esfera tributária? Um pacto que concorra para a diminuição, em nome da justiça social, das cotas de participação no bolo fiscal de quem possua capacidade menor de produzir renda. Com compensação, evidentemente, na elevação proporcional do contributo das organizações de altíssima lucratividade.

O povo, que entende melhor das coisas do que certos comentaristas, aceita de bom grado esse raciocínio. Se alguém duvida, que se dê ao trabalho de sair perguntando por aí, mode se esclarecer.