Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O viaduto caiu. As fotos sumiram?

Não sou adepto de teorias conspiratórias. Em tempos de internet, elas pululam de maneira assustadora. Nossas caixas de e-mail pagam o tributo por esta disseminação de ervas daninhas virtuais.

Pelo desempenho da grande imprensa no Brasil, pouco merecedor de elogios, algumas mentes criativas – quando não perturbadas, ou simplesmente inocentes – creem valer tudo para atingi-la. A imprensa erra, além de adotar comportamentos capazes de atingir irresponsavelmente reputações ou causar rebuliço no país. Isto é fato. O problema é quando, a partir dos erros da imprensa, as mentes dos teóricos da conspiração passam a enxergar ações deliberadas para atacar determinada pessoa ou instituição a todo instante. Aí, o furdúncio está formado: de um lado, setores irresponsáveis da imprensa; de outro doidivanas construindo críticas como castelos de areia. Quem não está devidamente ‘imunizado’ contra o mal da intriga, é acometido por ele e passa a reproduzir sandices pelo mundo real, virtual, espacial…

Feito o intróito, creio poder entrar no assunto responsável por estimular a criação deste artigo. Lendo o site do jornalista Luiz Carlos Azenha, tomo conhecimento da denúncia acerca de um certo sumiço do site de busca Google das fotos referentes ao desabamento de três vigas de sustentação de um viaduto em construção do Trecho Sul do Rodoanel Mário Covas, em São Paulo. Mais precisamente, a notícia teve sua origem no site Cloaca News.

Alguma coisa está errada

Com o título de ‘Serra mandou, Google obedeceu: sistema de busca não apresenta imagens do desabamento de das vigas do Rodoanel’, a notícia se resume a uma imagem do infalível analgésico Doril – aquele do bordão ‘a dor sumiu’ – e a frase ‘Clique aqui e tente encontrar você também’, oferecendo o link direto para o buscador de imagens do Google. Poucos irão se furtar de experimentar ver com os próprios olhos a mais nova ‘fraude’ do conluio serrista visando à eleição do governador paulista para presidente do Brasil.

Realmente, ao procuramos imagens do acidente no Google, dificilmente acharemos alguma coisa. Curiosamente não aparecem. Os mais afoitos interpretarão: ‘Tá provado!’ e sairão pela internet a denunciar mais um ato da tal imprensa golpista. Não obstante, ao nos voltarmos para o Google web e realizarmos a busca nos termos ‘acidente rodoanel’ ou ‘queda viga rodoanel’ não faltarão notícias com imagens. Para nos limitarmos à grande imprensa, no site da Folha de S.Paulo, sempre acusada de ‘quintal’ serrista, elas estão em quantidades variadas. Quando acessamos o site do Terra, também não nos faltam imagens. Mesmo o conservador Estado de S. Paulo tem sua galeria de fotos, para frustração dos desavisados, paranóicos ou incautos.

Os únicos sites econômicos em imagens da queda das vigas são os da organização Globo. No sítio do Jornal Nacional, apenas na ‘capa’ do site. Ao acessamos a notícia, não existem imagens. No G1, igualmente há escassez de fotos. Nem vigas, nem carros, nem acidentados. Apenas informações. Contudo, talvez seja uma característica daquele portal, uma vez que outras matérias igualmente não apresentam fotos, como no caso do deslizamento de terra no Rio de Janeiro. Por último, também no site do jornal O Globo podemos encontrar alguma imagem.

Logo, alguma coisa está errada nessa tentativa de blindagem do governador José Serra: ou ele não soube mandar, ou seus títeres do Google são atrapalhados.

Fantasias, e não críticas

O leitor deve estar se perguntando afinal qual é o propósito deste artigo: denunciar teorias conspiratórias? Proteger o tal PIG? – bobagem criada por Paulo Henrique Amorim. Não, para ambas as questões. Minha intenção é somente demonstrar como o debate que realmente importa às vezes fica de fora, ou contaminado, e passamos a nos concentrar em questões equivocadas, quando não delírios.

Ora, ao optarmos por aderir cegamente à tese manca de que José Serra ‘mandou’ no Google, apenas oferecemos argumentos para os defensores da grande imprensa se negar a discutir sobre os rumos da imprensa brasileira. Como debater sobre assunto tão importante se em meio dos argumentos contrários à qualidade do jornalismo no Brasil encontramos teses conspiratórias furadas? Se da boca dos acusadores saírem bobagens com ares de fatos comprovados?

Poderiam argumentar não ser preciso levar a sério algo tão trivial. Eu entendo que, sim, devemos nos preocupar. Pois com a velocidade da informação, aliada à quantidade absurda de canais para disseminá-la, a maioria das pessoas não vai em busca da consistência de peças acusatórias com aparência de seriedade. Muitos acabam por reproduzir fantasias crendo estar enriquecendo a crítica. Na verdade, somente a torna mais inconsistente e pobre.

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Servidor Público, graduando em Ciências Sociais, Vila Velha, ES